Acórdão nº 0440/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A... recorre do Acórdão do TCA Sul que negou provimento ao recurso contencioso dos despachos n.ºs 716/2002 e 716-A/2002, ambos de 28/03/2000, do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (doravante SEAF), o primeiro que lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão por 30 dias e o segundo que lhe aplicou a pena disciplinar de cessação da comissão de serviço.

Rematou as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões: 1. O Acórdão recorrido não se pronuncia sobre todas as questões que lhe foram colocadas pelo recorrente no recurso de contencioso apresentado; 2. O Acórdão recorrido não apreciou a questão da ausência de prova e da ausência de factos no processo disciplinar que permitam sustentar a alegação da ilicitude do comportamento do recorrente; 3. O Acórdão recorrido apreciou erradamente a questão da incompetência do SEAF para determinar a instauração de procedimento disciplinar ao recorrente e a questão da incompetência do SEAF para aplicar pena disciplinar ao recorrente; 4. O Acórdão recorrido apenas faz uma análise superficial e meramente formal das questões que lhe foram colocadas pelo recorrente; 5. Nomeadamente, o Acórdão recorrido não se pronunciou sobre as nulidades do processo disciplinar alegadas pelo recorrente.

  1. Nos termos do n.º 2 do art. 660.º do CPC "O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

    " 7. É nula a sentença por omissão de pronúncia quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões às quais deveria ter-se pronunciado.

  2. O Acórdão recorrido é, por isso, nulo.

  3. O Acórdão recorrido comete um erro de julgamento ao considerar provados factos que nem sequer constam do processo disciplinar; 10.

    É falso que "Por despacho de 16.06.2000, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, foi realizada, no âmbito da Administração Geral Tributária, visando a venda em processo executivo de um imóvel da B..., uma auditoria da qual resultou o relatório de fls.

    5 a 63 do p.i., datado de 21.09.2000, referindo-se neste, a fls.

    31 e 32 a responsabilização do aqui recorrente, por grave negligência ou grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais".

  4. Pois, o que o relatório de auditoria diz, a fls. 31, relativamente ao ora recorrente: "1.4.

    Eventuais responsabilidades do Dr. A... - O Dr. A..., embora tenha uma menor participação no presente processo na medida em que as suas intervenções se circunscreveram a meros despachos de concordância sobre propostas que lhe foram submetidas e que, de seguida, seriam remetidas para despacho superior, poderá não estar isento de responsabilidades disciplinares, enquanto dirigente, nos casos em que o dever profissional parecia exigir outro tipo de atitude em situações que não se fazia apelo a conhecimentos técnicos específicos." Em nota de rodapé, a fls. 32 do referido relatório é dito "Atendendo aos actos que praticou no processo as eventuais responsabilidades do Dr. A... configuram-se relativamente atenuadas. As suas eventuais responsabilidades poderão ser enquadráveis no n.º 1 do art.º 23.º do Estatuto Disciplinar." 12.

    Nada consta no relatório de auditoria relativamente à responsabilização do aqui recorrente, por grave negligência ou grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais.

  5. Foram elaborados dois relatórios de auditoria e não apenas um; 14.

    Não pode, pois, ser dado como provado o facto 1 ° do Acórdão recorrido; 15.

    A transcrição de parte do relatório final, apresentado pelo Instrutor do Processo Disciplinar encontra-se incorrectamente feita; 16.

    Está dado como provado que através do ofício n.º 571, de 17.04.02, foi solicitada a notificação ao recorrente do teor do Parecer n.º 15/02 e dos despachos n.º 716/02 e 716-A/02, bem como do Relatório do Instrutor, quando na verdade, o referido ofício, junto a fls. do processo, apenas manda notificar o despacho n.º 716/02; 17.

    O Acórdão recorrido assenta, pois em factos, erradamente dados como provados, pelo que outros devem ser os factos dados como provados; 18.

    Está em causa nos presentes autos o Despacho n.º 716/02, de 28/03 do SEAF que aplicou ao ora recorrente a pena de suspensão graduada em 30 dias, prevista na alínea a) do n.º 4 do art. 12° do Estatuto Disciplinar, nos termos e com os fundamentos constantes do Parecer n.º 15/02, do Gabinete Jurídico e do Contencioso da Secretaria-Geral do Ministério das Finanças; 19.

    Está também em causa o Despacho n.º 716-A/2002, datado de 28/03/2002 que aplicou a pena de cessação da comissão de serviço no cargo de Chefe de Divisão de Cobrança da ... Direcção de Finanças de Lisboa, da Direcção Geral dos Impostos, nos termos da al.ª b) do n.º 2 do art. 20° da Lei n.º 49/99, de 22/06, ainda com os fundamentos constantes do Parecer n.º 15/02, do Gabinete Jurídico e do Contencioso da Secretaria-Geral do Ministério das Finanças; 20.

    Ambos os Despachos recorridos assentam no Parecer n.º 15/02, de 26/03 emitido pelo Gabinete Jurídico e do Contencioso da Secretaria-Geral do Ministério das Finanças; 21.

