Acórdão nº 0830/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução20 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A..., SA, com melhor identificação nos autos, veio recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF), de 8.3.07, que julgou procedente o recurso contencioso deduzido pela Associação Empresarial de Viana do Castelo, B...

e C...

do despacho Vereador da Área de Planeamento e Gestão Industrial da Câmara Municipal de Viana do Castelo, de 14.8.02, que licenciou a obra de interface de Transportes/Espaços Comerciais, a construir em quatro prédios de que era proprietária nesta cidade.

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: I. A douta sentença recorrida deu apenas como provada a matéria transcrita a fls. 271 e 272, não obstante as partes terem articulado inúmeros factos, cuja relevância parece evidente para a boa decisão da causa, como sejam, nomeadamente, os factos constantes dos artigos 6.º a 37.º, 46.º e 48.º da contestação da ora recorrente.

  1. A sentença recorrida, violou o nº 3 do artigo 659.º do C.P.C., enfermando de inequívoca nulidade, por força da alínea b) do nº 1 do artigo 668.º do C.P.C..

  2. Nos artigos 46.º a 50.º da contestação, bem como nas suas alegações, a ora recorrente invocou a ilegitimidade activa da Autora, Associação Empresarial, face ao disposto nos artigos 2.º e 3.º da Lei nº 83/95.

  3. A sentença recorrida limitou-se a decidir que os autores recorrentes (todos e cada um deles) deteriam legitimidade para ser parte no presente processo, sem que tenha fundamentado tal conclusão nas normas legais aplicáveis, ou seja na Lei nº 83/95.

  4. Assim, também nesta parte, a sentença enferma de nulidade, agora por força do disposto nos artigos 660.º e 668.º nº 1, alínea d) do C.P.C..

  5. Não existe qualquer preceito legal (nomeadamente do RJUE) que permita concluir que a cada prédio preexistente apenas poderá corresponder um único edifício, e que, consequentemente, enfermar de ilicitude o pedido de licenciamento de edificação que incida sobre dois ou mais prédios, sendo, por isso, inválido o acto administrativo que aprove o licenciamento de semelhante operação urbanística.

  6. A alínea b) do nº 1, do número 11 da Portaria nº 1110/2001, de 19 de Setembro, determina que tais pedidos devem ser instruídos com certidão da descrição predial "referente ao prédio ou prédios abrangidos" (negrito nosso), daí se inferindo que o legislador admite que um mesmo pedido de licenciamento de obras de edificação abranja mais do que um prédio.

  7. A sentença recorrida labora em manifesto erro de interpretação jurídica, violando o disposto nas alíneas b) e i) do artigo 2.º do RJUE, quando faz apelo aos conceitos de "obras de construção" e de "operações de loteamento", já que parte do pressuposto que a operação urbanística licenciada pelo acto impugnado deu origem à constituição de um lote destinado à edificação urbana, e, nessa medida, consubstanciaria um loteamento/emparcelamento.

  8. Ainda que se admitisse que o licenciamento das obras de edificação em causa deveria ter sido precedido de uma operação de loteamento/emparcelamento, jamais aquele vício poderia implicar a nulidade do acto praticado, por aplicação da alínea a) do artigo 68.º do RJUE.

  9. No caso "sub judice" não existe qualquer licença/autorização de loteamento pelo que é óbvio que o acto impugnado não pode ter violado as respectivas determinações, e se o não violou, óbvio será também que o dito acto não padecerá da nulidade prevista no citado preceito.

  10. Nem o artigo 68.º do RJUE nem qualquer outra norma jurídica, comina com nulidade o licenciamento de obras de construção de edifícios em área não objecto de loteamento, pelo que também por esta razão será infundado concluir, como o faz a sentença sob recurso, pela nulidade do acto impugnado.

  11. Se interpretarmos correctamente o conteúdo e alcance do acto impugnado, forçoso será reconhecer que este acto de licenciamento contém, em si, um outro acto implícito de autorização do emparcelamento dos prédios em causa.

  12. A Câmara Municipal de Viana do Castelo, através do competente vereador do pelouro, decidiu licenciar a construção de edifício implantado em quatro prédios distintos pelo que implicitamente autorizou o emparcelamento destes prédios.

  13. O acto de licenciamento impugnado contém, em si mesmo, um acto implícito de autorização de emparcelamento e nessa medida não padece do vício que lhe é imputado pela sentença objecto do presente recurso.

  14. A sentença recorrida violou o disposto no nº 3 do artigo 659.º do C.P.C., enfermando de nulidade por força do estatuído nos artigos 660.º e 668.º nº 1, alíneas b) e d) do mesmo Código, tendo ainda desrespeitado, ao declarar nulo o acto recorrido, o estatuído no artigo 68.º do RJUE.

Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença proferida e mantendo-se válido o acto impugnado.

Os recorridos pronunciaram-se pelo improvimento do recurso.

O Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o seguinte parecer: "A..., SA, recorre da decisão do TAF do Porto que declarou nulo o despacho do Vereador da Área de Planeamento e Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Viana do Castelo, datado de,14.8.2002, que licenciou a construção de um edifício destinado a Interface de Transportes/Espaços Comerciais", na acção popular, na modalidade de recurso contencioso, interposta pela Associação Empresarial de Viana do Castelo e outros, pedindo a sua revogação. Em sede de argumentação conclusiva alega que a sentença recorrida violou o disposto no nº 3 do artº 659.º do CPC, enfermando de nulidade por força do estatuído nos artigos 660.º e 668.º nº 1, alíneas b) e d) do mesmo Código, tendo, ainda, desrespeitado, ao declarar nulo o acto recorrido, o estatuído no artº 68.º do RJUE. A nulidade, por violação do disposto no nº 3 do artº 659.º do CPC decorrerá do facto de a sentença ter apenas dado como provada a matéria transcrita a folhas 271 e 272, não obstante as partes terem articulado factos, tais como os constantes dos artigos 6º a 37.º, 46.º e 48.º, da contestação, cuja relevância parece evidente para a boa decisão da causa. E a nulidade, por força do disposto nos artigos 660.º e 668.º nº 1, alínea d), decorrerá do facto de a Recorrente ter invocado a ilegitimidade activa da Autora, Associação Empresarial, face ao disposto nos artigos 2.º e 3.º da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto, e a sentença ter-se limitado a decidir que os autores teriam legitimidade para ser parte no processo, sem que tenha fundamentado tal conclusão na Lei nº 83/95. No desrespeito pelo disposto no artº 68.º do RJUE, alega a Recorrente, "que não existe qualquer preceito legal (nomeadamente no RJUE) que permita concluir que a cada prédio preexistente apenas poderá corresponder um único edifício e que, consequentemente, enfermará de ilicitude o pedido de licenciamento de edificação que incida sobre dois ou mais prédios, sendo, por isso, inválido o acto administrativo que aprove o licenciamento de semelhante operação urbanística e, ainda, que se admitisse que o licenciamento das obras de edificação em causa deveria ter sido precedido de uma operação de loteamento/emparcelamento, jamais aquele vício poderia implicar a nulidade do acto praticado, por aplicação da alínea a) do artigo 68.º do RJUE. Além de que "a sentença recorrida labora em manifesto erro...

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