Acórdão nº 00397/08.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelCatarina Almeida e Sousa
Data da Resolução27 de Janeiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte 1- RELATÓRIO A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A… contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2003, no montante de € 26.304,93, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: A. A douta sentença recorrida concedeu provimento à impugnação e anulou a liquidação adicional de imposto de IRS nº 20075004531067, do ano de 2003, no montante de € 26.304,93, com fundamento no facto de a AT não haver demonstrado “ter proporcionado ao impugnante o exercício do direito de audição prévia, (apesar de no processo administrativo alegar o contrário) e, devendo tê-lo feito, preteriu-se formalidade essencial no procedimento tributário, determinante da anulação da liquidação de IRS, aqui impugnada”.

B. A RFP não se conforma com o assim decidido, por motivos que centra em torno de duas questões essenciais e indissociáveis, porquanto a primeira é premissa da segunda, entendendo primeiramente que, dos factos que se podem extrair dos autos ressalta a conclusão de que a AT demonstrou ter proporcionado ao impugnante a possibilidade de participação no procedimento, em fase anterior à emissão da liquidação oficiosa e, posteriormente que, essa condição dispensa a notificação para efeitos do exercício de audição prévia em momento posterior, nos termos do disposto no art. 60º, nº 2b), da LGT.

C. Ou seja, em face das notificações efectuadas por carta registada em 13.03.2007 e 16.07.2007, em que a AT comunicou ao impugnante a fonte dos rendimentos, a entidade pagadora, o país e o montante que lhe estava a ser imputado, convidando-o a vir apresentar a declaração de rendimentos respectiva, advertindo-o, simultaneamente, que da falta de apresentação da declaração resultaria a fixação de rendimentos nos termos do art. 65º e 66º, deverá considerar-se como cumprido o dever que sobre a AT recai de proporcionar aos contribuintes o exercício do direito de participação antes do acto liquidação.

D. O contribuinte não exerceu o direito de participação naquele momento, porque assim não entendeu, uma vez que tendo algo a opor à justeza dos valores ou à respectiva proveniência, seria, então, o momento adequado para colocar tais objecções à AT, contudo, nada fez, ciente de que então ainda era o momento certo para se apurar de onde e por quem lhe eram pagos rendimentos e se aqueles que ali lhe estavam imputados correspondiam ou não à realidade.

E. A possibilidade de participação do contribuinte na formação do acto tributário foi conferida por estas duas notificações, porque não se ficar preso a uma visão formalista do princípio da participação, prevalecendo a perspectiva substancial do mesmo princípio, que faça incidir a tónica no conhecimento que foi dado ao contribuinte das informações que chegaram até à AT e da intenção de proceder à fixação nos termos da lei por falta de entrega das declarações de rendimentos para os anos em causa, sem que este exercesse qualquer intervenção.

F. Quando o contribuinte não apresenta declaração de rendimentos e o CIRS impõe à AT que, antes de fixar rendimentos, este tenha a oportunidade de conhecer com base em que elementos a AT se propõe fixar esses rendimentos, isto mais não é do que uma norma fora da LGT que consagra uma disposição específica que visa a participação do contribuinte, ou através da apresentação da declaração por si mesmo ou vindo junto da AT contrapor o que lhe aprouver para obviar às intenções que lhe foram comunicadas.

G. Neste circunstancialismo, deve ser considerado, para este efeito, que a notificação efectuada para apresentação da declaração de rendimentos, se substitui à notificação para o exercício do direito de audição, cumprindo a mesma função, tanto assim que o legislador, nessas circunstâncias dispensou expressamente essa notificação posterior, nos termos do art. 60º, nº 2 da LGT.

H. Por outro lado, a fixação efectuada nos termos do disposto no art. 65º e 66º do CIRS (seguindo o disposto no art. 76º, nº 3 de mesmo código), integra os valores objectivos previstos na lei que o legislador teve em vista quando estabeleceu, no art. 60º, nº 2 b) da LGT, que se dispensa a audição prévia quando a liquidação se efectuar oficiosamente, “com base em valores objectivos previstos na lei”, desde que previamente notificado para entregar a declaração em falta sem que o tenha feito.

