Acórdão nº 448/02 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Outubro de 2002

Magistrado ResponsávelCons. Fernanda Palma
Data da Resolução29 de Outubro de 2002
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nª 448/02

Proc. nº 426/2001

  1. Secção

    Rel.: Consª Maria Fernanda Palma

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

    I

    Relatório

    1. Nos presentes autos de fiscalização concreta de constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como recorrente A. e como recorrida B, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa impugnando, entre o mais, a decisão que havia indeferido a arguição de nulidades resultantes de, no âmbito da providência cautelar requerida contra a recorrida, não ter o recorrente sido notificado da junção de documentos constantes do processo principal e de ter sido proferida decisão de providência cautelar sem audiência de julgamento final. Nas conclusões afirmou o seguinte:

  2. A omissão de actos de notificação do Requerente para as diligências probatórias levadas a cabo pelo Mmº Juiz a quo, após a decisão do STJ, e a produção de prova sem audiência final, consubstanciam nulidades de processo que influiram no exame e na decisão da causa, e tornam anulável os actos subsequentes, designadamente a decisão final, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do artº 201° do CPC;

  3. A referida omissão constitui violação do contraditório legal e constitucionalmente consagrado; tendo sido proferida decisão final com preterição de tal princípio foi feita aplicação das normas do CPC dos artºs 201°-1, e 400°-2, parte final, de antes da revisão, e do artº 386°-1 revisto, com sentido e alcance inconstitucionais por violação dos princípios e das normas dos artºs 2°, 20°-1 e 202°-2 da CRP;

    A. interpôs, igualmente, recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa do despacho de fls. 661, que, indeferindo o pedido de reforma do despacho que havia admitido o recurso de fls. 603 e lhe havia fixado o efeito devolutivo, condenou o requerente em custas. Nas respectivas alegações, o recorrente afirmou o seguinte:

    1. Entender que o despacho impugnado encontra fundamento legal no invocado artº 16° do CCJudiciais, consubstancia interpretação e aplicação da norma nele contida em desconformidade com a Constituição, designadamente com as normas e princípios consagrados nos seus artºs 2º, 20°-1 e 4, 62°-1 e 165°-1, al. i);

      O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu o seguinte:

      - quanto ao primeiro recurso:

      Em relação a este recurso, o agravante formulou as seguintes conclusões:

      - A omissão de actos de notificação do requerente para as diligências probatórias levadas a cabo pelo Mmº Juiz a quo, após a decisão do STJ, e a produção de prova sem audiência final, consubstanciam nulidades de processo que influíram no exame e na decisão da causa, e tomam anulável os actos subsequentes, designadamente a decisão final, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do art. 201°;

      - A referida omissão constitui violação do contraditório legal e constitucionalmente consagrado; tendo sido proferida decisão final com preterição de tal princípio foi feita aplicação das normas do C PC dos arts. 201°-1, e 400°-2, parte final, de antes da revisão, e do art. 386º-1 revisto, com sentido e alcance inconstitucional por violação dos princípios e das normas dos arts. 2°, 20°-1 e 202°-2 da CRP;

      - Tais nulidades de processo foram atempadamente reclamadas; tendo sido indeferidas foram violadas as normas dos nºs 1 e 2 do art. 201° do C PC.

      A agravada nas suas contra-alegações defende a improcedência destas pretensões.

      Das citadas conclusões do agravante deduz-se - segundo nos parece dada a pouca clareza daquelas - que o mesmo, para decidir neste recurso, levanta apenas a seguinte questão:

      A falta de notificação da descida dos autos do STJ, da ordem de junção de documentos aos autos dada no despacho de fls. 523 e verso, do cumprimento deste despacho e da prolação do despacho de fls. 576 e seguintes, sem audiência de julgamento, integra uma nulidade processual que afecta a validade e regularidade do processo?

      Vejamos, antes de mais, os factos apurados nos autos que interessam para a decisão desta questão que são seguintes:

      - Na decisão do anterior recurso de agravo sobre a decisão final foi a fls. 421 e seguintes, proferido acórdão que anulou o despacho agravado para ser substituído por outro que declare os factos julgados provados;

      - Esta decisão foi confirmada pelo STJ - fls. 512 -, pelo que transitou em julgado;

      - Na sequência desta última decisão, foram os autos remetidos à 1ª instância, sem que essa remessa tenha sido notificada ao agravante;

      - Nesta instância foi proferido despacho que ordenou a junção aos autos de certidões de partes do processo principal de que este procedimento cautelar é dependência e a que estava, então, apenso;

      - Em cumprimento deste despacho foram juntas as referidas certidões;

      - Quer daquela ordem quer do seu cumprimento, não foi dado conhecimento ao agravante;

      - Em seguida, foi proferido o novo despacho final sem serem levadas a cabo quaisquer outras diligências de prova ou se haver procedido a audiência formal de julgamento;

      - A primeira vez que foi dada conhecimento ao agravante do andamento do processo após a notificação do acórdão do STJ referido, foi na notificação do mesmo despacho final, não tendo entretanto, aquele tido qualquer intervenção nos autos.

