Acórdão nº 01763/09.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Dezembro de 2011
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2011 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1.
O MUNICÍPIO de VILA NOVA de GAIA, inconformado veio interpor recurso jurisdicional do acórdão do TAF do Porto, datado de 15 de Novembro de 2010, que julgou procedente a acção administrativa especial que a recorrida M… - identif. nos autos - declarando nula, por incompetência absoluta, a deliberação da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, de 7 de Julho de 2008 que aprovou a expropriação por utilidade pública com carácter urgente das parcelas de terreno necessárias ao teleférico na zona Histórica de Vila Nova de Gaia.
* Nas suas alegações, o Município de Vila Nova de Gaia (MVNG) formulou as seguintes conclusões: "A - A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia não declarou a utilidade pública para a expropriação, a concretizar os terrenos, de entre os abrangidos pelos Decretos n.º 26/86, de 01.08, e n.º 54/97, de 19.12, de que necessitava para concretizar o projecto a realizar.
B - E foi este Decreto que declarou a DUP, em conjugação com as normas aplicáveis da Lei dos Solos.
C - A Lei dos Solos diz no seu art. 42º, nº 1, al. a): “A delimitação de uma área crítica de recuperação e reconversão urbanística implica, como efeito directo e imediato, a declaração de utilidade pública da expropriação urgente, com autorização de investidura, segundo o processo correspondente, dos imóveis nela existentes de que a Administração necessite para a execução dos trabalhos a realizar para a recuperação ou reconversão da área”.
D - Segundo as boas regras da interpretação, o intérprete deve atender à letra da lei, presumindo que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, passando aos níveis seguintes de análise só quando a letra não seja clara, preferindo sempre uma interpretação que confira à lei um sentido prático, em detrimento de outra que a esvazie de qualquer utilidade.
E - O Decreto que aprova uma ACRRU produz o mesmo efeito que qualquer outro Decreto que vise a declaração de utilidade pública da expropriação pois ao delimitar a ACRRU fica estabelecida, como efeito directo e imediato, a utilidade pública da expropriação: efeito directo, pois não necessita de qualquer outro acto posterior; efeito imediato, pois produz-se logo que o Decreto de delimitação entre em vigor.
F - É certo que intervenção urbanística não passa necessariamente pela expropriação de todos os prédios em causa, podendo essa recuperação bastar-se com uma intervenção não ablativa da propriedade, ficando na disponibilidade da Administração expropriar ou não consoante as necessidades decorrentes do projecto que se proponha levar a cabo.
G - A Lei declara logo a utilidade pública para a eventualidade de a expropriação ser necessária, podendo as entidades competentes tomar as medidas que se lhes afigurem mais adequadas, sem afastar a possibilidade de a intervenção se bastar com meios menos radicais, o que configura uma das hipóteses permitidas pela lei.
H - Sendo a expropriação a medida mais gravosa para o direito de propriedade de terceiros, exige-se que seja adoptada apenas como ultima ratio quando se revelar estritamente necessária, como sucede no caso em análise.
I - O art. 13º, nº 2, do Código das Expropriações, prevê a possibilidade de a declaração de utilidade pública resultar directamente da lei ou de regulamento e de esta ser genérica, ou seja, sem individualizar os prédios a expropriar, individualização a fazer depois por acto administrativo, que vale como declaração de utilidade pública, tal como ocorreu no caso sub judice.
J - Não obstando este Código a que a declaração de utilidade pública resulte do Decreto que delimita a ACRRU, por força da determinação do art. 42º, nº 1, al. a) da Lei dos Solos, e que a concretização dos prédios a expropriar seja feita pela Câmara Municipal.
L - A referência feita na al. a) do nº 1 do art. 42º da Lei dos Solos à obrigação de seguir o regime das expropriações não se reporta à declaração de utilidade pública mas sim ao procedimento subsequente e ainda que assim não fosse, sempre esse Código foi respeitado, por estarmos dentro do âmbito do nº 2 do seu art. 13º.
M - Na tentativa de encontrar utilidade prática para a expressão “efeito directo e imediato”, diz o douto Acórdão que delimitação de uma ACRRU teria como consequência a desnecessidade de a entidade expropriante invocar qualquer outro fundamento para a expropriação que não o facto de o terreno se encontrar inserido nessa área.
N - Esta interpretação conduziria à possibilidade de expropriações sem necessidade, apenas porque os terrenos se encontram em zona crítica.
O - A interpretação propugnada no douto Acórdão transforma a declaração de utilidade pública num acto meramente formal, esquecendo a vertente material da efectiva necessidade do prédio.
P - Se a declaração de utilidade pública não resulta directamente do Decreto que define uma ACRRU, ou a Administração pode pedir a declaração de utilidade pública de um terreno inserido em ACRRU sem qualquer outra justificação ou o segmento de norma que se refere ao “efeito directo e imediato” não tem qualquer utilidade e sentido prático, o que violaria as boas regras interpretativas.
Q - Como alternativa, surge a interpretação que o recorrente defende, com fundamento na letra da lei: a delimitação de uma ACRRU tem como efeito directo e imediato a declaração de utilidade pública da expropriação dos terrenos abrangidos, a qual incidirá apenas sobre os prédios individualizados em acto administrativo.
R - A interpretação propugnada pelo recorrente é a única que permite assegurar alguma utilidade ao nº 1 do art. 42º da Lei dos Solos sem com isso violentar os princípios que regem as expropriações pois a expropriação só seria possível quando existisse justificação bastante e não fosse possível adoptar outro procedimento para a recuperação ou reconversão.
S - Em tese contrária, a expropriação seria sempre possível sempre que o prédio se encontrasse em zona de ACRRU, ainda que essa expropriação não fosse estritamente necessária, pois bastaria invocar essa localização para que a declaração de utilidade pública fosse deferida.
T - Deve manter-se a decisão quanto aos demais vícios do acto invocados pela A., que inexistem.
U - Ao conceder provimento à acção nos termos em que o faz, o douto Acórdão recorrido violou o art. 42º, nº 1, da Lei dos Solos e os Decretos n.º 26/86, de 01.08, e n.º 54/97, de 19.12, devendo ser revogado".
* Notificadas as alegações, apresentadas pelo...
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