Acórdão nº 0574/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução18 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A……, LDA, com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, a fls. 756 a 767, que julgou improcedente a acção administrativa especial de condenação à prática do acto devido, na qual era peticionada não só a anulação do acto praticado pelo Exm.º Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, vertido no Despacho n.º 94/2007-XVII, de 29/01/2007, de indeferimento do pedido que aquela sociedade, na qualidade de sucursal incorporante, apresentou ao abrigo do disposto no artigo 69.º do CIRC, de transmissão dos prejuízos fiscais reportáveis acumulados pela sucursal incorporada B……, S.L.- Sucursal em Portugal face à operação de fusão operada em 19/12/2005, como, também, a condenação da Entidade Requerida à prática do acto devido.

1.1.

Neste recurso impugna, ainda, ao abrigo do disposto na norma contida no n.º 5 do artigo 142.º do CPTA, o despacho interlocutório proferido em 10/03/2009 pelo Relator desta acção administrativa especial interposta no Tribunal Central Administrativo Sul, a fls. 402, de recusa, por desnecessidade, de produção da prova testemunhal oferecida pela Entidade Requerente.

1.2.

As alegações de recurso mostram-se rematadas com o seguinte quadro conclusivo: 1.ª Encontrando-nos perante uma acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido, não deve o Tribunal limitar-se a apreciar a decisão proferida pela Administração Fiscal apenas com base nos elementos que a Administração Fiscal dispunha à época, se o interessado, já em sede da própria acção administrativa especial, tiver produzido mais prova destinada a fundar a sua pretensão.

  1. Só por aqui se vê que não andou bem o Tribunal recorrido já que a Recorrente produziu efectivamente abundante prova documental já em sede judicial, no decurso da acção administrativa especial intentada na sequência do indeferimento proferido pela Administração Fiscal e no douto acórdão recorrido nem uma só referência é feita a essa prova.

  2. O Tribunal a quo violou o disposto no art. 66.° nº 2 do CPTA, que define o objecto do tipo de acção em causa, o qual foi assim erradamente configurado pelo Tribunal a quo, pelo que deve ser censurada a decisão recorrida.

  3. Com o devido respeito, o Tribunal a quo limitou-se a reproduzir a argumentação amiúde expendida em anteriores decisões sem atender às especificidades do caso concreto que estava a ser julgado e que são: 1°) a interessada e ora recorrente veio, já em sede da acção judicial de condenação à prática de acto devido, juntar nova prova para melhor funda a sua pretensão; 2°) a Administração Fiscal nunca chegou a apreciar se se verificavam, ou não, no caso concreto, razões económicas válidas, tendo-se limitado a sustentar que o facto de a sociedade incorporada ter um património líquido negativo obstava por si só à dita transmissibilidade dos prejuízos fiscais; 3°) estarmos perante uma fusão entre sucursais e portanto perante uma sucursal incorporada que tem um património líquido negativo e não perante uma sociedade-mãe com um património líquido negativo.

  4. A Recorrente espera confiadamente e está certa de que V. Exas., Venerandos Conselheiros, não cairão na simplística e acrítica tentação de remeter para decisões anteriores e que analisarão cuidadosamente os fundamentos expostos no presente recurso, que permitem distingui-lo dos demais a que a Recorrente teve acesso, designadamente, no que respeita à violação do princípio da legalidade e à correcta configuração do objecto da acção sub judice e consequentemente à valoração da prova produzida em sede judicial! 6.ª Não é verdade que da expressão “mesmo que se pudesse entender que a sua integração foi ditada por razões económicas válidas”, resulte que a Administração tenha previamente feito a análise e concluído pela inexistência de razões económicas válidas para a fusão, dado que dessa expressão apenas se pode depreender que a Administração considera indiferente a verificação ou não de razões económicas válidas, uma vez que sempre existiria outro fundamento que impediria o deferimento da pretensão da A: o facto de o plano de dedução dos prejuízos fiscais não permitir a dedução dos prejuízos fiscais apurados por esta sociedade, por inaplicabilidade do disposto na alínea c) do n.º 1 da Circular n.º 7/2005, de 16 de Maio.

