Acórdão nº 666/04.2TTVFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Janeiro de 2012

Data25 Janeiro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I – 1.

Aos 24.01.2004, AA, casado, com os sinais dos Autos, instaurou no Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira, contra «BB– … S.A.

», acção declarativa de condenação, com processo comum, pedindo que seja anulada a sanção de repreensão registada que a Ré lhe aplicou em 5.8.2002 e declarada a ilicitude do seu despedimento, com a consequente condenação da Ré: a) a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, se não optar, entretanto, pelo recebimento da indemnização; b) a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir, sendo já as vencidas no montante de € 1.762,50; c) a pagar-lhe a quantia de € 31.977,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais; d) em quantia a liquidar posteriormente, e correspondente às gratificações que lhe caberiam, nos termos da Portaria 1159/90 de 27.11, caso estivesse ao serviço da Ré desde a data do despedimento e até à sua reintegração, ascendendo as vencidas ao montante de € 1.111,87; e) nos montantes que seriam normalmente depositados no Fundo Especial de Segurança Social dos Profissionais da Banca dos Casinos, a favor do Autor, igualmente a liquidar posteriormente.

Mais pediu o A. que seja declarado que tem direito a receber vencimento base, aferido com base no mesmo horário de trabalho, superior no mínimo em um cêntimo ao auferido pelos pagadores ao serviço da Ré, devendo esta ser ainda condenada a pagar-lhe as diferenças retributivas respeitantes ao período de Abril de 2002 em diante, a liquidar posteriormente, e ainda a quantia de € 523,65, tudo acrescido dos juros à taxa legal a contar da citação.

Para tanto, alegou, em síntese útil, que, em Junho de 1970, foi admitido ao serviço da sociedade “CC– … Ld.ª”, para prestar serviço no Casino de Espinho.

A partir de 1974, passou a Ré a explorar aquele Casino, tendo o A. continuado a exercer as funções como até então, mas desta vez, sob as ordens da Ré.

Desde Abril de 1990, o A. exerce as funções de fiscal de banca (anteriormente exercia as funções de pagador), sendo membro da Direcção do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Centro desde 8.7.2001.

A partir do momento em que passou a exercer as funções de dirigente do Sindicato e a acusar as irregularidades cometidas na empresa, o A. foi alvo de "pressões" exercidas por parte da Ré, nomeadamente a instauração de sucessivos processos disciplinares, sendo que a sua entidade patronal sempre assumiu um tratamento disciplinar diferente em relação a outros trabalhadores, seus colegas.

Acresce que a partir de Março de 2002 o A. foi alvo de discriminação por parte da Ré, já que esta pagava aos pagadores vencimento superior àquele que o A. auferia, apesar de trabalharem menos uma hora por dia.

Em 5.8.2002, a Ré aplicou ao A. a sanção disciplinar de repreensão registada, sendo que a mesma é infundada e carecida de justa causa.

E em 16.3.2004, a Ré despediu o A., após instauração de processo disciplinar, despedimento que se baseou em factos não verdadeiro, sendo, de qualquer maneira, a sanção aplicada manifestamente desajustada ao comportamento imputado ao Autor e à prática disciplinar da empresa, a determinar a ilicitude do despedimento.

2.

A Ré contestou, defendendo a existência de justa causa na aplicação das sanções de repreensão registada e despedimento, concluindo que o A. não tem direito às remunerações que reclama, designadamente, com base na retribuição paga aos pagadores da banca.

Pede, assim, a improcedência da acção.

3.

Discutida a causa, foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e a condenar a Ré a pagar ao A. a quantia de € 523,65 e juros de mora, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento, absolvendo-se a Ré do restante pedido.

4.

O Autor, inconformado, recorreu, pedindo a alteração da decisão sobre a matéria de facto, nos termos que indica nas conclusões do recurso, e a revogação da sentença, com a sua substituição por acórdão que julgue o despedimento do Autor ilícito e anule a sanção de repreensão registada, condenando a Ré nos pedidos formulados na petição.

A Relação, por acórdão de fls. 595 e segs., decidiu, ao abrigo do disposto no art. 712.º, n.º 4, do C.P.C., anular o julgamento e actos posteriores com vista a novo julgamento destinado à ampliação da matéria de facto que nela se consigna.

