Acórdão nº 00647/10.7BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Outubro de 2011
Magistrado Responsável | Maria do C |
Data da Resolução | 27 de Outubro de 2011 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO: “E..., Ldª” e o MUNICÍPIO DE VALONGO, na qualidade de contra-interessada e réu/recorrente, respectivamente, interpuseram recurso jurisdicional da decisão proferida no TAF de Penafiel, que no âmbito da acção de contencioso pré-contratual intentada pela I... -, S.A. : (i) anulou a deliberação datada de 26 de Agosto de 2010 da Câmara Municipal de Valongo de adjudicação do objecto do Concurso Público nº 1565/2010 de “Fornecimento de refeições transportadas e refeições confeccionadas no local, em Jardins de Infância (JI) e Escolas do 1º ciclo do ensino básico (EB) do concelho de Valongo e ainda do Plano de emergência de apoio alimentar" à E…; (ii) anulou o contrato público celebrado na sequência do acto de adjudicação e respectivos efeitos, (iii) condenou o recorrente a praticar os actos necessários à adjudicação à A. do objecto do concurso público em apreço, com as legais consequências.
*A E… formula as seguintes conclusões que aqui se reproduzem: «
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O Tribunal a quo decidiu do mérito da acção após a prolação do despacho saneador, o que resulta numa nulidade processual, por não ter notificado as partes para apresentarem as suas alegações, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 91º, nº 4 e 102º, nº 2 do CPTA.
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Com as contestações as partes requereram a produção de prova testemunhal e produziram prova documental, pelo que não poderia o Tribunal a quo omitir aquela formalidade processual, sob pena de violação do disposto no artº 201º do CPC.
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Por outro lado, a decisão recorrida enferma de diversos erros de julgamento, quer quanto à matéria de facto quer quanto à aplicação do direito.
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Quanto aos factos dados por assentes, verifica-se que o Tribunal a quo adulterou os factos invocados pelo autor, não explicitando que o Relatório Final (3) substituiu o Relatório Final (2), ambos datados de 19 de Agosto de 2010, mas notificados aos concorrentes em momentos diferentes e com ordenações diferentes das propostas.
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Devendo, em consequência, ser reapreciada a matéria de facto em função dos factos alegados pelas partes e dos documentos constantes dos autos.
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Quanto à aplicação do direito aos factos, verifica-se que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quando considerou que todos os concorrentes têm direito de exercer audiência prévia sobre todos os relatórios proferidos pelo Júri.
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Com efeito, nos termos do art.º 123º do CCP, apenas têm direito de audiência prévia os interessados, o que nos termos do disposto no artº 100º e seguintes do CPA, se consideram quem pode ser afectado pela decisão a tomar.
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No caso do Relatório Final em apreço – o datado de 19 de Agosto de 2010 – o mesmo apenas confirmou a anterior decisão do Júri, tomada posteriormente à pronúncia do I... sobre o Relatório Final de 10 de Agosto de 2010.
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Já quanto ao Relatório Final (3), datado de 19 de Agosto de 2010, que substituiu o anteriormente proferido, o mesmo beneficiou o I..., porque graduou a sua proposta em segundo lugar, em detrimento do terceiro lugar anteriormente atribuído.
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Assim, não foi preterido qualquer direito de audiência prévia do I..., porque este não tinha direito a exercê-lo.
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A haver preterição de audiência prévia foi da U…, que ficou prejudicada pela alteração da ordenação das propostas, mas apenas esta teria legitimidade para invocar tal ilegalidade.
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Violou assim, o acórdão recorrido, o disposto no artº 148º, nº 2 do CCP e do artº 100º e seguintes do CPA.
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No que respeita à classificação das propostas relativamente ao factor de avaliação de Garantia de Qualidade das Matérias-Primas, mal andou o Tribunal a quo em considerar que houve violação das regras concursais vigentes quando atribuiu pelo menos a mesma pontuação a concorrentes que apresentassem mais do que um fornecedor de matérias-primas.
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O júri, mais não fez, porém, senão interpretar as regras concursais vigentes.
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É que são valoradas de forma distinta e separada a certificação de qualidade do concorrente e dos seus fornecedores, por um lado e certificação ao nível da higiene e segurança alimentar, por outro.
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Porém, também o número de fornecedores é relevante para a avaliação das propostas, na medida em que o júri aprecia distintamente os concorrentes que tenham nenhum, alguns ou todos os fornecedores certificados.
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Alguns e todos os fornecedores pressupõem que sejam mais do que um fornecedor, o que significa que o Júri não previu a possibilidade de serem apresentadas com apenas um fornecedor certificado.
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Daí que tenha tido de necessidade de interpretar as normas concursais em função da realidade de facto que lhe foi apresentada.
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Assim, não foram violados quaisquer princípios da estabilidade das peças concursais, nem introduzidas quaisquer novas regras de avaliação das propostas.
