Acórdão nº 599/04 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução12 de Outubro de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 599/04

Processo n.º 930/03 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório AUTONUM 1.Em 21 de Janeiro de 1994, A., melhor identificado nos autos, intentou, no Tribunal Judicial de Abrantes, acção com processo especial emergente de contrato individual de trabalho contra B., e companhia de seguros C. para obter: da primeira uma indemnização por incapacidade temporária absoluta (ITA) ocorrida entre 30 de Janeiro de 1990 e 13 de Agosto de 1993 e uma pensão anual vitalícia, com início em 14 de Agosto de 1993; da segunda uma pensão anual vitalícia, com início na mesma data; e de ambas uma indemnização, a fixar nos termos do artigo 60.º do Código das Custas Judiciais do Trabalho, e juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento, tudo decorrente do acidente de trabalho, ocorrido em 29 de Janeiro de 1990, em Volyske, na antiga U.R.S.S..

    Em 19 de Março de 1998 a acção foi julgada procedente quanto aos pedidos dirigidos individualmente a cada uma das demandadas e ainda no que respeita à condenação no pagamento de juros de mora.

    Em 9 de Setembro de 1998, o trabalhador referido veio intentar acção de execução para pagamento de quantia certa, no mesmo Tribunal, contra a sua anterior entidade patronal (a primeira sociedade referida). Transitado o processo para o Tribunal do Trabalho de Abrantes e constatada a falência da empresa, foi requerida a intervenção da Caixa Nacional de Seguros e Doenças Profissionais para satisfazer os créditos devidos.

    Por extinção do Fundo de Garantia e Actualização de Pensões (FGAP) em 15 de Junho de 2000, transitaram tais responsabilidades para o Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT), que acedeu a cumpri-las em Janeiro de 2002, mas sem o pagamento de juros vencidos após a sentença condenatória e sem liquidação do montante fixado a título de incapacidade temporária absoluta.

    Requerido esse pagamento, foi ele indeferido por despacho de 21 de Fevereiro de 2002, da Mm.ª Juíza do Tribunal do Trabalho de Abrantes, que considerou, com fundamento no disposto na Base XLV da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, que o FAT, como sucessor da Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais, não tinha de pagar indemnizações devidas por incapacidades temporárias absolutas, nem juros.

    Recorrendo de agravo, logo o trabalhador impugnou a constitucionalidade do n.º 1 da Base XLV da Lei n.º 2127 e do artigo 6.º do anexo à Portaria n.º 642/83, de 11 de Junho, caso estas não dessem lugar ao regime decorrente da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, e do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril.

    Por acórdão de 15 de Outubro de 2002, a Secção Social do Tribunal da Relação de Évora deliberou negar provimento ao recurso, considerando, designadamente, que o que se discutia era “tão-só, o âmbito de uma incumbência supletiva do Estado, que de maneira nenhuma se mostra assegurada pela norma constitucional invocada” (a do n.º 1 do artigo 26.º da Constituição).

    Recorreu o trabalhador sinistrado para o Supremo Tribunal de Justiça, mantendo a suscitação das mesmas questões de constitucionalidade. Muito embora estas não tenham colhido a concordância do Ministério Público, no Parecer que apôs aos autos considerou este que “o n.º 3 da Portaria n.º 291/2000, na interpretação que lhe foi dada do Acórdão em recurso (...) padece de inconstitucionalidade por violação do estabelecido no art. 13.º da Constituição da República” já que careceria de fundamento material “a diferença de tratamento dos sinistrados que hajam sofrido acidentes de trabalho, antes ou depois de 1/1/2000”.

    Por acórdão de 26 de Novembro de 2003, a Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça decidiu negar provimento ao agravo, escrevendo, designadamente, o seguinte:

    “Ao legislador estaria vedado diminuir o âmbito da competência do FAT na assunção das responsabilidades das entidades insolventes relativamente à competência do anterior FGAP, ou traçar arbitrariamente uma fronteira de aplicação dos dois regimes sucessivos.

    E o legislador não o fez, não incorrendo em actividade legiferante desconforme com a Constituição.

    Ao invés:

    - estabeleceu uma nova competência do FAT, com dimensão mais abrangente para os acidentes ocorridos após 1 de Janeiro de 2000 – art. 39.º da LAT de 1997 e art. 1.º, n.º 1, al. a), do D.L. n.º 142/99, de 30 de Abril, e

    - estatuiu que as responsabilidades do FAP relativamente a acidentes ocorridos até 31 de Dezembro de 1999 ficavam limitadas às obrigações legais e regulamentares do FGAP – n.º 3 da Portaria n.º 291/2000.

    Dimensionando a competência do FAT pela competência do anterior FGAP relativamente aos acidentes ocorridos antes de 1 de Janeiro de 2000, utilizou um critério objectivo, que situa os sinistrados de acidente de trabalho ocorridos no mesmo período temporal perante os mesmos critérios legais e em perfeita igualdade de situações, o que não sucederia se viesse a dimensionar de forma diferente a responsabilidade do FAT consoante o trânsito em julgado da decisão judicial que reconhecesse a insolvência da entidade responsável e responsabilizasse o Fundo tivesse lugar antes, ou depois, da extinção do FGAP.

    Dir-se-á em conclusão que não se verifica qualquer das inconstitucionalidades suscitadas, devendo aplicar-se ao caso ‘sub judice’ o quadro normativo que resulta das disposições conjugadas do n.º 3 da Portaria n.º 291/2000, da Base XLV da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, e do art. 6.º do Anexo à Portaria n.º 642/83, o que implica a improcedência do recurso nos termos já expostos.”

    AUTONUM 2.O recorrente interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, para ver apreciada a conformidade com a Constituição da Base XLV da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, e do artigo 6.º do anexo à Portaria n.º 642/83, de 11 de Junho, concluindo assim as suas alegações:

    1. É inconstitucional o disposto na Base XLV da Lei n.º 2127, e no artigo 6.º do Anexo à Portaria n.º 642/83, por violação dos preceitos contidos no artigos 59.º, n.º 1, al. f), 26.º, n.º 1, e 13.º da Constituição da República Portuguesa;

    2. Tendo o recorrente sofrido acidente de trabalho no âmbito da vigência do regime legal referido na conclusão anterior, o qual previa a exclusão do pagamento das prestações resultantes de incapacidade temporária pelo FAT, e tendo o regime sido alterado em Janeiro de 2000 pela Lei n.º 100/97, merecendo aí acolhimento a pretensão do recorrente;

    3. Efectivamente, a revogação da Lei n.º 2127 e da Portaria n.º 642/83 pelo regime previsto na Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, determina a aplicação ao recorrente do regime aí previsto, que contempla o pagamento de indemnização pelo FAT;

    4. De outro modo o recorrente seria discriminado e ficaria em desvantagem patrimonial em relação a outros trabalhadores, em relação à indemnização por ITA, com comparação com IPP [incapacidade parcial permanente], não sendo uma solução que traduza uma “justa reparação”.

    Não houve contra-alegações do recorrido.

    Cumpre apreciar e decidir, começando por delimitar o objecto do recurso.

  2. Fundamentos AUTONUM 3.Como se deixou relatado, a decisão recorrida considerou aplicável ao caso “o quadro normativo que resulta das disposições conjugadas do n.º 3 da Portaria n.º 291/2000, da Base XLV da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, e do art. 6.º do Anexo à Portaria n.º 642/83”, tendo considerado não inconstitucionais todas essas disposições.

    Porém, objecto de recurso para este Tribunal, tal como foi delimitado no requerimento de interposição do recurso e confirmado nas conclusões das...

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