Acórdão nº 0167/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I. RELATÓRIO A... (A.), com os restantes sinais dos autos, com invocação das disposições combinadas dos arts., 50.°, 51.º e 55°, todos do CPTA, instaurou a presente ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO, Contra o acto administrativo da autoria do Senhor Presidente do B ..., que lhe aplicou a sanção disciplinar de demissão, de que foi notificado no dia 24 de Novembro de 2006.

Na petição inicial (p.i.) imputa ao acto impugnado vícios de violação de lei, pedindo que a acção seja julgada procedente e provada e, em consequência, que: - seja revogada a decisão que aplicou a pena de demissão; - o processo disciplinar seja declarado nulo; - o B... condenado a repor a situação, com a reintegração do A. nas suas funções de Chefe de Secção, - ainda sejam pagos aos A. todas as remunerações e suplementos a que tem direito desde o dia em que foi afastado da ..., - e que até à sua integral reintegração seja aplicada a Sanção Pecuniária Compulsória, nos termos do disposto nos artigos 46°/n°1 e n° 2, als. a) e b), art. 47°/ n° 1 e n° 2, al. b), art. 50°/l e arts. segs. e art. 44.° por remissão do art. 49,°, todos do CPTA.

Na sua contestação a Autoridade Ré (R) sustenta a legalidade do acto impugnado e bem assim a improcedência da acção.

Proferido despacho de harmonia com o disposto no artº 87º do CPTA e notificadas as partes nos termos do nº 4 do artº 91º do mesmo diploma legal, vieram apresentar as suas alegações.

O A. formulou as seguintes CONCLUSÕES: "104 A falta de isenção e imparcialidade na instrução do presente processo disciplinar é de tal forma manifesta, que o Relatório Final com a proposta de decisão de demissão mais não é do que um "copy paste" da nota de culpa e esta uma cópia alargada do relatório do inquérito.

  1. Não há por parte da instrução qualquer valoração das provas trazidas pelo recorrente ao processo.

    Nem sequer se pronuncia sobre as mesmas nem sobre os testemunhos que são abonatórios para o requerente. Limita-se a repetir palavra a palavra os artigos do relatório do inquérito e da nota de culpa. Duvida-se que sequer se tenha dado ao trabalho de analisar a defesa apresentada pelo recorrente.

  2. O valor das passagens, por exemplo, ficou na Agência de Viagens, que abre sempre uma ficha individual para efeitos de facturação, e como as passagens estão em nome do Recorrente e não em nome da instituição, daí surgiu toda esta confusão.

  3. Pois que esta conta-cliente/ficha individual não foi solicitada pelo Recorrente. e tal ficou provado pelo testemunho do próprio director da agência de viagens. Porém, no relatório estas declarações e esta evidência nem são comentadas! 108.

    Um outro exemplo prende-se com o uso da passagem n.° ..., que a Sra. Instrutora pretende à força fazer crer que foi paga pela ..., quando na verdade paga pela própria filha do Recorrente, que efectivamente a usou, tendo viajado junto com a mãe nas mesmas datas, sendo que a passagem desta é que havia sido paga pela .... E daí o lapso de ter sido entregue o triplicado junto com o triplicado da passagem da mãe.

  4. Porém, esta passagem n.° ... foi paga pela filha do Recorrente e não pela ..., como a mesma comprovou por vários documentos certificados juntos aos autos, a saber, recibo da agência n.°... de 30/10/2002; cheque n° ..., datado de 30/10/2002 sobre a ..., passado a favor da Agência de Viagens C.... E no entanto, no Relatório nem se fala destes documentos comprovativos! 110.

    Já para não falar de todos os depoimentos que são favoráveis ao Recorrente e que no Relatório são simplesmente ignorados, como se não existissem! 111.

    O autismo é a marca deste processo. O julgamento sumário e condenação prévia de que o requerente foi alvo, pelos seus superiores imediatos e pela instrutora são evidentes. O processo disciplinar mais não foi do que um cumprir de formalidades. Talvez por isso nem tenha havido a preocupação em individualizar infracções disciplinares, limitando-se a acusar por crimes em sede ilegítima, ignorando-se por completo os argumentos da defesa.

  5. O presente processo disciplinar está eivado de várias nulidades insupríveis.

  6. Por violação clara do direito de defesa e audiência do arguido, por na nota de culpa não se conseguir descortinar quais as infracções disciplinares alegadamente cometidas, dado que não são indicadas as infracções disciplinares nem as sanções aplicáveis às supostas condutas do Recorrente, além dos depoimentos que foram prestados já depois da fase de defesa concluída sem que destes depoimentos tenha sido dado conhecimento ao Recorrente, violando o Princípio do Contraditório.

  7. Por violação da Constituição da República Portuguesa, ao serem valoradas declarações do Recorrente tomadas na fase de inquérito, porquanto não as fez na qualidade de arguido, com todos os direitos inerentes.

  8. Por usurpação do Poder Judicial confiado aos tribunais comuns, ao condenar o Recorrente por crimes! A preocupação que houve foi apenas a de enquadrar criminal e penalmente, esquecendo-se que estamos no âmbito de um processo disciplinar, de foro administrativo.

