Acórdão nº 3951/08.0TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução13 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pc. 3951/08.0TBVFR.P1 – 2ª Secção (apelação) _________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Ondina Carmo Alves Des. Ramos Lopes* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, Lda.

, com sede em Campo Maior, instaurou a presente acção especial para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato, contra C…, residente em …, alegando, em síntese, que: ● celebrou com o réu, em 29/06/2004, o contrato de fornecimento de café e publicidade da marca D… (café e marca exploradas pela autora) cuja cópia se encontra junta a fls. 8 a 10, com os aditamentos juntos a fls. 13 e 14; ● nos termos das cláusulas 2ª e 6ª desse contrato, o réu ficou obrigado a consumir no seu estabelecimento comercial, exclusivamente, café da marca D…, lote …, nas quantidades mínimas mensais de 18kg, pelo prazo necessário ao consumo ininterrupto de 1.550kg; ● em Dezembro de 2006, o réu deixou de consumir e comprar o café da autora, tendo, inclusive, encerrado o seu estabelecimento comercial; ● até esse momento, o réu tinha adquirido apenas 451kg de café, tendo incumprido, assim, o contrato por violação das referidas cláusulas 2ª e 6ª; ● devido a tal incumprimento, a autora resolveu o contrato, nos termos da cláusula 10ª, als. a) e b), através de carta registada com aviso de recepção enviada para a morada convencionada do demandado, a qual foi devolvida pelos CTT com a menção de «mudou-se»; ● nos termos da cláusula 13ª foi estabelecida uma cláusula penal em caso de resolução do contrato por incumprimento, ficando o réu obrigado a indemnizar a autora no montante de 8,64 € por cada quilo de café não adquirido; ● face ao acordado no contrato quanto ao consumo de café pelo réu e ao que este efectivamente comprou, o valor da cláusula penal ascende a 11.489,39 €, com IVA incluído; ● o réu não procedeu ao pagamento deste valor, apesar das interpelações da autora.

Concluiu pedindo a condenação do réu a pagar-lhe, a título de indemnização, a referida quantia de 11.489,39 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da constituição em mora até integral pagamento.

O réu, citado, contestou a acção, afirmando que: ● o conteúdo do contrato e o do respectivo aditamento, juntos pela autora, não foram negociados entre ambos, tendo sido entregues ao contestante previamente elaborados e com todo o seu clausulado; ● não foi sequer informado do seu clausulado nem ele lhe foi explicado, designadamente no que diz respeito à cláusula penal; ● o que daqueles consta não corresponde ao que ambas as partes haviam convencionado verbalmente, já que o acordado foi o consumo de 1.000kg de café ou uma duração contratual de 5 anos; ● o vendedor da autora foi informado que o contrato não poderia ser com exclusividade, na medida em que o contestante estava vinculado a um outro contrato com uma marca concorrente; ● em 19/12/2006, devido à sua detenção e subsequentes prisão preventiva e, depois, cumprimento de uma pena de prisão de sete anos, ficou impossibilitado de cumprir o contrato por ter sido obrigado a encerrar o seu estabelecimento comercial; ● deu conhecimento verbal destes factos à autora, na pessoa do respectivo vendedor; ● nenhuma responsabilidade lhe pode, assim, ser assacada.

Pugnou, por isso, pela improcedência da acção, com as legais consequências.

Seguiu-se a realização da audiência de julgamento, no início da qual a autora respondeu às excepções peremptórias deduzidas pelo réu na contestação, defendendo a respectiva improcedência.

No final do julgamento, após produção da prova, foi proferida sentença que, além de fixar, fundamentadamente, a matéria de facto provada e não provada, julgou a acção procedente e condenou o réu a pagar à autora, a título de cláusula penal, a quantia de 11.489,39 €, acrescida de juros legais, à taxa legal dos juros comerciais, desde 22/02/2008 até efectivo e integral pagamento.

Desta sentença interpôs o réu o recurso de apelação ora em apreço, cuja motivação culminou com as seguintes conclusões: “I - Não poderão subsistir dúvidas que o contrato em discussão nos autos é um contrato tipo (e é um contrato tipo porque, pese embora sirva para todas as situações, é, como as testemunhas o disseram, susceptível de ser negociado, daí que se distinga de um contrato de adesão, em que não existe essa possibilidade de serem negociados os seus termos) e, por conseguinte, têm as suas cláusulas de passar pelo filtro do Dec. Lei 446/85 (Lei das Cláusulas Gerais dos Contratos).