I. A fixação dos rendimentos era efectuada, nos termos da redacção do art. 76º, nº 1 b) do CIRS, que previa que seria tomada por referência a totalidade da matéria colectável do ano mais próximo em cujo ano tivessem sido considerados rendimentos da categoria B (caso não tivesse cessada a actividade) – contudo, este contribuinte só havia declarado rendimentos no ano de 1998 e em IVA encontrava-se com a actividade cessada desde 31.12.1998, J. Pelo que, houve que proceder nos termos da redacção de então, do art. 76º, nº 1 c), e, para a liquidação, a AT tomou por base outros elementos de que dispunha, especificamente, os remetidos pela AT espanhola ao abrigo da cooperação entre Estados e imputou no anexo J, relativo a rendimentos obtidos no estrangeiro os que daquelas informações resultaram.

K. A LGT sofreu, pela Lei 53-A/2006 de 29.12, alteração da redacção do art. 60º, nº 2, passando a prever mais um caso em que é dispensada a audição prévia do contribuinte, que é aquele em que a liquidação se efectua oficiosamente, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito (situação vertente nos autos).

L. A natureza da alteração introduzida é procedimental, não contendendo com direitos nem implicando a sua aplicação retroactiva, se aplicada a situações em que a detecção da falta de apresentação da declaração e a notificação efectuada para que viesse apresentá-la ocorreu já em plena vigência do Art. 60º, nº 2 b), da LGT, pelo que plenamente aplicável à data do procedimento aqui visado.

M. A douta decisão entendeu que, na situação vertente, não nos encontramos num caso que integre uma fixação oficiosa efectuada com base “nos valores objectivos previstos na lei”, para efeitos do disposto no art. 60º, nº 2 b), da LGT, com o que não nos podemos conformar, porque as situações que o legislador teve em vista quando introduziu no nº 2 do art. 60º da LGT aquela dispensa foram precisamente aquelas em que se aplicam os dispositivos do CIRS que permitem a emissão das liquidações oficiosas no caso de falta de entrega de declaração, que foram os aplicados na situação dos autos.

N. Para efeitos do que o legislador pretendeu ao consagrar a dispensa de audição prévia, quando o contribuinte foi notificado previamente para entregar a declaração, a fixação oficiosa efectuada de acordo com os valores que objectivamente estão fixados na lei, tanto é aquela que é efectuada nos termos do art. 76º, nº 1 b), como a que é efectuada nos termos do art. 76º, nº 1 c).

O. Ou seja, os valores objectivos previstos na lei são: os que a AT apurar, na falta de entrega da declaração à AT, em primeiro lugar recorrendo à matéria colectável do ano mais próximo e, na falta da possibilidade de aplicação deste critério, os que a AT apurar, aplicando o critério dos “outros elementos que tenha ao seu dispor”.

P. Ao usar este segundo critério, a AT não deixa de estar a fixar a matéria colectável “de acordo com os valores objectivos previstos na lei”, apenas porque os elementos que tem ao seu dispor lhe foram fornecidos no âmbito da troca espontânea de informações.

Q. Concluindo, os “valores objectivos previstos na lei”, mencionados para efeitos do disposto no art. 60º, nº 2 b), da LGT eram os das alíneas b) e c) do art. 76º nº 1 (redacção introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro), pois que, não há outros valores objectivos previstos na lei para a AT fixar os rendimentos no caso de não apresentação da declaração de rendimentos de IRS pelos contribuintes, senão mencionados, que possam ser os visados pelo legislador naquele normativo.

R. Pelo que, não assiste razão ao contribuinte na alegada violação do direito de audição, porque lhe foi proporcionada a intervenção no procedimento em momento anterior, já que estamos perante uma situação em que é dispensada a notificação para o exercício do direito de audição antes da emissão da liquidação, em virtude, precisamente, de ter sido previamente notificado para apresentar a declaração em falta...

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