Acórdão nº 01496/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução14 de Dezembro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO A...

, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 10/12/2005 que, no âmbito da acção administrativa especial instaurada contra o Ministro da Educação, julgou improcedente o pedido de anulação do despacho ministerial que aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva à recorrente.

Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 137 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “Levam-se às conclusões, na integra, as alegações supra, mantendo a numeração que ali se indica (…)”.

“1ª Compulsando o que então se disse nas conclusões SEGUNDA, TERCEIRA, QUARTA e QUINTA, das alegações oferecidas no tribunal a quo, retira-se que a ora recorrente nunca foi ouvida pessoalmente sobre o que quer que fosse, nunca lhe tendo sido perguntado qual a razão de ter, momentaneamente, a porta do gabinete fechada enquanto decorriam as aulas, esclarecendo que, em todo o caso, se encontrava no seu local de trabalho e se tinha dirigido àquele gabinete por breves momentos, para limpar as calças que tinha sujado com o pequeno-almoço que tinha estado a tomar, assim tendo decidido porque lhe pareceu impróprio atender quem quer que fosse na situação em que se encontrava.

No entanto, a fls. 16 da sentença, no segundo parágrafo do ponto 1), lê-se que: “1) – (… Apenas admite, nos artigos 8º e 12º da Defesa que se encontrava no seu gabinete e que de lá saiu para mandar calar os alunos)”.

Ora não é se somenos importância fazer a destrinça entre o que seja admitir que se encontrava no seu gabinete tout court e o admitir que se dirigiu àquele gabinete por breves momentos, para limpar as calças que tinha sujado com o pequeno-almoço.

  1. Vejamos agora o que nos diz o ponto 2 da sentença ora em crise, que pela sua relevância se transcreve: “2) – Refere ainda a A. que não ficou provado que o jardineiro da escola, B..., estivesse fechado com a A. no local e à data que constam da acusação.

    Em nenhum dos depoimentos prestados pelas várias testemunhas se refere peremptoriamente que o homem que se encontrava no gabinete da A. à data e hora dos factos que lhe são imputados, era o B.... Embora a testemunha C..., a fls. 48 do processo disciplinar, tenha referido que “reparou que um senhor que trabalhava na escola com um boné verde e com umas botas verdes [ao que parece] e dado o boné e as botas ficou com a ideia que fosse o jardineiro, se dirigiu para o gabinete da funcionária D. A...

    ”. Face à dúvida que perpassa em tais declarações, o que se pode dar como certo é que se tratava de um indivíduo do sexo masculino, não se tendo determinado a identidade do mesmo. Atente-se, por outro lado, que no Relatório Final, na parte das “conclusões”, refere-se que a A. bem sabia que não podia permitir que o jardineiro ou outra pessoa alheia ao serviço, pudesse permanecer no seu gabinete. Admitiu-se aí, portanto, que podia ser outra pessoa que não o jardineiro da escola.” Feita a transcrição e salvo melhor opinião, parece ter sido afastada a hipótese de o senhor B...ter estado fechado com a A. no local e à data que constam da acusação, embora a testemunha C..., no Auto de Declarações a fls. 48º do processo disciplinar tenha referido que “reparou que um senhor que trabalhava na escola com um boné verde e com umas botas verdes [ao que lhe parece] e dado o boné e as botas ficou com a ideia que fosse o jardineiro, se dirigiu para o gabinete da funcionária D, A...”.

    De realçar que a testemunha C...

    começa por referir que o senhor trabalhava na escola, para logo no parágrafo seguinte vir dizer que não o viu bem, porque o viu de lado. – Afirmou que trabalhava na escola. Mas, facto curioso, não viu bem, porque o viu de lado? Mais à frente: - No 12º parágrafo do documento de que se trata lê-se: “Foram todos constantemente espreitar pelos buracos da porta e a uma certa altura, a depoente viu o senhor a masturbar-se, espreitou pelo buraco de cima do lado direito da porta.” - No parágrafo seguinte, declara” que o senhor tinha o pénis de fora e estava a excitar-se a si próprio com a sua mão”.

    - No 16º parágrafo, diz a testemunha que espreitou de novo e “viu a senhora contínua encostada à parede do lado esquerdo com a braguilha aberta, as calças um pouco descidas a ter relações sexuais com o senhor. Explica que o senhor estava com o pénis na vagina da contínua.” Acrescendo ao que se transcreveu, o facto de os ditos buracos terem cerca de 10 (dez) centímetros de diâmetro é de concluir, salvo melhor opinião, que a testemunha não poderia deixar de identificar quem estava na referida sala, se lá estivesse alguém.

    Viu tudo, ao que parece, mas não identificou o senhor que, no início das suas declaracões, afirmou trabalhar na escola.

