Acórdão nº 350/08.8TBCDN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Janeiro de 2012
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 17 de Janeiro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A..., divorciado, residente na ..., propôs a presente acção ordinária de impugnação de paternidade, contra B..., divorciada e C..., menor, solteira, residentes na mesma morada, pedindo que se declare que a menor não é filha do Autor e que se ordene a rectificação do seu registo de nascimento em conformidade no que diz respeito à paternidade e avoenga paterna.
Alega para tal que o Autor e a primeira Ré casaram um com o outro em 01/11/1983 e se divorciaram em 21/09/2001 e que a segunda Ré nasceu em 17/01/1995, mais constando como filha do Autor na certidão de nascimento. Alega ainda que a 2.ª Ré não nasceu do relacionamento sexual do Autor com a 1.ª Ré, que não manteve relações sexuais com a 1.ª Ré dentro dos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o nascimento da 2.ª Ré, recusando-se a Ré a manter relações sexuais com o Autor, as quais, durante a vigência do casamento, ocorriam só amiúde já que a 1.ª Ré mantinha relacionamento amoroso e sexual com indivíduo de nome E...
. Mais alega que, confrontada a Autora com a situação, saiu de casa no início de 2001. Invoca também que é infértil, não podendo gerar filhos.
Citadas, a Ré B... apresentou contestação em seu nome e da menor invocando a caducidade da acção já que a lei prevê, para o marido da mãe, o prazo de dois anos contados desde a data em que teve conhecimento da não paternidade, o que, segundo a petição inicial, ocorreu desde logo antes do nascimento já que o Autor alega não ter tido relações sexuais com a Ré no período legal de concepção, bem como ainda quando confrontou a Ré com os factos, segundo a sua versão, em 2001, dizendo ainda que o Autor conhecia a sua infertilidade até antes do nascimento da Ré, invocando ainda o Ac. 589/2007 do Tribunal Constitucional em abono do seu argumento.
O processo foi com vista ao Ministério Público a fim de se pronunciar sobre o curador a indicar à menor, tendo o Ministério Público indicado D...
, o qual foi citado, bem como o Ministério Público.
Citado o Ministério Público, deduziu oposição aceitando os factos documentados (nascimento, casamento e divórcio) e impugnando os demais.
Com dispensa da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, seleccionando-se a matéria assente e a que estando controvertida interessava à decisão da causa, de que reclamou o autor, por deficiência da matéria quesitada, reclamação que foi indeferida, cf. despacho de fl.s 132, relegando-se para a decisão final a excepção de caducidade invocada.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 239 a 241, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.
No seguimento do que foi proferida a sentença de fl.s 247 a 252, na qual se decidiu o seguinte: “Por todo o exposto, julgando a acção improcedente, por verificação da excepção de caducidade, absolvo as Rés do pedido.
Custas pelo Autor.”. Inconformado com a mesma, interpôs recurso o autor recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cf. despacho de fl.s 265), tendo sido o efeito do mesmo alterado para suspensivo, finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. O Ora Recorrente, ao propôr a presente acção pretende fazer valer um direito à verdade biológica, integrante do seu direito à identidade pessoal, que por sua vez integra todo o conjunto de direitos relativos à sua personalidade; 2. Tal direito encontra protecção constitucional nos artigos 25º, Nº 1 da Constituição da Republica Portuguesa; 3. E mais concretamente no artigo 26º Nº 1 da Constituição da Republica Portuguesa; 4. Por outro lado, o Autor, ao pretender ilidir a presunção de paternidade, quer ver estabelecido o seu verdadeiro “tronco familiar”, a sua real progénie; 5. Excluindo do seu círculo familiar ligado por laços de sangue, quem na verdade a ele não pertence, fazendo assim valer o seu direito à constituição de família, no seu sentido negativo (de exclusão de quem não é família) inscrito no artigo 36º Nº 1 da Constituição da República Portuguesa; 6. E assim sendo, estando estabelecido por via de prova pericial, que o Autor não é o progenitor da menor, a douta decisão, ao seguir a injunção normativa inscrita no artigo 1.842º, Nº 1, alínea a) do Código Civil, aplicando-a ao caso concreto, fê-lo, violando os preceitos constitucionais acima mencionados; 7. Devendo, assim, ser substituída por outra que declare inconstitucional o artigo 1.842º, Nº 1, alínea a) do Código Civil, quer na redacção anterior, quer na redacção da Lei 14/2000 de 1 de Abril; 8. Declarando que o direito a propôr a presente acção não caducou pelo decurso dos prazos ali referidos.
9. Dando provimento ao peticionado na acção.
JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados os vistos legais, há que decidir.
Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 684, n.º 3 e 690, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir: A. Inconstitucionalidade do artigo 1842.º, n.º 1, al. a), do Código Civil, quer na redacção anterior, quer na que lhe foi dada pela Lei n.º 14/2009, de 1/4 e inerente caducidade do direito a que se arroga o autor e; B. Se a presente acção deve proceder.
É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida: A) O Autor e a 1.ª Ré casaram um com o outro em 12.11.1983 (alínea A) dos...
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