Acórdão nº 013/11 de Tribunal dos Conflitos, 20 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução20 de Outubro de 2011
EmissorTribunal dos Conflitos

Acordam no Tribunal dos Conflitos: I Relatório A ASSOCIAÇÃO A…, Instituição Particular de Solidariedade Social, com melhor identificação nos autos, veio pedir a resolução do conflito negativo de jurisdição - art. 115º do CPC - surgido entre o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra e o Juízo de Grande Instância Cível da Comarca da Grande Lisboa Noroeste, tribunais que, por decisões transitadas em julgado, se declararam mutuamente incompetentes em razão da matéria para conhecerem de uma providência cautelar – pedido de suspensão de deliberação tomada pela Câmara Municipal da Amadora em 16.12.09.

Para o efeito alegou o seguinte: DOS FACTOS 1° A ora Requerente é uma Instituição Particular de Solidariedade Social, que tem por objecto o desenvolvimento de trabalho comunitário tendo em vista a melhoria das condições de vida da população da sua área de influência, dirigindo-se sobretudo a actividades de apoio à infância e aos jovens em situação de risco social.

2° Por escritura pública celebrada em 3 de Julho de 1990, a Câmara Municipal da Amadora transmitiu à Requerente o direito de superfície sobre uma parcela de terreno com a área de 1920 metros quadrados de que era proprietária, sito na …, na freguesia da Mina, concelho da Amadora, descrito na Conservatória do Registo predial da Amadora sob o n° 405/150488. (Doc. 1) 3º De acordo com o n° 1 da cláusula primeira dessa mesma escritura pública, o objectivo da concessão de tal direito visava a construção de um Jardim de Infância para crianças dos Bairros de Santa Filomena, Encosta Nascente e Estrada Militar da Mina, a qual, com ajuda de muitos donativos de particulares, a Requerente concretizou, tendo construído um Jardim de Infância e um espaço de ATL na parcela de terreno que lhe foi cedida.

4º Ainda de acordo com o n° 3 da mesma cláusula, à Requerente incumbia prestar apoio à comunidade, sobretudo aos jovens em risco, no combate ao insucesso escolar, criando actividades de tempos livres para crianças, como complemento da escola, promovendo actividades de educação de adultos e culturas, procurando melhorar as condições de vida da população residente.

5º Por sua vez, e de acordo com o n° 1 da cláusula segunda, o direito de superfície foi constituído por 50 anos, prorrogável por iguais períodos.

6° Finalmente, e com interesse para os presentes autos, determinava o n° 2 da cláusula sexta que a extinção da Requerente, a cessação da actividade ou o desvio dos fins a que aquela se obrigava, implicava a reversão do terreno e equipamento para a Câmara Municipal da Amadora.

7º Sendo certo que, nos termos do n° 1 da cláusula seguinte, no caso de resolução do contrato pela Câmara Municipal da Amadora, a Requerente teria direito a uma indemnização correspondente, basicamente, ao valor das obras efectuadas.

8° No entanto, por deliberação de 16 de Dezembro de 2009 da Câmara Municipal da Amadora, notificada à Requerente em 30 de Abril de 2010, a Câmara Municipal da Amadora decidiu “Aprovar a revogação do contrato de cedência do direito de superfície e accionar a cláusula de reversão prevista no contrato de cedência do direito de superfície.” a que acima se alude, “de acordo com previsto no artigo 6° e em conjugação com o disposto nos artigos 1° e 4º do contrato de cedência do direito de superfície”. (Doc 2) 9º E nessa sequência a Câmara Municipal da Amadora (i) fez deslocar às instalações da Requerente a Polícia Municipal, expulsando-a e encerrando as referidas instalações, e (ii) procedeu à demolição de parte das instalações construídas pela ora Requerente a coberto do direito de superfície de que é titular, o que concretizou com a deslocação da Polícia Municipal e maquinaria da própria Câmara! (Doc. 3) 10º A Requerente viu-se, assim, de forma violenta, sem as instalações que, por via daquele contrato de direito de superfície, é proprietária.

11° E tal sucedeu sem que a Câmara Municipal da Amadora tivesse qualquer razão que fundamentasse o accionamento da cláusula de reversão e, muito menos, o accionamento de mecanismos de “justiça privada”, com recurso à sua própria Polícia Municipal para expulsar a Requerente, de forma violenta, das instalações que, no uso legítimo do direito de superfície que titula, esta construiu e a esta lhe pertencem.

12° Com efeito, considerou a Câmara Municipal da Amadora, no n° 6 da deliberação que accionou a cláusula de reversão, que desde “Dezembro de 2006, a referida Associação perdeu os acordos e tem dívidas à Segurança Social (...) tendo tido como consequência o encerramento das valências de Pré - escolar e ATL, as quais eram o principal objecto do Contrato de Cedência de Direito de Superfície firmado com a autarquia..”.

13° Para além disso, considerou a Câmara Municipal da Amadora, no n° 7 da mesma deliberação, que a Requerente não tem corpos sociais eleitos e que, de acordo com o número seguinte, o espaço cedido estaria a ser utilizado para fins diferentes dos inicialmente considerados, nomeadamente através da cedência do mesmo a terceiros para a realização de cultos religiosos.

14° Finalmente, referiu a Câmara Municipal da Amadora que a Polícia Municipal teria recebido diversas queixas de moradores, que reportariam ruído excessivo na sequência da realização de Festas.

15º Acontece que, dos factos invocados pela Câmara Municipal da Amadora para accionar a cláusula de reversão, a maior parte dos mesmos não corresponde à realidade, e os demais se devem a actos praticados ou permitidos pela própria Câmara Municipal da Amadora e que impediram a Requerente de cumprir integralmente o contrato de concessão do direito de superfície.

16° Com efeito, parece esquecer-se a Câmara Municipal da Amadora que a actividade da Requerente, principalmente no que respeitava ao Jardim de Infância, dependias pelo próprio local onde o mesmo se desenvolve, da existência das necessárias condições de segurança, que lhe eram garantidas pela existência de uma vedação que protegia o espaço cedido de qualquer tentativa de vandalismo.

17º Esquece-se também a Câmara Municipal da Amadora que, para além do registo de queixas de moradores relativamente a ruídos, à Polícia Municipal, que depende da própria Câmara Municipal da Amadora, incumbe também o dever de assegurar a segurança dos residentes no concelho, incluindo, evidentemente, a própria Requerente e os seus utentes.

18º Ora, como a Câmara Municipal da Amadora bem sabe, a vedação que protegia o espaço cedido à Requerente, e no qual esta construiu um Jardim de Infância, que permitiu criar a muitos moradores as condições para, sem custos ou com custos muito reduzidos (de acordo com a sua natureza de IPSS), deixarem em segurança os seus filhos durante o dia de trabalho, foi destruído pela REFER, na sequência de obras autorizadas pela Câmara Municipal da Amadora.

19° Também como a Câmara Municipal da Amadora bem sabe, o referido Jardim de Infância foi imediatamente objecto de vandalismo, tendo sido o seu interior praticamente destruído.

20° A Requerente deu disso imediato conhecimento à Câmara Municipal da Amadora...

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