O A. veio aditar novo pedido, solicitando que a Ré seja condenada a pagar--lhe os montantes correspondentes à diferença entre os valores que recebeu e venha a receber, decorrentes da pensão de reforma que aufere, e os que receberia durante o mesmo período caso tivesse continuado regularmente a prestar a sua actividade profissional para a Ré até, pelo menos, aos 65 anos de idade, a liquidar "em execução de sentença".

A Ré respondeu (fls. 717) no sentido da improcedência do pedido aditado, alegando que a situação de reforma por velhice é um direito e que determina a caducidade do contrato de trabalho.

Por despacho de fls. 719, foi o referido aditamento admitido.

Realizada a nova Audiência de discussão e julgamento, proferiu-se sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo a Ré dos pedidos.

5.

Irresignado, veio o A. recorrer, mas sem sucesso, já que a Relação do Porto, pelo Acórdão que constitui fls. 863-888, deliberou, por unanimidade, negar provimento à Apelação, confirmando a decisão impugnada.

Ainda inconformado, o A., insurgindo-se contra ao assim ajuizado, traz-nos a presente Revista, cujas alegações remata com este quadro de síntese: 1. A sanção de despedimento que vitimou o recorrente foi manifestamente excessiva e desproporcionada, face ao respectivo comportamento e a todas as circunstâncias que o rodearam.

2. Com efeito, o próprio conjunto de processos disciplinares que contra ele vinham sendo movidos com acelerada frequência (embora alguns deles concluídos, sem qualquer resultado prático) no período que imediatamente antecedeu a instauração do processo disciplinar que levou ao respectivo despedimento implicava que qualquer trabalhador colocado em idênticas circunstâncias procurasse desde logo acautelar a sua situação, de modo a que qualquer eventual deslize não servisse de fundamento para novo processo disciplinar, ademais quando estava em causa dinheiro, o que tornava ainda mais preocupante um procedimento que fosse adoptado sem regras claras e seguramente sindicáveis por qualquer interessado.

3. Por isso, considera-se que a preocupação de reclamar que a ordem dada o fosse por escrito e fundamentada foi legítima, não havendo nisso qualquer postura de afrontamento deliberado para com o poder de direcção da R.

4. Por outro lado, a prática disciplinar anterior da R., relativamente ao próprio A., não permitiria que, na situação dos autos, lhe fosse aplicada justificadamente a sanção de despedimento que o vitimou.

5. Com efeito, tendo em conta o disposto no art. 396.º, n.º 2, do Código do Trabalho/03, e observando o que (não) foi decidido pela R. relativamente ao processo disciplinar instaurado ao A. em Maio de 2002, do qual faz parte a Nota de Culpa datada de 23 de Maio de 2002, na qual lhe foi também imputada a desobediência a instrução de serviço transmitida por superior hierárquico de não trocar notas de valor inferior € 50,00, desobediência essa que a R. deu como provada, ter-se-á de concluir que a aplicação da sanção de despedimento ao A. por uma alegada recusa, assumida verbalmente, mas nem sequer comprovada ou testada na prática, de adopção de um procedimento, em circunstâncias além do mais passíveis de explicar esse comportamento, não foi a mais consentânea com o disposto no aludido dispositivo legal e com o princípio da proporcionalidade vertido no art. 367.º do referido Código, até pelo facto de o quadro de sanções disciplinares legalmente admissíveis ser manifestamente mais extenso do que era anteriormente ao Código do Trabalho/03, sendo que, entre a repreensão registada e o despedimento, é grande o leque sancionatório previsto na Lei.

6. Perante todo esse quadro, o despedimento do recorrente constituiu sanção francamente desajustada e desproporcionada face ao respectivo comportamento e às circunstâncias em que o mesmo ocorreu, tendo-se verificado por isso uma incorrecta interpretação, perante o quadro factual em presença, do disposto no art. 396.º do Código do Trabalho/2003.

7. Aliás, mesmo que se entendesse que o comportamento do A. era objectivamente censurável, o que só por mera hipótese de raciocínio se coloca, o mesmo apenas poderia justificar uma eventual sanção disciplinar que o alertasse para a necessidade de eventuais alterações na respectiva postura, sanção essa porventura forte, mas nunca a sanção última e extrema que lhe foi aplicada, ademais tendo em conta a prática disciplinar assumida pela R. quer em relação a ele próprio quer em relação a outras situações de recusa de cumprimento de ordens ocorridas na...

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