Acórdão nº 07S4006 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

O STAD - Sindicato dos Trabalhadores de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas propôs no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção contra a AA - Sociedade de Limpezas Industriais, S. A.

, pedindo que a ré fosse condenada a reconhecer a legalidade das greves por ele decretadas nos dias 16 de Maio e 11 e 12 de Junho de 2002, com a consequente nulidade dos procedimentos disciplinares por causa delas instaurados a 38 dos seus associados, que identificou, e a pagar a cada um deles as quantias de € 25,14 e de € 88,60, acrescidas de juros de mora até integral pagamento, a primeira respeitante à sanção disciplinar de três dias de suspensão com perda de retribuição e a segunda a diferenças salariais relativas ao subsídio de refeição.

Em resumo, o autor alegou o seguinte: A ré é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza e que, em Fevereiro de 2002, lhe foi adjudicada a prestação de serviços de limpeza no Hospital do Barreiro, sucedendo nesse empreitada à outras empresas prestadores de serviços que ali executavam a mesma actividade.

Por força do disposto na Cl.ª 17.ª do CCT para as Empresas Prestadoras de Serviços de Limpeza (publicado no BTE n.º 7/2001, com PE publicada no BTE n.º 32/2001), os trabalhadores que executavam serviços de limpeza no Hospital do Barreiro, ao serviço das empresas que antecederam a ré, mantiveram com esta os seus contratos de trabalho.

Em 3 de Agosto de 1990, o autor celebrou com a Climpe, empresa que então tinha a seu cargo a execução dos serviços de limpeza no dito Hospital, um acordo nos termos do qual aquela empresa se obrigou a pagar, naquele local, o subsídio de alimentação pelos valores aplicáveis à função pública, sendo actualizados na medida em que o fossem os subsídios de alimentação que vigorassem na função pública.

Nos termos da Cl.ª 17.ª, aquele acordo sempre foi cumprido pelas empresas que, naquele Hospital, se foram sucedendo na prestação de serviços de limpeza.

Nos termos das Portarias n.º 88/2002, 303/2003 e 205/2004, os valores daquele subsídio na função pública foram respectivamente de € 3,49, € 3,58 e € 3,70.

Durante o período em que prestou serviços de limpeza no Hospital do Barreiro (desde Fevereiro de 2002 até 30 de Abril de 2004), a ré recusou-se a pagar aqueles montantes, tendo pago apenas a € 3,39, a título de subsídio de alimentação.

No uso do direito previsto nos artigos 2.º e 5.º da Lei da Greve (Lei n.º 65/77, de 26/8), na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 30/92, de 20/10, em 10 de Maio d 2002, o autor efectuou um pré-aviso de greve para o dia 17 do mesmo mês e ano e, em 4 de Junho de 2002, efectuou outro pré-aviso de greve para os dias 11 e 12 de Junho de 2002.

A ré comunicou aos trabalhadores que prestavam limpeza no Hospital que aquelas greves eram ilegais e que se reservava o direito de instaurar procedimentos disciplinares aos trabalhadores que a elas aderissem, o que veio efectivamente a fazer relativamente aqueles 38 trabalhadores que foram acusados de faltas injustificadas.

Os trabalhadores em causa foram acusados pela ré de faltas injustificadas, por terem aderidos às aludidas greves que a ré considerou ilegais, por não ter sido respeitado o pré-aviso de 10 dias e, posteriormente, punidos disciplinarmente com três dias de suspensão com perda de retribuição.

As referidas sanções disciplinares são ilícitas, não só porque o aviso prévio a observar era de 5 e não de 10 dias, uma vez que a actividade da ré não está abrangida pela previsão do art.º 8.º da Lei n.º 65/77, mas também porque, ainda o disposto no art.º 11.º da referida Lei não permite a instauração de procedimento disciplinar por actos praticados durante a greve, ainda que esta seja ilegal.

A ré contestou alegando, em resumo, que as faltas dadas pelos trabalhadores, durante os dias de greve, eram injustificadas, por não ter sido observado o pré-aviso legal que, no caso, era de dez dias, por força do disposto nos artigos 5.º, n.º 2 e 8.º, n.º 1 e n.º 2, al. b), da Lei n.º 65/77, uma vez que o normal funcionamento dos hospitais pressupõe a indispensabilidade de condições de higiene nas suas instalações.

Na 1.ª instância, a acção foi julgada procedente, mas apenas no que toca ao subsídio de alimentação, tendo a ré sido condenada a pagar a cada um dos 38 trabalhadores identificados na petição inicial a quantia de € 88,60, acrescida de juros de mora desde a citação.