      Será com estes factos que será decidida aquela questão.

      As nulidades processuais constituem quaisquer desvios do formalismo processual seguido em relação ao formalismo processual prescrito na lei, a que esta faça corresponder - embora não de modo expresso - uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais, pelo que a omissão acusada constitui uma nulidade processual.

      Do regime destas que consta dos artigos 193° e seguintes, resultam vários princípios, entre os quais, o de que a nulidade é, em regra, meramente relativa, ou seja; depende de ser arguida em prazo fixo, e o princípio de que essa irregularidade é sanável, salvo disposição em contrário.

      Fora das nulidades principais previstas nos artigos 193° a 200°, que não estão em causa nos autos, as nulidades não são do conhecimento oficioso – artº 202° - e só são invocadas pelo interessado na observância da prescrição omitida. Além disso, nos termos do artº 205°, n° 1, a parte interessada tem de argui-la no momento em que a mesma for cometida, se a ela estiver presente e não o estando, pode argui-la no prazo de cinco dias - artº 153º na redacção do C.P.C., então em vigor - , contado o mesmo prazo, do dia, após aquela, em que interveio em algum termo dele ou foi notificada para qualquer termo do mesmo, mas neste último caso, só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.

      Por último, temos a regra do artº 201º que prescreve que, fora do caso das nulidades principais, a irregularidade cometida possa influir na decisão da causa.

      Ora no caso dos autos, praticaram-se irregularidades processuais que não configuram nulidades principais, e foram aquelas atempadamente arguidas. Vejamos se as mesmas produzirão nulidades.

      Há a distinguir os vários actos ou omissões praticados.

      Em primeiro lugar temos a omissão de notificação da descida dos autos do STJ, do despacho de fls. 532 e verso e do cumprimento deste.

      O princípio processual do contraditório previsto genericamente no art. 3° e mais especificamente no art. 517° para a produção de prova, exigia que aqueles passos processuais fossem dados a conhecer ao agravante e não o foram.

      Porém, não havendo lei que comine aquelas deficiências processuais com a nulidade, também daquelas não resulta ter a decisão da causa sido influenciada pelas mesmas.

      Com efeito, ter o agravante tido conhecimento do paradeiro dos autos na 1ª instância ou ainda no STJ é questão que não afectou os direitos daquele agravante ou tenha influído na decisão da causa.

      Por outro lado, a omissão de notificação do despacho que ordenou a junção aos autos das certidões de fls. 524 e seguintes também não influiu na decisão da causa.

      É que o agravante podia dele discordar e, eventualmente, interpor recurso do mesmo - caso o mesmo o admitisse - quando veio a ter dele conhecimento, o que não fez.

      Portanto, a falta de conhecimento não impossibilitou o agravante de reagir contra aquele, mesmo depois dele cumprido, o que poderia - caso tivesse agravado daquele - ter originado a anulação do seu cumprimento e do processamento subsequente, caso o hipotético agravo tivesse merecido provimento.

      A referida junção das certidões nem sequer implicavam uma produção de prova documental a que fosse aplicado o disposto no art. 517°.

      É que o referido despacho estava apenas a ordenar o processo - e daí a dúvida da admissibilidade de recurso -, pois as mesmas provas documentais estavam já produzidas nos autos principais a que os presentes estavam apensos e, por isso, podiam ter sido tomados em conta sem a referida junção.

      Esta apenas se justificaria aquando da subida do presente recurso, por ter sido desapensado o presente incidente, como instrução do recurso, nos termos do art. 742°.

      É certo que o agravante deveria ter sido notificada daquela junção para poder controlar a autenticidade das referidas certidões.

      Mas a eventual discordância daquela autenticidade podia ter sido nanifestada, mais tarde, aquando da notificação seguinte, mas aquele não a impugnou, pelo que a referida irregularidade não influiu na decisão da causa.

      Por último, resta-nos a falta de audiência de julgamento.

      Há que ver o teor da decisão da Relação para se aferir da eventual prática de uma omissão processual no despacho de fls. 576 e segs.

      A presente providência cautelar teve o seu requerimento inicial, a oposição da requerida e a produção de prova documental e testemunhal e antes do encerramento da audiência respectiva - fls. 287 - foi dito que seria a causa decidida em despacho.

      Em seguida foi proferido despacho a decidir aquela - fls. 300 e 301 -, no qual foi apreciado muito brevemente a matéria de facto provada, sem que a descrevesse completamente, pelo que o acórdão, que sobre aquele recaiu, o anulou mandando substitui-lo por...

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