Acórdão nº 499/99 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Setembro de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução21 de Setembro de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 499/99

Processo n.º 33/99

  1. Secção

    Relator – Paulo Mota Pinto

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

    1. Relatório

    1. M... instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Mafra acção especial de despejo, com processo sumário, contra J... e mulher, L..., pedindo que se declarasse denunciado o contrato de arrendamento, "para o fim do prazo actualmente em curso, ou para o da renovação em curso à data da sentença", condenando-se os Réus "a entregar nessa data à A. a fracção, incluindo a mobília objecto do contrato, e livre e devoluta de quaisquer outros bens ou pessoas" e, a título subsidiário, "que seja considerado resolvido o identificado contrato de arrendamento", nos termos do artigo 64º, n.º 1, alínea i), do Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro (Regime do Arrendamento Urbano).

      Regularmente citados, os Réus contestaram alegando, entre o mais, que, "quanto ao eventual direito à resolução do contrato com fundamento em falta de residência permanente dos Réus no locado (...), terá caducado o direito à propositura da acção respectiva, uma vez ter decorrido mais de um ano sobre a data em que a Autora teve conhecimento do facto que lhe serve de fundamento", "sendo certo também que àquela data – 5 de Março de 1985 – era aplicável à matéria em causa o preceituado no Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Maio de 1984, publicado no DR I Série, n.º 152 de 3 de Julho de 1984".

      Foi, em 3 de Março de 1998, proferida sentença que, havendo por improcedente a excepção de caducidade invocada na contestação, julgou procedente e provado o pedido subsidiário formulado pela Autora, declarando resolvido o referido contrato de arrendamento e condenado os Réus a entregarem o locado livre e devoluto de pessoas e bens, à excepção da mobília objecto do contrato".

    2. Inconformados com esta decisão, interpuseram J... e mulher, L..., recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando, no que para o presente recurso releva, que "(...) o que parece certo é que a interpretação que o M.º Juiz ‘a quo’ faz (aliás com um brilhantismo invulgar) das normas aplicadas – a saber, artigo 65º, n.º 2 do R.A.U. e norma transitória do Dec.-Lei que o aprovou (artigo 3º do Dec.-Lei 321-B/90 de 15/10), é uma interpretação desconforme à Constituição da República Portuguesa".

      Por Acórdão de 12 de Novembro de 1998, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento à apelação, confirmando a sentença recorrida, remetendo para os fundamentos do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 486/97, publicado no Diário da República, II Série, de 17 de Outubro de 1997.

    3. Novamente inconformados, interpuseram os apelantes, ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal Constitucional), o presente recurso de constitucionalidade, em ordem à apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos 65º, n.º 2 do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, e 3º, n.º 3 do respectivo Decreto Preambular.

      Neste Tribunal, os recorrentes concluíram as suas alegações do seguinte modo:

      "1ª

      A decisão recorrida é o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou a decisão de 1ª instância do Tribunal Judicial da Comarca de Mafra, ambas decisões tiradas nos autos amplamente identificados.

  2. De acordo com a lei processual do Tribunal Constitucional, a decisão em crise e de que se recorre é a do Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. Decisão que está a interpretar as disposições que constituem fundamento do recurso desconformemente à Constituição.

  4. O Acórdão recorrido delimitou, para fins da sua própria tomada de decisão, a questão material controvertida de modo a considerar que a situação de facto subjacente à questão jurídica era a de estar provado que a autora, ora recorrida, tinha conhecimento, desde Março de 1985, da falta de residência permanente no locado por parte dos réus.

  5. Afirma, a mesma decisão, que a sua opinião se baseia na convicção que ‘a lei aplicável à excepção de caducidade do direito de accionar é a vigente à data da propositura da acção’.

  6. E isto porque «só quando a acção é proposta é que nasce o direito do réu a excepcionar a caducidade do direito do autor a propo-la»

  7. Por outro lado, depois de aqui partir, vai, a decisão recorrida, sustentando o seu raciocínio discursivo, nomeadamente com a conclusão que ‘os recorrentes não são titulares de qualquer direito adquirido – nem sequer de uma mera expectativa – a não mais serem despejados pelo facto de a apelada senhoria não ter proposto a acção no ano subsequente ao do conhecimento do facto-fundamento’.

  8. Salvo melhor opinião, a fundamentação (e as conclusões) do Acórdão ora recorrido , está impregnado de vários vícios.

  9. O Tribunal a quo pressupôs que o recurso se fundamentava na inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 65º, n.º 2, do RAU e 3º, n.º 3, do Decreto-lei n.º 32l-B/90, e não na interpretação desconforme à Constituição das mesmas disposições.

  10. Assim sendo, e em primeiro, não pode nenhum Tribunal, seja de que instância for, julgar as opções do legislador e se têm ou não adequado suporte material.

  11. Ao expender considerações dessas está, até, a Decisão recorrida a imiscuir-se em Função do Estado para cuja apreciação não tem poderes nem competências.

  12. Nesta matéria, cabe apenas aos Tribunais – e, em última instância, ao Tribunal Constitucional – verificar se essa legislação contende com o preceituado na Constituição da República e não comentar se a nova legislação tem ou não adequado suporte material.

  13. O que aqui se cura é se, as jurisdições de 1ª e 2ª instância, interpretaram o novo normativo conforme à Constituição ou não.

  14. Sucede que, em segundo, para a decisão recorrida, a razão dos recorrentes ou da recorrida tem de aferir-se no momento da propositura da acção, pois será, nesse exacto momento, que nascerá o direito do(s) réu(s) à caducidade da mesma.

  15. Não resistimos a uma exclamação dado que, por um lado, essa interpretação subverte todo o ordenamento jurídico e a relação direito substantivo/direito adjectivo, e, por outro, a fundamentação desta conclusão não é coerente.

  16. Se assim é para o Acórdão recorrido, significa que, nascendo o direito à excepção por caducidade da acção no momento da respectiva propositura, então o nascimento daquele é consequência do facto instantâneo corporizado nesta.

  17. Não pode, em coerência, a Decisão recorrida fazer apelo ao n.º 2 do artigo 12º do Código Civil para se fundamentar, dado a previsão dessa norma se dirigir, exactamente, para relações jurídicas que se constituíram antes da entrada em vigor da nova lei.

  18. Como é dos manuais, uma relação jurídica supõe um complexo de direitos e obrigações entre, pelo menos, dois sujeitos de direito...

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