Acórdão nº 2546/07.OTBVLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2011

Data25 Outubro 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e mulher, BB, intentaram, em 11.6.2007, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Valongo – 2º Juízo – acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra: - CC, e; - DD e mulher, EE Pedindo que os Réus sejam condenados, solidariamente, a pagarem-lhes a quantia de € 150.000,00, acrescida de juros legais, à taxa de 4%, desde a citação até pagamento.

Alegaram, em resumo, que: - o Autor, bem como o 1º e o 2º Réus são filhos de FF que faleceu em 16.08.1988 e de cuja herança faziam parte diversos bens imóveis; - a partilha dessa herança foi efectuada por escritura pública outorgada em 09.04.1999; - os imóveis aí adjudicados ao 1º Réu tinham o valor real de € 133.000,00, sendo que os imóveis adjudicados ao Autor apenas tinham o valor de € 32.000,00; - embora se diga na escritura que o 1º Réu pagou de tornas a quantia de € 20.610,27, a verdade é que tal não corresponde à verdade, sendo certo que os Autores não receberam essa quantia; - a partilha foi efectuada na sequência de negociação e acordo que já haviam sido celebrados em 09.03.1999 e, por via do qual, os Réus, para compensarem a inferioridade do quinhão dos Autores, se obrigaram a adquirir, no terreno designado por “Quinta do Sá”, uma casa de habitação com pelo menos dois quartos, cujo direito de propriedade ficaria a pertencer aos Autores; - os Autores apenas aceitaram a divisão dos bens da herança nos termos que constam da escritura em função da obrigação assumida pelos Réus no dito acordo de 9 de Março; - acontece que os Réus não cumpriram essa obrigação, não obstante a interpelação e a fixação de prazo pelos Autores, pelo que o seu património se encontra diminuído no exacto valor da fracção que os Réus se obrigaram a inscrever em nome dos Autores, valor esse que ascende a € 150.000,00.

Os Réus contestaram, alegando, em suma: - que o acordo celebrado em 09.03.1999 não visou acertar qualquer desigualdade existente na partilha, porque tal desigualdade não existia; - esse acordo visou apenas salvaguardar os interesses da mãe do Autor e Réus que, na sequência da partilha, ficaria sem a casa onde vivia e sem rendimentos prediais; - acontece que a mãe de Autor e Réus faleceu em 22.02.2001, pelo que, quando esse acordo ficou em condições de ser cumprido (com a conclusão do primeiro bloco da urbanização “Quinta do Sá”), o mesmo já não podia ser cumprido por falta de objecto; - na partilha da herança aberta por óbito da mãe, o Autor ficou com todos os bens, obrigando-se ao pagamento de tornas no valor de € 10.498,92 a cada um dos irmãos e, se é verdade que o Autor não recebeu as tornas que lhe cabiam na herança aberta por óbito do pai (€ 20.610,27), também é verdade que não pagou aos Réus as tornas que a estes cabiam na herança aberta por óbito da mãe (€ 20.997,84), pelo que aquele crédito extinguiu-se por compensação com este débito.

Com estes fundamentos, concluem pela improcedência da acção e pedem, em reconvenção, que os Autores sejam condenados a pagar a quantia de € 10.498,92 a cada um dos Réus, acrescida de juros legais desde a citação e até pagamento.

Os Autores responderam, reafirmando os factos alegados na petição inicial, afirmando que pagaram as tornas devidas aos Réus na partilha por óbito da mãe, sendo certo que os mesmos declararam, na escritura, ter recebido essas tornas; ainda que assim não fosse, sempre assistiria aos autores o direito de compensar esse débito com o débito dos Réus, pelo que o crédito dos Réus ficaria reduzido a € 387,57.

Com estes fundamentos, concluíram pela procedência da acção e improcedência da reconvenção, pedindo, ainda, que os Réus fossem condenados, como litigantes de má fé, em multa e indemnização a seu favor.

Subsidiariamente, pediram que fosse operada a compensação entre os apontados créditos, reduzindo-se o dos Réus à quantia de € 387,57.

Os Réus, por seu turno, vieram também pedir a condenação dos Autores, por litigância de má fé, em multa e indemnização a seu favor.

Foi elaborado o despacho saneador e efectuada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

** Foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, julgando improcedente a reconvenção, condenou os Réus a pagar aos Autores a quantia de € 125.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até pagamento, absolvendo os Autores do pedido reconvencional.

Mais condenou os Réus, como litigantes de má fé, na multa correspondente a 15 UC e no pagamento – ao mandatário dos Autores – da quantia de € 2.500,00, a título de honorários.

*** Inconformados, os Réus interpuseram recurso, para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 17.3.2011 – fls. 386 a 394 –, negou provimento ao recurso, confirmando o Acórdão recorrido.

