Acórdão nº 2/08.9TTLMG.P1S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelPEREIRA RODRIGUES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR.

No Tribunal do Trabalho de Lamego, Leonel da Silva Santos intentou a presente acção, n° 2/08.9TTLMG, com processo comum, contra Sociedade Agrícola AA, Lda., pedindo o pagamento das seguintes quantias: - € 64.071,52, a título de actualizações salariais entre 1987 e 2007; - € 2.200, referente a pagamentos que o Autor fez a pessoal contratado ao serviço da Ré; - € 2.039,94, referente às retribuições devidas nos meses de Outubro a Dezembro de 2007; - € 1.775,94, a título de férias não gozadas, subsídios de férias e de Natal do ano de 2007; - tudo, acrescido de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, em suma, que foi admitido ao serviço da Ré em 1980, exercendo as funções de feitor da Quinta do Vale, sita em Várzea de Abrunhais, Lamego, e auferindo, desde 1987, uma retribuição mensal abaixo do valor da retribuição mínima garantida por lei, sendo que, a partir de 2001, com a publicação da Portaria de Regulamentação de Trabalho para os trabalhadores agrícolas, publicada no Boletim de Trabalho e Emprego n.° 33/2001, de 8 de Setembro, passou a integrar a primeira classe salarial, sendo-lhe devida a retribuição ali prevista, bem como as suas actualizações.

Mais aduziu que entre 1987 e 2006 nunca gozou férias e que a Ré está em dívida para consigo pelos valores despendidos com o pagamento de pessoal em 2003 e 2004, e retribuições relativas aos meses de Outubro a Dezembro de 2007, inclusive, subsídios de férias e de Natal do referido ano.

A Ré contestou, alegando, em suma, que o Autor apenas exerce as funções de caseiro desde 1986 e que durante todos estes anos nunca manifestou o seu descontentamento com o vencimento recebido, nem pediu a actualização do mesmo.

Invoca, por isso, o abuso do direito por parte do Autor em exigir a actualização dos salários recebidos de 1987 a 2007.

Mais aduziu que à retribuição do Autor acrescia o direito de residir, com o seu agregado familiar, na casa do caseiro, composta por três divisões, cozinha e casa de banho, prestação que integra a sua retribuição.

Por outro lado, defendeu não serem aplicáveis aos presentes autos as invocadas Portaria de Regulamentação do Trabalho, porquanto o seu âmbito territorial de aplicação restringe-se ao concelho de Vila Real.

O Autor respondeu à contestação.

Por despacho de 26 de Janeiro de 2009, foi determinada a apensação aos presentes autos da acção que corria termos no tribunal, sob o n° 317/08.6TTLMG, intentada pelo A. contra a mesma Ré.

Nesta acção, n.° 317/08.6TTLMG, pediu o Autor a anulação da sanção disciplinar de suspensão e perda de antiguidade aplicada pela Ré, declarando-se a mesma abusiva, e o reconhecimento da quantia de € 679,98, a título de salário mensal, pedindo o pagamento das seguintes quantias: - € 169,95, relativa à retribuição da semana de suspensão, acrescida de € 1.669,95, correspondente ao décuplo, em virtude de se tratar de sanção abusiva e da quantia de € 10.000, a título de indemnização por danos morais; - € 3.709,86, a título de diferenças salariais desde Janeiro a Julho de 2008 e da quantia de € 679,98, a título de subsídio de férias; - tudo, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, em suma, que como represália da 1.ª acção intentada contra a Ré, esta instaurou ao Autor um processo disciplinar que culminou na sanção disciplinar de uma semana de suspensão com perda da correspondente retribuição e, ainda, o desconto de cinco anos de antiguidade na empresa.

Acrescentou que os factos que fundamentaram tal decisão, além de falsos, encontravam-se prescritos, acarretando aquela sanção pânico, nervosismo e transtorno para o Autor.

Mais aduziu que, não obstante ter já solicitado a actualização do seu salário, a Ré continua a pagar-lhe a retribuição mensal de € 150.

A Ré contestou esta acção, por impugnação, alegando, em síntese, que o Autor nunca manifestou qualquer descontentamento com a sua retribuição pelo que vir agora decorridos mais de 20 anos de execução do contrato constitui manifesto abuso do direito.

Mais acrescentou que os factos que motivaram o processo disciplinar são verdadeiros, pois há muito que o Autor não cumpre, com a diligência devida, as suas obrigações, não se verificando, por isso, os pressupostos de responsabilidade da Ré por danos morais.

Mais contestou, invocando a excepção de litispendência entre esta acção e a que corre termos sob o n° 2/08.9TTLMG, alegando, ainda, verificar-se uma relação de prejudicialidade entre ambas.

Foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção de litispendência invocada e indeferida a suspensão da instância por pendência de causa prejudicial.

