Acórdão nº 01048/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2011

Data20 Dezembro 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, neste Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A……, contribuinte fiscal n.° ……., não se conformando com decisão proferida a fls. 110 e ss. dos autos, que determinou a subida diferida da reclamação da decisão do órgão de execução fiscal apresentada nos termos dos artigos 276° e ss. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpôs o presente recurso jurisdicional para o TCA-Norte que por acórdão de 06/10/2011 se julgou incompetente em razão da hierarquia para dele conhecer, tendo os autos sido remetidos a este STA.

As questões a decidir são de direito.

Formula a recorrente as seguintes conclusões: «1- A Reclamante/recorrente, na Reclamação dirigida ao Tribunal Administrativo e Fiscal, alegou e invocou, até por mais do que uma vez que o indeferimento do por si requerido, configura a possibilidade de verificação de um prejuízo grave, escusado e irreparável para a mesma, a qual é empresa de pequena dimensão e que vem tentando sanear financeiramente a sua estrutura negocial, por forma a cumprir com as suas obrigações, passadas e futuras.

2- Daí que invocou, também repetidamente, que o estrangulamento da tesouraria que a Fazenda Pública provoca à Executada, penhorando-lhe as rendas respeitantes aos contratos de arrendamento celebrados, e ameaçando colocar em hasta pública os respectivos bens imóveis — os quais são a sua mercadoria inerente ao exercício da respectiva indústria, seja na modalidade de cobrança das rendas, seja na modalidade de revenda de algum dos prédios de que é titular, por forma a poder rentabilizar o seu negócio e fazer face às obrigações tributárias — é de molde a causar-lhe tão graves e irreparáveis danos que atirará a mesma para a Insolvência.

3- Assim, sendo flagrantes naquele reclamado despacho, aquelas também reclamadas omissões, tal como, os vícios supra assinalados, deve a presente reclamação, que se destina a reagir contra tais omissões, vícios e erro de julgamento e sendo manifesto e até irrecuperável, o prejuízo que ameaça a sociedade executada/reclamante, caso o reclamado despacho não seja entretanto revogado pela própria administração pública, 4- Pelo que, e conforme também ali repetidamente afirmou e aqui novamente reafirma e invoca, deve ser determinado e ordenado a imediata revogação da decisão proferida no tribunal “a quo” devendo ser admitida e declarada a subida imediata da reclamação por forma a que no competente Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, — art. 277.° n.° 2, 278.° n.° 3, 4 e 5 do CPPT —, seja a mesma apreciada e julgada.

5- Até porque, somente com a subida imediata da presente reclamação ficará efectivamente assegurado o princípio da plenitude da tutela jurisdicional dos direitos e interesses dos particulares, perante a administração fiscal, o qual igualmente tem garantia constitucional — art. 20° e 268° n°s 3 e 4 da Constituição —.“ 6- Sendo certo que, como supra se demonstrou, logo se tendo igualmente incluído nas conclusões da Reclamação factualidade e alegações tendente a demonstrar que o prejuízo resultante para a Reclamante/Recorrente, decorrente da subida diferida da reclamação, é de tal modo grave e irreparável, que não só faria perder utilidade prática à mesma reclamação, como os prejuízos provocados à sociedade reclamante assumem tamanha dimensão que atiram a mesma para a insolvência.

7- Em face do que o articulado da reclamação demonstra e do que aqui se evidenciou, é manifesto que a subida diferida da reclamação não só torna absolutamente inútil a mesma - na medida em que, depois de pagas as quantias em execução em cada um dos processos, ou depois de vendidos os imóveis/prédios penhorados no âmbito das execuções (o que a acontecer será por um preço muito inferior e até eventualmente miserável em face daquele que deveria ser o preço justo dos bens imóveis) não faz nenhum sentido nem tem nenhuma utilidade prática determinar a apensação dos processos — como os prejuízos que estão na iminência de se repercutirem na sociedade reclamante, a qual corre riscos de perder a parte mais significativa do seu património imobiliário, numa tão difícil conjuntura económica, são de tal modo graves que atirarão a mesma para a insolvência.