*** De novo inconformados os RR. recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão ora em crise, faz uma leitura perfeita do quid do recurso apresentado pelos ora Apelantes, não se discute a existência de um acordo ou contrato, que é patente, mas antes se existe naquele alguma obrigação directa perante os AA. que derive daquele texto, porém, a interpretação que faz do referido contrato, e as suas conclusões, é que se nos afiguram, com o devido respeito, incorrectas.

  1. Não podemos aceitar que, “as declarações de vontade – emitidas pelos Réus e aceites pelos Autores, (...) – envolvem inequivocamente a obrigação de os Réus adquirirem uma casa de habitação na Quinta do Sá que ficaria a pertencer ao Autor”.

  2. Com todo o respeito, reiteramos que do texto do referido contrato só se pode retirar que o mesmo foi feito com o fim primeiro, e último, de garantir à Mãe das partes, uma vez realizada as partilhas do património da família, um tecto, rendimentos, assistência, em suma todas as condições necessárias para que nada faltasse à Mãe enquanto a mesma fosse viva.

  3. Naquele contrato somente um outorgante tinha garantias e benefícios: a Mãe. Os restantes outorgantes, os filhos, só outras tinham obrigações, e dentro dessas obrigações uma parte delas cabia aos RR., em exclusivo: o adquirirem uma casa de habitação onde a Mãe ficaria a viver dispondo dessas casa como se dela fosse proprietária, n° 5 do contrato: “dispondo deste como se dele fosse proprietária”.

  4. Ou seja, é patente que a casa era para beneficiar a Mãe das partes, em exclusivo, a qual poderia dispor da mesma como se dela fosse proprietária. O escrever-se e referir-se tal amplitude de poderes/direitos que a Mãe teria sobre a casa não nos pode levar a concluir outra coisa.

  5. As partes quiseram, como se extrai, claramente da clausula 5ª do contrato, garantir à Mãe um direito pleno, sobre um imóvel, que ainda que registado em nome de um filho, a Mãe poderia dispor dele como proprietária e não conferir-lhe um mero direito vitalício de gozo, o uso e habitação, o usufruto.

  6. Nada mais se pode extrair do referido contrato, nomeadamente o raciocínio plasmado no acórdão em crise, onde se considera que o acordo celebrado ultrapassou em muito as necessidades de habitação da Mãe.

  7. E não ultrapassou porque, da sua leitura retiramos, com segurança, uma conclusão que destrói tal afirmação do acórdão recorrido: Se a Mãe das partes (AA. e RR.) não estivesse viva, teriam as mesmas outorgadas tal acordo? Obviamente que não, por inexistência de motivo e a razão para contratar, a Mãe das partes.

  8. Tendo a mesma falecido, as obrigações do contrato cessam pois nenhum sentido faz garantir-se o sustento a alguém que já não está entre nós, logo deixa de ter propósito comprar-se uma casa para beneficio da falecida mãe, que da mesma disporia como se proprietária fosse, uma vez que as partes contrataram por causa da Mãe e não para colocar em nome dos AA. um apartamento como compensação fosse do que fosse.

  9. Pois se assim fosse, não seria óbvio que tal compensação ficasse a constar do texto do contrato, para que inexistissem margens para dúvidas como as que temos agora? Se assim fosse, não seria natural retirar do texto, no seu n°5, a expressão supra referida “dispondo dele como se dele fosse proprietária”, e acrescentar, v.g. no n°6 do referido contrato três ou quatro simples palavras no início da oração, como “Por direito próprio”, ou “Em compensação por tornas...”? 11. Nada disso foi feito. E o facto é que as partes poderiam tê-lo feito. E se não fizeram, se não escreveram essa clareza de ideias, é porque não o quiseram fazer. E se não o fizeram é porque nunca o desejaram e somente, com o referido contrato, quiseram beneficiar a Mãe, e mais ninguém.

  10. Daí que se tenha de concluir que os RR., legitimamente, estavam plenamente convencidos que nenhuma obrigação tinham directamente com os AA em virtude do contrato em causa, pois que o ter-se provado que os AA. estavam convencidos que os RR. iriam transmitir-lhe o imóvel, não gera nestes a obrigação de o fazerem.

  11. Não estando provada a declaração de vontade dos RR., alegadamente espelhada naquele contrato, como sendo a de transmitir o dito imóvel aos AA., independentemente da sorte da Mãe destes, não pode revelar, por si só, a prova de “Que os Réus sabiam do convencimento dos autores que estes lhes iriam transmitir o imóvel” 14. Ou seja, inexiste qualquer prova nos autos da vontade contraposta dos RR. mas perfeitamente harmonizável com a vontade dos AA, como lhe chama Manuel de Andrade, pois não ficou provado que os RR. sabiam da obrigação que recaía sobre eles de...

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