Acórdão nº 15/2002.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelPEREIRA RODRIGUES
Data da Resolução27 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR.

No Tribunal do Trabalho do Funchal, 1 - AA, 2 -BB, 3- CC, 4 - DD, 5 - EE, 6 - FF, 7 - GG, 8 - HH, 9 - II, 10 - JJ, 11- KK, 12 - LL, 13 - MM, 14 - NN, 15 - OO, 16 - PP, 17 - QQ, 18 - RR, 19 - SS, 20 - TT, 21 - UU, 22 - VV, 23 - XX, 26 - ZZ, 27 -AAA, 28 - BBB, 29 - CCC, 30 - DDD, 31- EEE, 32 - FFF, 33 - GGG, 34 - HHH, intentaram a presente acção especial de anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho, contra: 1 - “ACIF - Associação Comercial e Industrial do Funchal”, 2 - "ETP-RAM - Associação Portuária da Madeira - Empresa Trabalho Portuário", 3 - "Sindicato dos Trabalhadores Portuários da RAM", 4 - "Sindicato dos Estivadores Marítimos do Arquipélago da Madeira", pedindo que seja anulado o CCT celebrado entre os Réus, publicado no JORAM, III série, n° 22, de 16/11/2001, ou, caso assim não se entenda, sejam anuladas as cláusulas 1.ª, n° 1, 18.ª, n° 6, 30.ª, n° 3, 46.ª, n° 2, 48.ª, n° 4, 57.ª, n° 4, 63.ª, n° 4, 73.ª, n° 2, 107.ª e anexo II, Tabela Salarial III, por violação das alíneas a) e b), do n.° 1, do art. 6.° do Dec-Lei n° 519-C1/79, e, ainda, que sejam anuladas as cláusulas n°s 26.ª, n° 4, e 136.ª por violação do disposto na alínea d), do n.° 1, do art. 6º do Dec.-Lei n.° 519-C1/79, alegando, para tanto, em síntese, que: Não estão filiados nos sindicatos subscritores daquele Contrato Colectivo; Os Autores constam da listagem anexa ao CCT como "trabalhadores temporários"; O CCT pretende abranger os "trabalhadores temporários" e, ao impor as suas condições a trabalhadores não filiados nos sindicatos signatários, o âmbito da cláusula 1.ª, n° 1, viola o art. 55° da CRP; No Anexo III, ambas as listas (I e II), incluem trabalhadores em exacta igualdade de circunstâncias, mas prevêem-se diferentes remunerações, nas cláusulas 57.ª, n° 4, e 30.ª, n° 3, com fundamento na sua integração numa ou noutra lista; A cláusula 18.ª, n° 6, proíbe que os trabalhadores a termo ou em regime de trabalho temporário possam vir a ser efectivos, o que viola os arts. 42.°, n° 3, 47.° e 51.° do DL n° 64-A/89, que têm carácter imperativo; As cláusulas 46.ª, n° 2, 48.ª, n° 4, 63.ª, n° 4, estabelecem regimes diferenciados em matéria de férias, pagamento de férias e de subsídio de férias, consoante o tipo de vínculo dos trabalhadores, violando os arts. 6.º, n° 1, do DL n° 874/76 e 84.°, n° 2, da LCT e 21.°, n° 2, do DL n.° 358/89; As cláusulas 73.ª , n° 2, 107.ª ou 109.ª prevêem situações discriminatórias; Nos anexos referentes às tabelas salariais, para o desempenho das mesmas tarefas, os trabalhadores auferem menor remuneração base e são pior pagos em relação às demais parcelas retributivas; As cláusulas 19.ª, n° 1, 26.ª, n°4, e 136.ª violam a proibição constante do art. 6.°, n° 1, al. d), do DL n° 519-C1/79 e o art. 61.°, n° 1, da CRP, porque regulam directamente a actividade económica; A ETP/RAM tem como única actividade a cedência temporária de trabalhadores para utilização por terceiros e estes podem ser efectivos ou contratados a termo, mas são todos "trabalhadores temporários"; A ETP/RAM é uma sociedade comercial de composição tripartida e formada pelo Governo Regional, os sindicatos subscritores da convenção e os operadores portuários e, portanto, os sindicatos em causa estão a negociar consigo próprios.

Os Réus contestaram, invocando a ilegitimidade dos Autores, com alegado fundamento de não serem sindicalizados e a Portaria de Extensão não se encontrar publicada, à data da propositura da acção, e o CCT só ser aplicável aos Autores quando a PE for publicada, nos termos do n.° 1, do art. 7.° e 8.° do DL n.° 519-C1/79.

Alegaram, ainda, que: As condições laborais dos trabalhadores temporários constantes no CCT são específicas, porque estes trabalhadores mantêm com as entidades empregadoras relações laborais de duração limitada, sendo mão-de-obra suplementar sujeita a condicionamentos específicos, respeitantes à sua legitimação como tal; Por se tratar de um serviço público, a interpretação das cláusulas deve ser lida à luz destas especificidades da actividade portuária; As diferenças de tratamento entre os trabalhadores não têm por fundamento a mera inclusão dos respectivos trabalhadores na Lista I ou na Lista II do Anexo III, mas sim de terem, ou não, vínculo contratual de trabalho ao sector, o que implica diferenças nos direitos e regalias; Quanto às férias dos trabalhadores temporários, o CCT em causa estabelece um regime mais favorável do que o dos trabalhadores não temporários porque podem escolher o período em que pretendem gozar férias; A ETP/RAM é uma pessoa colectiva de direito civil, constituída sob a forma associativa, sem fins lucrativos, cedendo, quando necessário, mão-de-obra em regime de trabalho portuário, subscrevendo o CCT apenas como forma de ficar obrigada, mesmo antes de, ou sem, Portaria de Extensão.