    Face a tudo isto, o Tribunal a quo, depois de analisar o depoimento de fls. 48, acaba por concluir que “Face à dúvida que perpassa em tais declarações, o que se pode dar como certo é que se tratava de um indivíduo do sexo masculino, não se tendo determinado a identidade do mesmo.” Com o devido respeito, o que pode dar-se como certo é que a testemunha falta à verdade. Com efeito, uma pessoa que conheça outra, como é o caso da testemunha em relação ao senhor B..., não poderia deixar de o identificar, como o fez em relação à senhora A..., atentas as oportunidades que teve para o fazer, se ele lá estivesse, ou qualquer outra que trabalhasse na escola.

    Acresce que é o próprio Tribunal que se refere a dúvidas em relação às declarações prestadas, vindo a afastar, não se sabe bem porquê, o invocado princípio “in dubio pro reu”.

    Ainda no ponto 2) da sentença de que se recorre vem o Tribunal chamar a atenção para o facto de no Relatório Final, na parte das “conclusões” vir referido que a A. bem sabia que não podia permitir que o jardineiro ou qualquer outra pessoa alheia ao serviço, pudesse permanecer no seu gabinete, tendo-se ali admitido, portanto, que podia ser outra pessoa que não o jardineiro da escola.

    SEM CONCEDER, com o devido respeito e salvo melhor entendimento, não foi isso que se admitiu no relatório final. Quando o instrutor do processo fez essa referência, fê-lo para sublinhar que a dita proibição de permanência naquele gabinete era abrangente — “o jardineiro ou outra pessoa alheia ao serviço”, como seria óbvio, mas referindo-se ao senhor B....

    Aliás, essa referência já constava do artigo 7º da acusação (não consta só do relatório final) e aí só se falava no senhor B.... É que se assim não fosse, poderia inferir-se que a proibição seria só para o senhor B.... A referência é feita para sublinhar que a funcionária bem sabia que ninguém lá poderia estar. Não foi feita no sentido de admitir como refere o Tribunal a quo que podia ser outra pessoa.

    Mas não está em causa só essa questão. Está em causa também saber se estava efectivamente alguém com a funcionária na dita sala e, o depoimento que acabámos de analisar, que serviu de base para formar a convicção do Tribunal, falta à verdade, como se viu, não permitindo concluir pelos seus termos, que alguém ali se encontrava, levando nesta medida, com o devido respeito e salvo opinião em contrário, a um gritante e clamoroso erro na apreciação da prova, colocando-se inclusive na boca do instrutor do processo, aquilo que ele não disse, 3ª No que concerne à fundamentação do acto que aplicou a pena de aposentação compulsiva ou à sua falta, diz o Tribunal a quo, que o mesmo “remete para os termos e fundamentos que constam do processo disciplinar, que contem a proposta de sanção disciplinar a aplicar à A., pelo que a fundamentação da deliberação recorrida é a que consta de tal processo, nomeadamente no relatório final. Trata-se de uma fundamentação por remissão, expressamente prevista e admissível face ao nº 1 do artº 125º do CPA”.

    Mais à frente a fls. 16 da sentença, o Tribunal refere que “Somos por isso, de opinião que o acto impugnado contém os factos e as normas jurídicas que permitem conhecer as razões da aplicação da pena.

    Há que convir, salvo melhor entendimento que, se as normas jurídicas invocadas permitem conhecer da aplicação da pena, o mesmo não se pode dizer quanto aos “factos”,- isto é, quanto ao seu conteúdo - uma vez que face às contradições exemplificadas sob o nº 1 destas alegações, os mesmos se revestem de duvidosa existência. E não estando os factos provados, toda a fundamentação cai pela base, não podendo suportar o acto administrativo.

    E essa situação, parece não ter sido considerada pelo Tribunal a quo.

    Com efeito e salvo melhor opinião, a decisão tomada baseou se em pseudo factos e não em factos, estando nessa medida, no mínimo, inquinada do vício de forma por falta/insuficiência de fundamentação.

    Aliás, como já se demonstrou e adiante se continuará a demonstrar, só agora a recorrente disso se tendo apercebido, a questão é mais grave, na medida em que a decisão é nula.

    Com efeito “É insuprível a nulidade resultante da ..., bem como a que resulte de omissão de quaisquer diligências essenciais para a descoberta da verdade”, conforme nos refere o artigo 42º do ED. E essa situação é, salvo o devido respeito, pertinente no processo de que se trata.

    E aqui convém mais uma vez sublinhar também que o princípio ínsito no artº 32º, nº 2 da CRP, que se repercute quer no CPP quer no ED, não foi tido em conta em todo o processo, conforme já se alegou.

  2. No ponto 3 da sentença, retira-se qualquer relevo ao facto de na notícia publicada no “Correio da Manhã”, - que fala em sexo oral - ter sido referido por uma aluna, que viu essa consumação através da fechadura da porta, o que se traduz numa impossibilidade na medida em que a fechadura da porta é do tipo “YALE”, não sendo possível qualquer observação através dela.

    Quando a ora recorrente se referiu a essa situação...

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