Acórdão nº 0607/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução20 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A..., Magistrada do Ministério Público com melhor identificação nos autos, veio intentar a presente acção administrativa especial contra o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), visando a anulação da sua deliberação, de 14.3.07, que lhe atribuiu a classificação de Suficiente.

Alegou, sucintamente, que, sendo Procuradora-Adjunta na Comarca de Aveiro, por acórdão do CSMP (Plenário) de 14.3.07, foi-lhe atribuída a classificação de serviço de Suficiente, após a realização de uma inspecção aos serviços de que era responsável, referente ao período compreendido entre 1.6.00 e 21.6.04, deliberação essa que padece de ilegalidade por errada aplicação do art.º 110 do Estatuto do Ministério Público (EMP) e do art.º 13 do Regulamento de Inspecções do Ministério Público, tudo se traduzindo em "erro manifesto de apreciação indiciador de violação do princípio da proporcionalidade".

Contestou a autoridade demandada referindo que a deliberação impugnada era inteiramente legal. Adiantou, ainda, que a prática do acto administrativo em apreciação se inscrevia "no exercício de uma actividade discricionária, o que permite que no desempenho dessa tarefa o CSMP actue com significativa liberdade e possa avaliar os elementos ao seu alcance que não tenham valoração fixada na lei de acordo com o seu critério", concluindo que o acto classificativo só "é sindicável em caso de existência de erro grosseiro, o que manifestamente não ocorre na situação em presença".

Não se colocando nenhuma das situações enunciadas no art.º 87, n.º 1, do CPTA foram as partes notificadas para apresentar alegações.

A autora não alegou e a entidade demandada pronunciou-se reafirmando que o acto não enferma do vício que lhe é apontado, devendo ser mantido.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

II Factos Matéria de facto relevante que importa fixar: 1.

No âmbito do plano de inspecções delineado pelo CSMP para o ano de 2004, o trabalho desenvolvido pela autora na Comarca de Aveiro foi objecto de uma inspecção que abrangeu o período compreendido entre 1.6.00 e 21.6.04 (fls. 25/66 do pedido de suspensão de eficácia).

2.

O relatório então elaborado, cujo teor se dá aqui como inteiramente reproduzido, apresentava um item denominado CONCLUSÕES E PROPOSTA com o seguinte teor: "7.

CONCLUSÕES E PROPOSTA.

A Lic. A... ingressou na magistratura do Ministério Público há mais de treze anos, sendo pela terceira vez avaliado o seu mérito profissional. A derradeira classificação foi de mérito (BOM COM DISTINÇÃO), tendo incidido sobre desempenho no 3.º Juízo Criminal de Aveiro e, residualmente, na comarca de Vagos, onde despachou sobretudo inquéritos. Tivemos acesso ao correspondente relatório de inspecção. As informações da Hierarquia são globalmente positivas, acentuando a sua boa preparação técnica. Mas, as respeitantes a 2003 verberam a sua actuação nos inquéritos ao nível da quantidade de trabalho desenvolvido.

A resposta foi má.

A inspecção observou o seu desempenho em áreas distintas.