  9. Por a decisão proferida neste processo disciplinar estar enfermada claramente de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito.

  10. Não bastando, são várias as condenações baseadas em factos já prescritos, mormente no que à acusação referente à aquisição de envelopes em 1998-99, ao atraso no pagamento de ajudas de custo no ano 2000 e à estadia no Hotel ... em 2002 concerne.

  11. Tudo razões porque a presente acção deve ser julgada provada e procedente, devendo na sequência ser a decisão que aplicou a pena de demissão ao funcionário A... revogada e o processo disciplinar declarado nulo, com as consequências peticionadas, mormente, ser o B... condenado a repor a situação, com a reintegração do Requerente nas suas funções de Chefe de Secção, devendo ainda ser pagos ao mesmo todas as remunerações e suplementos a que tem direito desde o dia em que foi afastado da ... e, até à sua integral reintegração ser aplicada a Sanção Pecuniária Compulsória.

  12. Sem condescender, sempre se dirá igualmente que a haver alguma sanção a mesma nunca poderia ser a sanção de Demissão, por esta ser a sanção mais gravosa, e por a mesma só dever ser aplicada quando não hajam circunstâncias dirimentes, atenuantes ou especialmente atenuantes, como a culpa diminuída, como seria sempre aqui o caso.

    JUSTIÇA!".

    O R. B... contra-alegou, dizendo em CONCLUSÃO: "

    1. As alegações do A. reproduzem e repetem quase textualmente a sua defesa e a p.i., sendo estas peças, procedimental e processuais, praticamente iguais.

    2. Não tendo o Alegante carreado para o processo através das alegações nada de novo e que já não tenha aduzido na defesa e na p.i.

    3. Ora, sendo a mesma a matéria das referidas peças, a impugnação que lhes foi oposta no relatório final do procedimento disciplinar e na contestação da presente acção são igualmente relevantes em sede de contra-alegações, pois por si só bastam para rebater, contraditar e impugnar, especificada e globalmente, tudo quanto em contrário foi invocado pelo Autor.

    4. Pelo que se têm aqui por inteiramente reproduzidos, para todos os efeitos legais.

    Termos em que se mantém e renova o pedido formulado na Contestação".

    Em cumprimento do disposto no artº 92º, do CPTA, foi remetido aos Srs. Conselheiros Adjuntos projecto de acórdão.

    1. FUNDAMENTAÇÃO II.1.1.

    Com base nas alegações das partes, declarações produzidas nos processos de inquérito e disciplinar e documentos juntos aos autos (e naqueles processos), elementos que serão espacialmente destacados mais à frente, julgam-se provados os seguintes FACTOS: 1. O Autor é chefe de secção na Secção Regional dos Açores do B... (...).

  13. Pelo Serviço de Apoio do B..., com a data de 3 de Maio de 2006 foi elaborada a seguinte Proposta, a que coube o n.° 4/06 SDG/...: "1- O Decreto-Lei n.° 72/96, de 12 de Junho, veio estabelecer um regime de incentivos gerais (artigo 1 e de incentivos especiais (artigo 3.°) ao exercício de funções nas Secções Regionais dos Açores e da Madeira, de molde a tomar atractiva a fixação de pessoal devidamente habilitado, que permita a prossecução das respectivas atribuições (vide preâmbulo).

    2- De entre os incentivos gerais, e segundo a alínea a) do nº 1 do artigo 1.º do mencionado Decreto-Lei n.° 72/96, realça-se - pelo particular interesse que reveste para o caso sub judice -, que os funcionários e agentes, em exercício de funções nas Secções Regionais dos Açores e da Madeira, têm direito a uma passagem paga, por ano, para férias no Continente ou na sua ilha de origem, para si e respectivo agregado familiar.

    3- Analisando o Memorando anexo, datado de 2006-04-28, cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido para os necessários e legais efeitos, constata-se que o funcionário A..., Chefe de Secção da ..., em especial nos anos de 2005, 2004, 2003 e 2002, fez uma utilização ilegítima e ilegal das passagens para férias por si requisitadas naqueles períodos, em desrespeito do regime jurídico instituído pela norma contida na citada alínea a) do nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei n.° 72/96.

    4- Os factos apontados, para além de poderem integrar 5 tipos legais de crimes (3 crimes de falsificação de documentos e 2 crimes de peculato, puníveis com penas de prisão até 5 anos e até 8 anos, respectivamente), são susceptíveis de serem punidos disciplinarmente com a pena de demissão, por poderem subsumir-se nas alíneas b), d) e f) do n.° 4 do artigo 26.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 24/84, de 16 de Junho, e aplicável aos funcionários do B..., ex vi do artigo 46.° do Decreto-Lei n.° 440/99, de 2 de Novembro.

    5- Para efeitos de prescrição do procedimento disciplinar, aplicam-se aqui os prazos estabelecidos na lei penal, isto é, 10 anos, no caso dos crimes de peculato, e 5 anos, no caso dos...

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