Não se conformando com tal despacho, dele recorreu a Ré, tendo o recurso sido admitido como de agravo, com subida diferida e efeito meramente devolutivo, nele se suscitando as seguintes questões: - a da ocorrência in casu da alegada excepção de litispendência, na justa medida em, quer num, quer no outro, mas em ambos os processos, se visa obter o mesmo efeito jurídico, atinente ao salário pretensamente devido, ou seja, - determinação do valor da remuneração mensal do autor, após o que se concretizarão, se devidas (ou não, na hipótese contrária) as eventuais diferenças salariais; - nos autos, não se encontra preenchido nenhum dos requisitos legais previstos no n° 1 do art. 275° do CPC que sustente a pretextada apensação; - tão-pouco se diz ou fundamenta qual o pressuposto processual preenchido, pelo que a decisão enferma do vício da nulidade a que alude o art. 668°, n°1, b), do CPC; - não tendo, no saneador, sido designada uma data para o julgamento, jamais podia ser exigida a taxa de justiça subsequente e a correspondente multa, por tardio cumprimento da obrigação; Igualmente, não se conformando com o despacho que ordenou a apensação dos processos, dele recorreu a Ré, tendo o recurso sido admitido como de agravo, com subida diferida, nele se formulando as seguintes conclusões: - Não se encontrando preenchido nenhum dos requisitos que poderiam sustentar a determinada apensação de processos, previstos no n.° 1 do art. 275.° do CPC, ela não poderia ter sido determinada pelo Tribunal a quo; - É inadmissível a interpretação extensiva que o M.mo Juiz a quo fez do art. 275.°, n.° 1, do CPC - ex vi do art. 9.°, n.° 2, do CC; - O despacho recorrido violou os arts. 275.°, 668.°, n.° 1, al. c), do CPC, e 9.°, n.° 2, do CC.

Os dois recursos de agravo foram objecto de contra-alegações, neles se pedindo a confirmação do decidido.

Realizada a audiência de discussão e julgamento - tendo sido deferido a ampliação do pedido, no tocante à actualização dos salários desde Agosto de 2008 até Setembro de 2009 - foi, posteriormente, proferida sentença, julgando a acção procedente e condenando a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 42.039,60, a título de diferenças salariais entre Janeiro de 1987 e Setembro de 2009, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, sendo sobre o valor de € 39.136,58, desde 3 de Abril de 2008 (fls. 69 dos autos 2/08.9TTLMG) e sobre o valor de € 2.903,02, desde 19 de Setembro de 2008 (fls. 45 dos autos 317/08.6TTLMG) até efectivo e integral pagamento.

Mais se julgou ilícita a sanção disciplinar aplicada ao Autor, por prescrição do procedimento disciplinar, condenando a Ré a revogar a mesma.

Inconformadas com esta decisão, dela recorreram Autor e Ré, vindo o Tribunal da Relação do Porto a negar provimento aos agravos; a julgar improcedente a apelação da Ré e procedente a do Autor, condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de global de € 70.958,81.

Mais uma vez inconformada, a Ré interpôs recurso de Revista para este STJ, apresentando alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: «a) É nulo o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - ex vi arts. 668°, n° 1, al. b) e art. 716° do C.P.C..

b) Deve na fundamentação o tribunal discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final, tomando em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer - ex vi n.° 2 do art. 713° e n°s 2 e 3 do art. 659° do C.P.C..

c) Ora, o acórdão recorrido limita-se à adesão vaga e genérica às decisões proferidas pelo Tribunal de 1.ª Instância, o que não constitui fundamentação especificada da decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, nem tampouco sua fundamentação sumária, pelo que é o mesmo nulo.

d) O disposto no n° 5 do art. 713° do C.P.C, só seria aplicável verificando-se duas condições: ter o acórdão recorrido configurado as questões levantadas nos agravos e apelação da recorrente como questões simples, expressamente afirmando que a decisão era tomada ao abrigo do disposto no cit. n° 5 do art. 713°, e, ter havido fundamentação sumária da decisão, o que se não aceita, uma vez que a remissão para as decisões de 1.ª instância e adesão genérica às mesmas, como tal não podem ser configuradas.

e) O Tribunal não pode conhecer de factos não alegados pelas partes, sob pena de violação do disposto do n° 2 do art. 660° do C.P.C., implicando tal conhecimento, por força do disposto na alínea d), do n° 1 do art. 668° do C.P.C., a nulidade do acórdão recorrido, que expressamente se invoca.

f) O aliás douto acórdão ao concluir pela existência do temor reverencial do A. perante a R. conhece de um facto não alegado por nenhuma das partes e muito menos dado como assente, extravasando a matéria assente dos autos e, até, a matéria controvertida, pelo que é o mesmo nulo por violação dos citados arts. n° 2 do art. 660° do C.P.C, e al. d), do n° 1 do art. 668° do C.P.C..

g) Tanto o pedido formulado no Ponto 4. da...

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