  5. Por outro lado, a verdade é que, ao contrário do que consta da fundamentação do Acórdão recorrido, o único fundamento utilizado pela Administração para indeferir a pretensão da Administração foi efectivamente o de que o facto de a sociedade incorporada ter património negativo seria impeditivo da transmissão dos prejuízos fiscais da incorporada para a incorporante - se compulsarmos todo o despacho da Administração Fiscal não encontramos um único parágrafo em que seja referido qualquer outro facto para além deste ! 8.ª Efectivamente, o fundamento do indeferimento da requerida transmissibilidade de prejuízos da incorporada B…… Sucursal para a incorporante ……. Sucursal não reside na existência ou não de razões económicas válidas - o que não chegou a ser apreciado no despacho do SEAF ora impugnado - mas sim no facto de a B…… Sucursal apresentar, no exercício anterior (2005) à data da operação de fusão (1 de Janeiro de 2006), “um património negativo”.

  6. Essa condição criada pela Administração Fiscal para autorizar a transmissibilidade de prejuízos — consistente em a sociedade/sucursal incorporada ter um património positivo, e que serviu de fundamento ao indeferimento impugnado — é ilegal, não só porque o legislador não previu tal condição, nem no nº 2 do art. 69.° do CIRC, nem em qualquer outro preceito legal, como inclusivamente a aplicação de tal condição pode redundar numa clara postergação dos critérios, esses sim, legalmente previstos no mencionado nº 2 do art. 69.° do CIRC.

  7. Não estamos no âmbito do exercício de qualquer poder discricionário por parte da Administração, nem mesmo de discricionariedade técnica no preenchimento dos conceitos indeterminados “razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, que esteja subtraído à apreciação do poder judicial. Estamos sim perante um indeferimento com fundamento numa condição ilegal, que é portanto plenamente sindicável por este Tribunal.

  8. Admitir que o art. 55.º do CPPT, que possibilita à Administração Fiscal emitir orientações genéricas, atribui à Administração, por esta via, a faculdade de restringir o âmbito de uma norma legal, violaria o artigo 112.°, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, pelo que qualquer interpretação neste sentido deverá ser afastada uma vez que é desconforme à Constituição.

  9. O modo como será feita a dedução dos prejuízos, determinado pela Administração nos termos do nº 4 do art. 69.° do CIRC, nunca poderá ser usado para eliminar o direito que o legislador tenha reconhecido ao abrigo do nº 2 do mesmo art. 69.° CIRC.

  10. Não pode inviabilizar-se a transmissão dos prejuízos pelo facto de não ser possível a aplicação do critério definido pela circular nº 7/2005, sob pena de manifesta violação do Princípio da Legalidade, consagrado no art. 3.° do CPA e art. 266.° n° 2 da CRP.

  11. O preenchimento do conceito “razões económicas válidas” não encerra uma margem de livre apreciação da Administração, dado que o simples facto de estarmos perante um conceito indeterminado não quer dizer que o legislador tenha conferido à administração um poder discricionário, ou, melhor dito, uma margem de livre apreciação.

  12. Sendo este na verdade somente um conceito técnico do ramo das ciências económicas, passível assim de preenchimento pelo intérprete mediante os critérios técnicos dessa mesma ciência, de resto, decorre do previsto no artigo 11. °, n° 2 da Lei Geral Tributária, que deverá este conceito ser interpretado no mesmo sentido que tem no âmbito das ciências económicas, podendo assim o seu preenchimento ser plenamente sindicável.

  13. Mesmo que se entendesse que a estipulação do supra referido requisito para a transmissibilidade dos prejuízos fiscais poderia enquadrar-se ainda no poder discricionário concedido à Administração, no que não se concede e só por dever de patrocínio se equaciona, um entendimento no sentido de que sempre que a sociedade incorporada tenha património negativo não existirão resultados positivos para a estrutura produtiva, constitui um erro...

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