    Não o podiam ter feito porquanto o referido Parecer foi emitido por entidade incompetente para o efeito e procede a uma incorrecta apreciação dos factos, e a uma incorrecta aplicação do direito, sem ter sido dada oportunidade ao arguido, ora recorrente, se pronunciar, em sede de audição prévia, sobre a intenção de lhe serem imputados factos não constantes da acusação e a intenção de lhe ser mandada cessar a comissão de serviço em causa; 22.

    O n.º 3 do artigo 66° do Estatuto Disciplinar apenas permite que a entidade competente para a decisão (in casu, o Director Geral dos Impostos) solicite a emissão de parecer por parte do superior hierárquico do arguido (na altura o Sr. Director de Finanças da ... Direcção de Finanças de Lisboa) ou de organismo adequado dos Serviços [a Direcção de Serviços de Justiça Tributária da DGCI (art.º 20°, n.° 1 al.ª a) e b) do DL. 408/93, de 14/12, mantido em vigor pelo art.º 28°, n.º 2, do DL. 366/99, de 18/9]; 23.

    O Parecer n.º 15/02 acaba por transformar factos que objectivamente apenas podem ser considerados como atenuantes para o arguido em factos agravantes do seu comportamento e, consequentemente, da pena a aplicar.

  6. O ora recorrente apenas e tão só proferiu um Parecer (e não um Despacho) sobre uma Informação que lhe foi apresentada pelo Chefe da Equipa.

  7. O Autor do Parecer n.º 15/02 formula considerações que constituem um verdadeiro alargamento do âmbito da acusação, sem audiência prévia do arguido, o que constitui nulidade insuprível, nos termos do n.º 1 do art.º 42° do Estatuto Disciplinar, pois imputa intenções ao arguido que o próprio instrutor do processo disciplinar contraria ao afirmar "'... na medida em que não se invocou, nem se demonstrou, que tenha agido de forma consciente e determinada ..." (fls. 841 do Processo Disciplinar); 26.

    O Parecer n.º 15/02, alarga significativamente o âmbito e o significado da Acusação relativamente ao Arguido, imputando-lhe comportamentos e juízos que manifestamente ele não teve e que nem sequer constam do processo disciplinar de que foi arguido; 27.

    O Parecer n.º 15/02, em especial os seus pontos nºs 17 a 26, não se podem referir à conduta do recorrente; 28.

    Pois, quanto ao comportamento do arguido ora recorrente em todo o processo e tal como resulta do processo disciplinar, não se pode afirmar que aquela conduta foi gravemente negligente e violadora do dever de lealdade.

  8. O Parecer em causa (15/02) entra em contradição em si mesmo porque propõe que a moldura penal aplicável de "... suspensão do arguido não seja inferior ao limite mínimo do 2° escalão previsto na alínea b) do n.º 4 do Estatuto Disciplinar ...", isto é suspensão de 121 a 240 dias, quando antes declara no n.° 21 do parecer que a infracção em causa é a da al.ª e) n.º 1 do art.º 24° do Estatuto Disciplinar, que no seu n.º 2 limita a moldura penal a suspensão de 20 a 120 dias, por outro; 30.

    A fundamentação dos Despachos recorridos não podia, pois, assentar neste Parecer, uma vez que, também ele, eivado de vícios que determinam a sua nulidade.

  9. Ambos os despachos recorridos foram alegadamente proferidos ao abrigo da delegação de competências do Sr. Ministro das Finanças; 32.

    As únicas delegações de competências que o Sr. Ministro das Finanças efectuou ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais são as que constam do Despacho n.º 17953/2001, (2.ª Série), publicado no DR, na Série, n.º 198, de 27/08/01, fls. 14537 e, para esclarecimento deste, o Despacho n.º 25066/2001 e Série), publicado no DR, na Série, n.º 284, de 10/12/2001, fls., 20406; 33.

    O Sr. Ministro das Finanças não delegou no Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais qualquer competência em sede de procedimento disciplinar e muito menos a competência para aplicar pena disciplinar; 34.

    A competência para instaurar procedimento disciplinar pertence ao pessoal dirigente da função pública (art. 2°, n.º 1 e art. 16° do Estatuto Disciplinar); 35.

    O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais não faz parte do "pessoal dirigente da função pública"; 36.

    Nem se argumente, como faz o Acórdão recorrido que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais é superior hierárquico do Director Geral dos Impostos; 37.

    A Lei Orgânica do Ministério das Finanças, à data em vigor, aprovada pelo D.L. n.º 158/96, de 03/09, estabelece que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais não é inferior hierárquico do Ministro das Finanças e que os membros do Governo não pertencem à hierarquia da DGCI (Ac. De 03-12-2002, Proc. 01124/02, do STA); 38.

    Só através de uma competência que lhe tivesse sido delegada pelo Ministro competente (o Ministro das Finanças), é que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais poderia ter determinado a instauração do procedimento disciplinar e a aplicação de...

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