Concluem pela procedência da excepção da ilegitimidade processual dos Autores e, caso assim não se entenda, pela improcedência da acção.

Os Autores responderam, refutando a invocada excepção.

Prosseguindo os autos os seus trâmites, foi proferido despacho saneador-‑sentença que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade activa e também improcedente a acção, não declarando a nulidade das cláusulas convencionais requeridas.

Os AA., não conformados, apelaram da sentença, vindo a ser proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no qual se decidiu, por unanimidade, julgar parcialmente procedente o recurso, alterando a sentença na parte relativa à apreciação da validade da cl.ª 19.ª, n.° 9, do CCT, que se declarou nula, por violação do preceituado pelo art. 6.°, n° 1, al. d), do DL 519-C1/79, de 29/12 (corroborado pelo art. 533.°, n° 1, al. b), do CT de 2003 e art. 478.°, n° 1, al. b), do CT de 2009), confirmando, no demais, a sentença recorrida.

Mais uma vez inconformados, os Autores interpuseram recurso de Revista para este STJ, apresentando alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: «1- O CCT em causa foi subscrito pela empresa ETP/RAM na qualidade de entidade empregadora e pelos Sindicatos dos Carregadores e dos Estivadores como representantes dos trabalhadores.

2- A ETP/RAM era então composta, em partes iguais e poderes equivalentes, pelo Governo Regional da Madeira, a "OPM - Sociedade de Operações Portuárias da Madeira, LdJ", e pelos aludidos Sindicatos, embora, logo a seguir, o Governo Regional abandonasse a sociedade, sem ter sido substituído.

3- Estes sindicatos outorgam a convenção detendo a dupla qualidade de gestores da entidade empregadora e representantes dos trabalhadores neles sindicalizados.

4-Tratando-se de um óbvio "negócio consigo próprio", é forçoso concluir que o mesmo violou o disposto no art.º 3.º do Dec.-Lei n.º 519-C1/79 e violou o princípio da independência dos sindicatos constante do art. 6.º do Dec.- Lei n.º 215-B/75.

5- Tal como foi reconhecido pelo Acórdão ora sob revista, o CCT assenta na pretensão de efectuar a "gestão (sic) da mão-de-obra nos portos da RAM", embora, na prática, pretenda regulamentar toda a actividade de carga e descarga destes portos.

6- O mesmo Acórdão reconheceu que as disposições do CCT constituíam regulamentação de uma actividade económica e, consequentemente, "a sua sede mais adequada não seja um IRT", mas resolveu ignorar essa reconhecida ilegalidade porque a mesma, "não introduz distorções na livre concorrência".

7- Independentemente de quaisquer outras considerações, o certo é que esta última conclusão não encontra qualquer suporte na matéria de facto que foi provada.

8- Tendo o Acórdão identificado, neste aspecto, as cláusulas 19.ª, 26.ª e 136.ª, será forçoso reconhecer a sua ilegalidade.

9- Sendo patente que essas cláusulas violam frontalmente o disposto no art. 6.º, n.º 1, al. d) do Dec.-Lei n.º 519-C1/79.

10- Atendendo à relevância deste tipo de cláusulas, relativamente à globalidade da matéria regulada no CCT, a sua óbvia nulidade não deverá ser vista isoladamente.

11- Com efeito, o CCT regula, de forma individualizada, quem são os sujeitos que estão abrangidos pelo mesmo, identificando, nome a nome, os trabalhadores que as partes, por si só, e, independentemente da opinião dos visados, definiram como sendo passíveis de aplicação dos regimes aí previstos.

12- Essas listagens são inalteráveis durante o período de vigência do CCT e apenas são pontualmente actualizáveis aquando da sua revisão.

13- Tratando-se, ao fim e ao cabo, de um verdadeiro "pacto de emprego", que regulamenta e legitima quem são os concretos indivíduos que podem trabalhar no sector e quais irão ser os respectivos níveis de retribuição.

14- Em consequência, a convenção determina como âmbito de aplicação todo e qualquer trabalhador, desde que este se encontre "inserido no âmbito de representação profissional do Sindicato...", em violação do disposto no art. 7.º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 519-C1/79, que apenas admite essa aplicabilidade aos membros da associação sindical celebrante, tal como, aliás, foi aflorado no Acórdão ora sob revista.

15- A cláusula 46.ª, n.º 2 do CCT determina que, para os trabalhadores que designa como "temporários", "são considerados como períodos de férias... aqueles em que não sejam contratados".

16- Sendo posto em causa o direito ao gozo e pagamento das férias dos trabalhadores denominados de "temporários", pelo teor desta cláusula 46ª, n.º 2, bem como das cláusulas 48.ª, n.º 4 e 63.ª, n.º 4, violando o art. 4.º, n.º l, da "Lei das Férias, Feriados e Faltas", na redacção do...

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