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Acresce que a própria E... entende que o relatório Final (3) é ele próprio ilegal, por não ter mantido a desvalorização dos certificados apresentados pelo I... quanto ao seu fornecedor, porém o Tribunal a quo não invocou os fundamentos invocados pela ora recorrente.
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Dá-se por reproduzidas as alegações constantes nos art.ºs 67º a 107º da contestação da recorrente, rogando a V. Exas. se dignem apreciar, nesta sede, as questões ali suscitadas.
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Quanto à pontuação atribuída às propostas em função da textura das ementas ou da cor monocromática, verifica-se que o Tribunal a quo se substituiu de forma inadmissível, à entidade administrativa, violando o princípio da separação de poderes.
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A apreciação do Júri nesta matéria constitui o exercício da actividade administrativa, da qual faz parte a discricionariedade técnica, insindicável judicialmente, a menos que resulte a violação de alguma norma imperativa ou algum erro grosseiro na aplicação das regras concursais, o que não é, manifestamente o caso.
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Por outro lado, não existe suficiente fundamentação de facto que justifique a decisão tomada, em violação do disposto no artº 668º, nº 1, al. b) do CPC.
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Por fim, se assim não se entender, no que não se concede, sempre se diga que bem andou o Júri do concurso ao pontuar as propostas como fez, atendendo à existência de três pratos de textura semelhante nas ementas do I... - “Arroz de pato”, o “Arroz de codorniz” e a “Açorda de galinha”.
A
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Pontuar de forma diferente resultaria numa violação do princípio da igualdade, na medida em que também a E... viu a sua proposta ser penalizada pela existência de dois pratos de textura semelhante.
BB) Quanto à decisão de condenação no acto devido, verifica-se que a mesma excede, manifestamente, os limites do artº 95º do CPTA».
*O recorrente Município de Valongo também apresentou as suas alegações concluindo da seguinte forma: «1 - O relatório final lavrado pelo júri do concurso datado de 10 de Agosto de 2010 propunha a adjudicação à empresa E....
2 – Desse relatório foram as concorrentes notificadas para se pronunciarem no prazo de 5 dias.
3 – Só a recorrida se pronunciou nessa sede.
4 – O relatório do júri do concurso datado de 19 de Agosto de 2010 não alterou a proposta de adjudicação para a empresa E..., mantendo a posição do concorrente.
5 – De acordo com o artº 148º do Código dos Contratos Públicos só é obrigatório proceder a nova audiência prévia quando existe alteração da ordenação das propostas.
6 – A sentença recorrida violou os artigos 147º, 123º, 148º, nº 2, 152º, 153º e 154º do CCP.
7 – A sentença recorrida violou o artigo 135º do CPA.
8 – O programa de concurso sub judice valorava a certificação dos fornecedores de matérias-primas alimentares dos concorrentes em sede de apreciação da proposta.
9 – Este critério visava potenciar uma melhor qualidade dos produtos alimentares das propostas dos concorrentes.
10 – O júri do concurso entendeu valorar as propostas dos concorrentes de forma que os concorrentes que apresentassem mais do que um fornecedor certificado não tivesse avaliação inferior à recorrida I..., que apresentou um só fornecedor certificado.
11 – Os concorrentes que apresentam mais do que um fornecedor certificado, não podem ser penalizados e terem a sua proposta valorada com pontuação inferior à da recorrida. Precisamente porque as propostas que apresentam mais do que uma avaliação, oferecem mais garantias à entidade adjudicante.
12 – Esta conclusão resulta da intenção da previsão dessa valoração nas peças procedimentais.
13 – Esta conclusão do júri não viola qualquer peça do procedimento, nem sequer o princípio da estabilidade das peças do procedimento. Não se trata de criar um novo critério, mas sim de aplicar o princípio que presidiu à elaboração de um deles.
14 – Não se pode concluir que aplicar um critério previsto nas peças processuais, de forma que a sua aplicação baseada precisamente na sua elaboração, viole as próprias peças procedimentais.
15 – A sentença recorrida violou os artigos 7.6 e 13 do programa do concurso.
16 – A sentença recorrida violou o artigo 74º do CCP».
*A A./recorrida "I..., S.A." contra-alegou no sentido da improcedência de ambos os recursos, apresentando as seguintes conclusões: «1.ª A douta decisão recorrida foi douta e brilhantemente fundamentada, não merecendo qualquer reparo ou censura.
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Inexiste qualquer nulidade processual por suposta violação do disposto nos artigos 91º, nº 4, e 102º, nº 2, do CPTA.
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As alegações destinam-se, essencialmente, a permitir ao demandante (e não ao demandado) pronunciar-se sobre elementos de prova apresentados no decurso do processo, aos quais, porventura, não tenha tido acesso antes.
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A falta de notificação para produzir alegações constitui uma mera e irrelevante irregularidade, sendo que a recorrente E... nem sequer alegou ou demonstrou que a omissão dessa formalidade teve influência no exame ou na decisão da causa, sendo que o processo continha todos os...
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