Acórdão nº 103/04 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Fevereiro de 2004
Magistrado Responsável | Cons. Pamplona Oliveira |
Data da Resolução | 11 de Fevereiro de 2004 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO N.º 103/2004
Proc. n.º 711/02 ? 1ª Secção
Relator: Cons. Carlos Pamplona de Oliveira
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 1ª SECÇÃO
A sociedade comercial denominada A. intentou nos Juízos Cíveis da Comarca de Lisboa acção a pedir que o tribunal declare a ?cessação/caducidade? do contrato de arrendamento comercial que, como senhoria, outorgara em 03 de Abril de 1968 com a B., fundamentando esse pedido na circunstância de, entretanto, o contrato ter perdurado ? devido a ?sucessivas e forçadas prorrogações? ? por 30 anos, período este que, em seu entender, corresponderia ao ?prazo máximo? legalmente permitido para a duração do contrato de arrendamento em causa.
A acção foi julgada improcedente. Dessa decisão apelou a autora para a Relação de Lisboa pretendendo a alteração do julgado; sustentou inter alia que ?é a própria Constituição que exige que seja outro o sentido e alcance do artigo 1025º do Código Civil, que não o acolhido pelo Tribunal a quo? (conclusão V. da respectiva alegação).
Por acórdão de 27 de Junho de 2002, a Relação de Lisboa negou provimento ao recurso.
Desse acórdão a autora interpõe recurso para o Tribunal Constitucional através de requerimento com o seguinte teor:
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O Recurso cuja admissão se requer é interposto ao abrigo do disposto no artigo 70º, n° 1, alínea b), n° 2, e n° 4, da Lei n° 28/82 de 15 de Novembro.
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Ressalvado todo o devido respeito, entende a Autora, ora Recorrente, que a interpretação e aplicação concretas dos artigos 1025º, 1051°, alínea a) e 1054° do Código Civil, vertidas na douta Sentença recorrida, com o sentido e o alcance propostos pelo Tribunal a quo, são claramente violadoras da Lei Fundamental, designadamente, dos artigos 13° n° 2, 18° n° 2 e 62° da Constituição.
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É pois a inconstitucionalidade dos referidos preceitos da Lei Civil, resultante da interpretação e aplicação perfilhada pelo Tribunal a quo no caso concreto, que se pretende ver apreciada em sede de Recurso no Tribunal Constitucional.
Pelo que, estando em tempo, e reunindo as demais condições exigidas pelos artigos 69º e seguintes da Lei n° 28/82 de 15 de Novembro, requer muito respeitosamente a Vossa Ex.a se digne admitir o recurso interposto, ordenando o prosseguimento dos autos em conformidade.
Este requerimento foi depois complementado, a convite do Tribunal, com o seguinte esclarecimento:
[...]
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O Recurso cuja admissão se requer é interposto com fundamento no artigo 70º, n° 1, alínea b) e n° 2, da Lei n° 28/82 de 15 de Novembro.
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Ressalvado todo o devido respeito, entende a Autora, ora Recorrente, que a interpretação e aplicação concretas dos artigos 1025°, 1051°, alínea a), e 1054° do Código Civil, vertidas no douto Acórdão recorrido, com o sentido e o alcance ali propostos pelo Tribunal a quo, são claramente violadoras da Lei Fundamental, designadamente, dos artigos 13° n° 2, 18° n° 2 e 62° da Constituição .
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Com efeito, em desacordo completo com todos os princípios e regras de interpretação e aplicação da Lei impostas no artigo 9° do Código Civil, sustentou o Tribunal a quo que a regra do artigo 1025° do Código Civil (Duração máxima) se refere apenas ao prazo inicialmente fixado pelas partes no contrato de arrendamento, e portanto, que ali se trata apenas de limitar a sua liberdade de estipulação.
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Ou seja, para o Tribunal a quo, o artigo 1025° do Código Civil não estabelece qualquer limite máximo para a vigência/duração dos contratos de arrendamento.
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E quando se lê no artigo 1051°, n° 1, alínea a), do Código Civil, que o contrato de arrendamento caduca findo o prazo estabelecido por Lei, tal não significa que o contrato cessa, pois o mesmo renovar-se-á obrigatoriamente nos termos do artigo 1054° do Código Civil.
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Concluindo: O Tribunal a quo entende que um contrato de arrendamento comercial, como o dos Autos, que perfez trinta anos de duração ininterrupta - o período máximo de vigência definido pelo artigo 1025° do Código Civil - não caduca, antes se renovando eternamente por aplicação do invocado principio da prorrogação forçada, supostamente estabelecido pelo artigo 1054°, n° 1, do Código Civil.
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Ora, a Recorrente entende precisamente o contrário, pois defende que o sentido correcto da regra contida no artigo 1025° do Código Civil é o de uma proibição oficiosa da perpetuidade dos arrendamentos, em especial dos comerciais, ditada por questões de ordem pública, maxime por valores constitucionais.
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É que, não caducando pelo decurso do prazo máximo de trinta anos imposto pela Lei, ou seja, podendo ser perpétuo por regra, o contrato de arrendamento comercial traduz-se, na prática, numa autêntica expropriação, jamais imaginada e muito menos querida pelos senhorios no momento inicial da contratação.
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Na opinião da Recorrente, o invocado principio da prorrogação forçada dos contratos de arrendamento comercial só opera e se impõe, via de regra, dentro do período máximo dos trinta anos, e não para além deste prazo.
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O referido princípio tem uma natureza manifestamente excepcional, explicado por razões de ordem política e social pontuais, actualmente injustificáveis no domínio do arrendamento comercial.
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Esta perpetuidade tendencial do arredamento comercial resultante da interpretação e aplicação dadas pelo Tribunal a quo aos preceitos legais em questão constitui uma limitação absolutamente anómala e injustificada do direito de propriedade da Recorrente, traduzindo-se numa orientação jurídico-legal que trata as partes contratuais em causa de forma profundamente desigual e injusta.
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Ou seja, a interpretação e aplicação dadas pelo Tribunal a quo às normas em questão, contrariam o espirito do sistema legal em que se encontram, maxime a Lei Fundamental.
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E é pois a inconstitucionalidade dos referidos preceitos da Lei Civil, resultante da interpretação e aplicação perfilhadas pelo Tribunal a quo no caso concreto, que se pretende ver apreciada em sede de Recurso no Tribunal...
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