A ré recorreu, mas o recurso não foi admitido.

O autor também recorreu, mas o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso e confirmou a sentença.

Mantendo o seu inconformismo, o autor interpôs o presente recurso de revista, concluindo as suas alegações da seguinte forma: 1. O A. intentou acção contra a ré, impugnando os processos disciplinares instaurados aos seus associados que aderiram às greves, por si convocadas, nos dias 17 de Maio e 11 e 12 de Junho de 2002, e as sanções de multa que, em consequência, lhes foram aplicadas, invocando que a R. instaurara aqueles processos disciplinares com o fundamento de que as greves tinham sido ilegais, por não respeitarem o pré-aviso legalmente estabelecido.

  1. Pedia ainda o autor a condenação da ré: a) No reconhecimento de que as greves declaradas o haviam sido com observância das exigências legais, com a consequente nulidade dos processos disciplinares instaurados e o pagamento a essas trabalhadoras dos valores indevidamente descontados; b) No pagamento de vários subsídios devidos a trabalhadores seus associados; 3. A autora é uma Associação Sindical regularmente constituída, que representa, entre outros, os trabalhadores de limpeza que prestam a sua actividade ao serviço de empresas prestadoras de serviços de limpeza, sendo, de há muito, o Sindicato Nacional com maior expressão de representatividade destes trabalhadores e a ré é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza.

  2. Em Fevereiro de 2002, à ré foi adjudicada a prestação de serviços de limpeza no Hospital do Barreiro, sucedendo na execução daquela empreitada a outras empresas prestadoras de serviços de limpeza que ali executavam a mesma actividade.

  3. No uso do direito previsto nos art.os 2.º e 5.º da Lei da Greve (Lei 65/77 na redacção dada pela Lei 30/92), o autor efectuou, em 10 de Maio de 2002, um pré-aviso de greve a ter lugar no dia 17 de Maio de 2002, com início às 0h00 desse dia e com a duração de 24 horas, conforme documento que se juntou (doc. 1, junto com a petição inicial ) e, em 4 de Junho de 2002, o autor efectuou novo pré-aviso de greve a ter lugar nos dias 11 e 12 de Junho de 2002, com início às 0h00 do primeiro daqueles dias e termo às 24h00 do dia 12 (doc. 3, junto com a petição inicial).

  4. A instauração daqueles procedimentos disciplinares pela ré aos associados do autor que aderiram àquelas greves, com fundamento no facto de não ter sido observado o pré-aviso de 10 dias previsto no art. 5.º da Lei da Greve, para os casos de empresas destinadas à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, foi ilícita, quer por não poder existir procedimento disciplinar por actos praticados durante a greve, quer por a greve não ter sido declarada com inobservância dos formalismos legais aplicáveis.

  5. Não existindo uma definição legal do conceito de greve, a doutrina e a jurisprudência têm entendido aquele conceito como correspondendo a uma actuação colectiva e concertada de um grupo de trabalhadores que, em regra, implica uma abstenção total ou parcial da prestação de trabalho, como um instrumento de pressão para realizar interesses comuns - ver, por todos, o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria da República homologado em 22/1/98 (disponível em www.dgsi.pt), J. Canotilho e Vital Moreira (in Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 1984) e Bernardo Lobo Xavier (in Direito de Greve, Lisboa, 1984).

  6. Quer isto dizer que, cumprindo ou não os formalismos legalmente previstos, havendo uma actuação colectiva e concertada de um grupo de trabalhadores que, em regra, implica uma abstenção total ou parcial da prestação de trabalho, como um instrumento de pressão para realizar interesses comuns, existe uma greve e a essa greve são aplicados os arts. 7.º e 10.º da Lei da Greve, o que implica que se suspendem as relações decorrentes do contrato de trabalho, estando proibidas as formas de punição dos trabalhadores grevistas, por actos praticados durante a greve.

  7. Assim, sendo embora verdade que o art. 11.º da Lei da Greve previa que as greves declaradas com inobservância do previsto nas suas normas sujeitava os trabalhadores grevistas ao regime das faltas injustificadas, tal norma deve ser entendida, por conjugação com os arts. 7.º e 10.º da Lei da Greve, como não possibilitando o exercício de acção disciplinar do empregador por actos praticados pelo trabalhador durante o período da greve.

  8. Deste modo, para não entrar em contradição com os citados arts. 7.º e 10.º da Lei da Greve, aquele art. 11.º deve ser entendido unicamente como...

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