Acórdão nº 56/02 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Fevereiro de 2002

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2002
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 56/02 Processo nº 376/01 3ª Secção

Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Pela sentença de fls. 1369, de 14 de Setembro de 1999, do Tribunal de Família de Lisboa, foi julgado o pedido de regulação do exercício do poder paternal pedido por J... contra R..., relativo a seu filho A....

    Desta sentença recorreram a Curadora de Menores junto daquele Tribunal (requerimento de fls. 1374) e J... (requerimento de fls. 1387). Pelo requerimento de fls. 1398, apresentado em aditamento àquele, J... veio suscitar a inconstitucionalidade da “interpretação do artº 185º, nº 1 da O.T.M. no sentido de ser taxativo e vinculativo o efeito devolutivo aí referido (...) porquanto, neste caso concreto, tal interpretação poria em causa o efeito útil do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, violando os seguintes artigos da Constituição da República Portuguesa: artº 20º (...), artº 13º (...), arts. 2º, 3º e 205º (...), artº 36º (...), artº 41º (...)”.

    Pelo despacho de fls. 1401, foi admitido “o recurso interposto a fls. 1374 e 1387, que é de apelação a subir imediatamente”, com efeito suspensivo.

    Novo despacho do mesmo teor foi proferido a fls. 1648, por, entretanto, ter sido anulado parte do que havia sido processado.

  2. Pelo despacho de fls. 1931, de 5 de Maio de 2000, do Tribunal da Relação de Lisboa, foi alterado o efeito atribuído ao recurso, passando a ser meramente devolutivo, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 185º da Organização Tutelar de Menores.

    Este efeito foi mantido pelo acórdão da conferência de 20 de Fevereiro de 2001, de fls. 2096, proferido por reclamação do recorrente (requerimento de fls. 1969), nos seguintes termos:

    “2. Apreciando e decidindo:

    Os art. 150° da O.T.M. e 1409° do C.P.C. não têm aplicação directa ao caso dos autos, uma vez que existe uma norma própria, especial – a do art. 185º da L.T.M. – que regula directamente a matéria do efeito do recurso interposto da decisão final proferida em sede de processo de regulação de poder paternal.

    O efeito consagrado pela lei é o meramente devolutivo. E, a lei não ressalvou a aplicação do efeito suspensivo em qualquer uma hipótese por mais especial que ela seja, sendo certo que, no caso dos autos, não se vê que ele seja por demais diferente de tantas outras situações que carecem da intervenção do tribunal por os pais se não entenderem relativamente ao exercício do poder paternal sobre os seus filhos.

    Por outro lado, não é legítimo lançar mão do valor da decisão recorrida para fixar um ou outro dos efeitos possíveis. O legislador, ao fixar sem excepção, o efeito devolutivo ao recurso, partiu, certamente, do princípio de que, embora a decisão da primeira instância possa vir a ser alterada em sede de recurso, aquela deve prevalecer até que tal alteração se dê, pois que será mais conforme à situação factual do que a mera situação de facto que motivou o pedido de intervenção do tribunal ou alguma decisão provisória, entretanto proferida. E, com fundamento, considerou esta posição, pois que a decisão final da primeira instância foi precedida de averiguação, em que se confere grande margem de liberdade ao tribunal na recolha das provas e na decisão a tomar, permitindo-se-lhe até julgar segundo a equidade. Tudo isto confere fidedignidade suficiente à decisão da primeira instância como sendo a que melhor acautela os interesses do menor, de tal modo que a lei optou, sem ressalva, por fixar o efeito meramente devolutivo aos recursos interpostos dessas decisões.

    Esta interpretação do disposto no art. 185° da L.T.M. não se vê que viole qualquer uma das normas constitucionais invocadas, pois nenhuma delas se prende com esta matéria. Quanto muito a decisão recorrida é que poderá ter violado algum dos princípios nelas consagrados. Mas isso é matéria que só em sede de apreciação do recurso poderá ser tida em conta.

    Pelo exposto julga-se a questão prévia improcedente e, em consequência, confirma-se o despacho reclamado, ou seja, que o recurso tem efeito meramente devolutivo”.

  3. Deste acórdão recorreu J... para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, nos seguintes termos:

    “(...)

    1 - O recorrente é autor do processo de Regulação de Poder Paternal n.º 333-A/96 que correu termos no 1° Juízo, 1ª secção do Tribunal de Família de Lisboa.

    2 - Da decisão final aí proferida interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.

    3- No seu requerimento de interposição do recurso, bem como nas alegações desse recurso, suscitou desde logo a inconstitucionalidade da interpretação da norma do art. 185°, n°. 1 da O.T.M./L.T.M, no sentido de o efeito devolutivo referido nessa norma ser taxativo e vinculativo, por impedir, em qualquer circunstância, a aplicação de outras disposições legais determinantes para ponderação do interesse do menor, porquanto, neste caso concreto, tal interpretação viola os artºs 2º, 3°, 13°, 20°, 36°, 41° e 205° da Constituição da República Portuguesa, pondo em causa o efeito útil do recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.

    Isto, porque a decisão recorrida passaria a produzir efeitos imediatos, fazendo operar a violação dos princípios, direitos e garantias constitucionais consagrados nos artigos seguintes: art.º 20° "Acesso ao direito e tutela juridiscional efectiva", designadamente o seu n°. 5; art.º 13° "Princípio da igualdade", designadamente o n°. 2; art.ºs 2°, 3° e 205°, "Estado de direito", "Soberania e legalidade", e "Decisões dos tribunais"; art.º 36° "Família, casamento e filiação", designadamente os seus n°.s 5 e 6; art.º 41°, "Liberdade de consciência, religião e de culto".

    4- O despacho de admissão do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, proferido na 1ª Instância em 6-12-99, fixou-lhe o efeito suspensivo, fazendo uma interpretação correcta da norma do art.º 185°, n°.1 da 0.T.M./L. T .M.

    5- Por despacho de 4-5-00 o Mmº Juiz Relator do Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu alterar o efeito atribuído ao recurso na 1ª Instância, fixando-lhe o efeito devolutivo, interpretando a norma do art.º 185°, n.º 1 da 0.T.M/L.T.M., no sentido de que o efeito devolutivo aí referido é taxativo e vinculativo no caso de recurso interposto da sentença que regula o exercício do poder paternal, interpretação essa que, em concreto, é inconstitucional, tal como o recorrente havia arguido anteriormente, no seu requerimento de interposição do recurso.

    6- Deste despacho o recorrente reclamou para a Conferência continuando a arguir a inconstitucionalidade da interpretação da norma do art.º I85°, n.º1 da 0.T.M./L.T.M. que aquele despacho havia feito.

    7- 0 Acórdão proferido em consequência desta reclamação para a Conferência mantém aquela interpretação inconstitucional da norma do art. 185°, n.º1 da O.T.M./L.T.M, decidindo que "Esta interpretação do disposto no art.º 185° da L.T.M. não se vê que viole qualquer das normas constitucionais invocadas, pois nenhuma delas se prende com esta matéria. Quando muito a decisão recorrida é que poderá ter violado alguns princípios nelas consagrados", confirmando o despacho reclamado.

    (...)

    O recurso foi admitido, em decisão que não vincula este Tribunal (nº 3 do artigo 76º da Lei nº 28/82).

  4. Notificadas para o efeito, as partes apresentaram as suas alegações.

    O recorrente concluiu da seguinte forma:

    “CONCLUSÕES:

    1. - As decisões judiciais, designadamente em processo de Regulação do Poder Paternal, mal ponderadas podem violar gravemente princípios, direitos liberdades e garantias pessoais de um menor...

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