II - Tendo o demandado alegado, de entre o mais, que o conteúdo da cláusula penal aposta no contrato em discussão nos autos lhe não foi comunicado, nem explicado, é ao pré-disponente que cumpre fazer prova dessa comunicação e explicação, à luz do nº 3 do art. 5º da Lei das Condições Gerais dos Contratos.

III - Não fazendo essa tamanha prova, a consequência legal para tamanha omissão não é a nulidade, mas sim a sua exclusão do contrato, conforme dispõe o art. 8º do mencionado diploma legal.

IV - A solução dos autos, em face da demais matéria de facto provada, nomeadamente a constante das als. L) e M), nunca poderia ser aquela que vem vertida na decisão ora sindicada, porquanto, o eventual incumprimento não decorre de um acto voluntário do demandado, antes da sua detenção, prisão e consequente encerramento do estabelecimento comercial.

V – Existe, assim, um motivo de força maior que determinou a impossibilidade de cumprimento subsequente do negócio, pelo que, cumpre na situação concreta aferir qual o valor despendido pela demandante, atender à duração do contrato e, quando muito, ordenar a restituição do valor recebido na proporção do café que não foi consumido, conforme dispõem os arts. 793º e ss. do Código Civil.

VI – Mesmo que assim se não entenda, atendendo à aludida causa de força maior, sempre se impunha a redução do valor constante da cláusula penal na aludida proporção, em conformidade com o disposto no art. 812º do mesmo normativo legal.

Termos em que, (…), deverá o presente recurso merecer total provimento, por a decisão recorrida se mostrar violadora, de entre o mais, das apontadas normas legais, assim se fazendo justiça”.

A autora não apresentou contra-alegações.

* * *II. Questões a apreciar e decidir: Face às conclusões das alegações do apelante (são estas que delimitam o «thema decidendum» a cargo desta 2ª instância, de acordo com o estabelecido nos arts. 684º nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, resultante das alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/08, atenta a data da instauração da acção), o objecto do conhecimento deste Tribunal da Relação traduz-se em saber: ● Se o recorrente impugna adequadamente a matéria de facto; ● Se o contrato dos autos está sujeito ao regime das cláusulas contratuais gerais (e se o disposto nos arts. 5º e 8º do respectivo diploma - DL 446/85 - é aplicável à cláusula penal nele exarada); ● Se o não cumprimento do contrato se deveu a motivo de força maior não imputável ao réu e se, por via disso, a sua responsabilidade fica excluída ou, pelo menos, reduzida nos termos pretendidos pelo apelante; ● E se há lugar à redução da cláusula penal.

* * *III. Factos provados: 1. A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

  1. A A. explora a actividade de comércio dos cafés e sucedâneos da marca “D…”.

  2. O R. explorava um estabelecimento comercial denominado “E…”, sito na Rua …, em ….

  3. Em 29 de Junho de 2004, através de escrito particular, denominado de «contrato», a A., na qualidade de 1ª contraente, e o R., na qualidade de 2º contraente, declararam que: “Considerando que: a) A 1ª contraente se dedica à comercialização dos cafés e sucedâneos da marca D…, b) O 2º contraente explora o estabelecimento comercial denominado «E…», sito na Rua …, em …, c) O 2º contraente no âmbito da sua actividade comercial está interessado em consumir em exclusivo os Cafés D…, Celebram o seguinte contrato de fornecimento em regime de exclusividade dos cafés da marca D…, nos termos e condições das cláusulas seguintes: 1ª. O 2º contraente obriga-se a consumir em exclusivo, no estabelecimento comercial acima identificado, os cafés marca D…; 2ª. Comprometendo-se ainda a, durante a vigência do presente contrato, comprar à 1ª contraente café marca D…, lote …, nas quantidades mínimas mensais de 30kg; 3ª. Até termo do presente contrato, o 2º contraente não poderá, assim, adquirir cafés de qualquer outra marca ou proveniência.

    1. 1 – Como contrapartida da exclusividade, a 1ª contraente cede ao 2º, durante a vigência do contrato, os bens abaixo identificados: - 5 toldos de capota; - 1 reclame luminoso; 2 – São da responsabilidade do 2º contraente a conservação (…) dos referidos bens; 5ª. Também como contrapartida da exclusividade a 1ª contraente entrega ao 2º a quantia de 5.113,00 €, acrescida de IVA à taxa em vigor; 6ª. O presente contrato é celebrado pelo prazo necessário ao consumo ininterrupto e exclusivo de 1.800kg de café D…, lote …, com início no dia 14 de Junho de 2004; 7ª. O preço do lote … será aquele que constar da tabela geral de preços da 1ª outorgante, em vigor à data de cada...

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