Na função de representação do Ministério Público junto do 3.º Juízo Criminal o relatório deixa circunstanciada apreciação da sua prestação funcional, que se alcandorou a nível francamente positivo. Nada de estranhar perante a anterior inspecção a que foi sujeito o seu serviço no mesmo Juízo, meritoriamente avaliado. De boa valia, embora de menor exigência, foi a sua actuação funcional junto do 3.º Juízo Cível. Pecou aqui por alguns injustificados atrasos na movimentação dos processos administrativos. Em 15 de Setembro de 2002, a inspeccionada transitou para o despacho dos inquéritos. Na adaptação ao novo serviço experimentou visíveis dificuldades, saldando-se o exercício muito negativamente, fruto de uma actuação desinteressada, desorganizada, sem método, com indefinição de prioridades e deficiente capacidade de decisão que culminou com um inaceitável e acentuadíssimo crescimento das pendências. O relatório é eloquente a tal respeito. E certo que a Lic. A... trabalhou em circunstâncias adversas, explicando o descalabro com as faltas dadas ao serviço e, sobretudo, com uma depressão que há muito a vem apoquentando seriamente e que, nas suas palavras, conduziu a um "estado de exaustação e perda de capacidade de concentração, de atenção e de organização do discurso escrito em tempo médio aceitável". Confessando a incapacidade para lidar com o trabalho no âmbito dos inquéritos, manifestou ao directo hierarca o desejo de ser recolocada nas suas anteriores funções. As faltas dadas ao serviço acabaram por não prejudicar significativamente os resultados da sua actividade porquanto ocorreram prontas substituições pelos colegas que despacharam os inquéritos da sua letra. Não duvidamos dos nefastos efeitos da depressão e outros problemas que afligiram a inspeccionada no seu desempenho. O certo é que, objectivamente, se atingiu um degradado e inadmissível estado de coisas ao nível dos inquéritos, onde a sua actuação se processou em termos claramente insatisfatórios, com o inevitável reflexo na proposta classificativa. A Lic. A... é detentora de elevada craveira intelectual e de preparação técnica assinalável, revelada também na fase do inquérito. De resto, os trabalhos juntos disso são claro testemunho. A ensombrar o desempenho não esteve seguramente um menor apetrechamento técnico. Algumas lacunas e deficiências registadas não tiveram a necessária expressão para pôr em causa tal juízo.

Em razão do exposto, propõe-se que à Senhora Procuradora-Adjunta Lic. A... , pelo serviço prestado na comarca de Aveiro, no período compreendido entre 1 de Junho de 2000 e 21 de Junho de 2004, seja atribuída a classificação de "SUFICIENTE"." 3.

No mesmo relatório, na parte respeitante aos inquéritos (ponto 5.2.2.), vê-se o seguinte: "5.2.2.

NO ÂMBITO DOS INQUÉRITOS.

Passa-se à apreciação da prestação nos inquéritos sendo que, a partir de 15 de Setembro de 2002, ficou responsabilizada pelo despacho dos correspondentes à letra "C", como se deixou oportunamente assinalado. O exercício culminou realmente em 12 de Abril de 2004, data em que a inspeccionada deu início a faltas por doença que se prolongaram até cessar funções na comarca (21.6.04). O seu desempenho nos inquéritos durou, assim, aproximadamente 12 meses, sendo de todo pertinente relembrar aqui o registo das faltas por doença dadas pela inspeccionada nesse entretanto. Esteve ausente entre 8 e 22 de Maio de 2003 (15 dias), entre 17 de Junho e 15 de Julho de 2003 (29 dias) e entre 12 de Março e 2 de Abril de 2004 (22 dias). Faltou, portanto, 66 dias ao serviço naquele período aproximado de 19 meses. Pelo Provimento n.º 162, de 2.10.01, ficou estabelecido que a ausência, por período igual ou superior a 15 dias, determinaria que os inquéritos fossem despachados pelos Colegas do faltoso. Para além de despachos intercalares, muitos foram os despachos finais prolatados pelos Colegas da inspeccionada, em sua substituição. Antes de prosseguirmos com a análise da prestação, em termos quantitativos, da inspeccionada, abra-se um parêntesis para breve abordagem ao incidente suscitado a propósito do registo, autuação e distribuição de inquéritos entrados durante as férias judiciais de Verão de 2003, de que já fizemos referência a fls.12. O despacho prolatado em 104 inquéritos imediatamente após as férias dando sem efeito o registo, distribuição, autuação e conclusão realizados junta-se a fls.53 para a devida apreensão da questão. As circunstâncias que levaram ao procedimento deixou-as a inspeccionada explicitadas no apontamento de fls.127. E sobre o assunto veio a incidir o Provimento n.º 168, de 6.10.03 (a fls.45) que, a final, veio validar genericamente todos os registos de participação comunicados pelos órgãos de polícia criminal ao M.P. durante as férias, verberando a atitude. Bem mais importante do que considerações sobre o merecimento e intrínseca pertinência jurídica da iniciativa da inspeccionada será de registar até pelos transtornos que causou aos Serviços, a precipitação da atitude, seguramente a merecer ponderada discussão prévia com o superior...

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