ISTO POSTO, 8- A enumeração constante do artigo 278° do C.P.P.T. dos “casos” em que é possível ao lesado reclamar, tem sido considerada pela jurisprudência como não sendo taxativa, devendo-se estender a todos aqueles casos em que a regra geral da subida diferida faz perder toda e qualquer utilidade à reclamação, 9- Isto é, todos aqueles casos em que a reclamação fique sem finalidade alguma por força da sua subida diferida ou em que a sua apreciação e decisão pelo tribunal, ainda que favorável ao recorrente, não lhe possa já aproveitar, situação que acarreta necessariamente um prejuízo irreparável.

10- Pelo que, em todos os casos em que o indeferimento da apreciação da legalidade de um desses actos lesivos faça perder toda a utilidade à reclamação, provocando a impossibilidade prática de defesa dos direitos e interesses do executado se tem de aceitar o regime de subida imediata da reclamação.

11- Salvaguarda-se deste modo a garantia constitucional de tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados prevista no n° 4 do artigo 268°, da Constituição da República Portuguesa e que vem consagrado na lei ordinária, possibilitando aos contribuintes o direito de reclamar de todos os actos lesivos — artigos 95° n°s 1 e 2 al. j) e 103° n°2 da L.G.T..

Acresce dizer, 12- O alcance da tutela judicial efectiva não se limita à possibilidade de reparação de prejuízos provocados por uma actuação ilegal, comissiva ou omissiva, da administração, exigindo antes, e sempre que possível, que sejam evitados os próprios prejuízos.13- “Por isso, em todos os casos em que o diferimento da apreciação jurisdicional da legalidade de um acto lesivo praticado pela Administração puder provocar para os interessados um prejuízo irreparável, não pode deixar-se de admitir a possibilidade de impugnação contenciosa imediata, pois é a única forma de assegurar tal tutela” — mesmo Autor, Anotação ao art. 276° do C.P.P.T., pag. 648 - 14- Daí que, tendo a Reclamante invocado prejuízo irreparável para sustentar a sua pretensão de subida imediata da reclamação, não poderia deixar o Tribunal “a quo” de apreciar essa mesma questão e passar a conhecer do objecto do processo, conforme ficou delimitado pela Reclamante/Recorrente.

15- Ao não ser conhecido pelo Tribunal “a quo” o objecto da Reclamação, e ao determinar-se que a subida terá de ser diferida, frustra-se o objectivo da tutela jurisdicional pretendida pela Executada, qual seja o de impedir a produção de prejuízos irreparáveis resultantes da subida diferida.

16- No caso, resultaria prejuízo irreparável para a existência/sobrevivência da Executada, que não tem meios económicos para proceder ao pagamento de uma só vez, ou até em prestações menores e múltiplas, conforme as trinta execuções pendentes, das quantias que lhe são exigidas.

17- Por tudo isto, a decisão recorrida aplica uma dimensão normativa do artigo 278.° do CPPT que é inconstitucional porquanto a reclamação/recurso perderia qualquer utilidade caso não subisse imediatamente e com efeito suspensivo, nos termos dos n°s 3 e 5 do artigo 278.° do CPPT.

18- O que se pode e deve evitar desde que se retirem as devidas consequências da prevalência da Lei Geral Tributária (LGT) sobre a demais legislação de carácter fiscal (artigo 1.° do CPPT), designadamente, o disposto nos artigos 95°, n°s 1 e 2, alínea j), e 103°, n.° 2, da LGT, e que, para o caso aqui em apreço, seja acrescentado a garantia constitucional aos administrados de tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses e a adopção de medidas cautelares adequadas (artigo 268°, n.° 4, da CRP).

19- Com efeito, a restritiva dimensão normativa encontrada e aplicada pelo Tribunal “a quo” enferma de inconstitucionalidade orgânica e material.

20- Desde logo, a inconstitucionalidade orgânica da norma extraída do artigo 278.° do CPPT, na dimensão normativa aplicada, resulta da violação do disposto na Lei n.° 87-B/98, de 31 de Dezembro, que autoriza o Governo a aprovar o CPPT «no respeito pela compatibilização das suas normas com as da lei geral tributária e regulamentação das disposições da referida lei que desta careçam» (cf. artigo 51°, alínea c), da Lei n.°...

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