Acórdão nº 630/05 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução15 de Novembro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 630/2005

Processo n.º 967/04

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – O Sindicato A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), requerendo a fiscalização concreta da constitucionalidade da norma do artigo 43.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 215-B/75, de 30 de Abril, quando interpretada no sentido de consentir a imposição, por via estatutária, de “quoruns” constitutivos superiores ou mais qualificados do que o previsto nesse preceito, por violação do disposto no artigo 55.º, n.º 2, alínea c) e n.º 3, da Constituição.

2 – Resulta dos autos que:

2.1 – Os ora recorridos, B., C. e D., intentaram, nos termos do disposto no artigo 164.º e ss. do Código de Processo do Trabalho (CPT), uma acção de declaração de nulidade de deliberação da Assembleia Geral contra o Sindicato A., pedindo que o tribunal declarasse a nulidade da deliberação que aprovou a alteração dos estatutos desse sindicato, alegando, inter alia, que, na referida Assembleia Geral, não participou o número necessário de associados para que a mesma pudesse deliberar, que não houve discussão e que a proposta não foi aprovada por três quartos dos votantes.

O Réu – ora Recorrente – contestou a acção alegando, entre o mais, que os estatutos não exigem a participação de um número mínimo de associados na votação.

2.2 – A acção foi julgada improcedente, tendo o Tribunal da Relação, em recurso, confirmado a sentença recorrida.

2.3 – Inconformados, os Autores interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído as suas alegações dizendo que:

“1.ª O art. 18.º dos Estatutos do R. impõe que participe ou esteja presente à Assembleia Geral uma maioria simples de associados (ou seja, metade dos associados mais um, pelo menos) para que possa validamente ser deliberada a alteração dos mesmos Estatutos).

2.ª A participação da maioria simples dos associados é exigida quer para a discussão, quer para a deliberação sobre as matérias a que se refere o n.º 1 do art.º 15.

3.ª Tendo o Sindicato 8.555 associados em pleno gozo dos seus direitos sindicais, teriam de ter participado e estado na Assembleia Geral pelo menos 4.278 (maioria simples dos associados do R.) e teria a deliberação de ter sido tomada igualmente com os votos favoráveis da maioria simples dos votantes.

4.ª A Assembleia Geral foi apenas uma, efectuada em sessões simultâneas, por vários pontos do país: realizou-se em 6 de Junho de 2002, tendo sido convocada em 24 de Abril do mesmo ano pelo Presidente da Mesa.

5.ª Estas sessões de esclarecimento não podem ser havidas como Assembleia Geral, delas não foram sequer lavradas actas nem foram registadas ou apuradas as presenças dos sócios às mesmas, e respectivos números. E nem sequer nelas participou, também, a maioria simples dos associados do R.

6.ª O funcionamento da Assembleia Geral e o processo de alteração dos Estatutos do R. encontra-se regulado nos próprios Estatutos, com base no disposto nas als. D) e g) do artigo 14 do DL n.º 215-B/75.

7.º Tendo apenas participado e estado presentes à Assembleia Geral 1.105 sócios, número este muito inferior à maioria simples dos sócios do Sindicato, a deliberação é nula e anulável.

8.º Ao decidir em sentido inverso, violou o acórdão recorrido o disposto no art. 177.º do Código Civil, aplicável por força do disposto no art. 46.º do DL n.º 215-B/75, bem como o disposto no art. 14.º deste último e o disposto no art. 18.º, dos Estatutos do R., designadamente no seu n.º 8”.

2.3 – Por sua vez, o Sindicato A. contra-alegou sustentando que:

“1º A deliberação impugnada foi tomada na sequência da participação da universalidade dos associados do Sindicato recorrido na discussão e deliberação das matérias sujeitas àquela deliberação.

  1. Os factos assentes na causa e que os recorrentes não questionam são eloquentes quanto à participação de todos os associados na discussão e deliberação das alterações estatutárias em causa.

  2. Os recorrentes perfilham um conceito naturalístico e não jurídico de assembleia geral, desconforme de resto, com o que resulta do nº 8 do art. 18º dos Estatutos do Sindicato recorrido.

  3. Para os recorrentes, a participação na discussão e deliberação a que o citado dispositivo estatutário alude (e para o que exige a maioria relativa de associados) só pode ter lugar, num mesmo momento e local, com a presença física desse número mínimo de associados, todos eles à vista de todos.

  4. O que é completamente absurdo porquanto, nessa esteira de raciocínio, os votos expressos por correspondência (que o nº 12 do art. 18º dos Estatutos frontalmente permite) jamais poderiam ser contabilizados para preenchimento do "quorum" participativo em virtude de esses associados votantes não se encontrarem fisicamente presentes no local e momento da reunião para aí (e só aí) debaterem e discutirem as matérias objecto de deliberação.

  5. E, assim, cair-se-ia no absurdo de se considerar inválidas deliberações tomadas em reunião onde, para discussão e deliberação das matérias a decidir, fisicamente comparecesse, apenas, metade (mas não a maioria relativa) dos associados do Sindicato pela singela razão de se concluir, como fariam os recorrentes, que os associados que votaram por correspondência não participaram, afinal, na assembleia geral;

  6. E, no reverso da medalha, seriam também inválidas as deliberações tomadas em reunião onde, para discussão e deliberação das matérias a decidir, fisicamente comparecesse fisicamente a totalidade dos associados (que assim participariam indiscutivelmente na discussão e na deliberação) se a maioria relativa deles optasse pura e simplesmente por não votar.

  7. Participação na discussão e na deliberação, por um lado, e voto, por outro lado, não se confundem, nem têm de ocorrer, uma e outro, na mesma reunião física de associados.

  8. No caso vertente e como está factualmente assente, a participação dos associados do Sindicato recorrido na discussão e deliberação das matérias objecto de deliberação abrangeu-os a todos, sem excepção e em termos universais.

  9. Ficando incólume o dispositivo do proémio do nº 8 do art. 18º dos Estatutos.

  10. E, por outro lado, agora no âmbito de aplicação do segmento final do mesmo dispositivo estatutário, os votos que conduziram à deliberação impugnada representam a maioria simples dos votantes.

  11. Nessa conformidade e observados como ficaram os requisitos impostos pelo nº 8 do art. 18º dos Estatutos, quer quanto à expressão relativa da participação dos associados na discussão e deliberação das matérias sujeitas a deliberação (que, como os autos documentam, foi total e universal), quer quanto à expressão relativa dos votos favoráveis à tomada da deliberação impugnada, esta é plenamente válida e eficaz.

  12. O douto acórdão recorrido fez exemplar e irrepreensível aplicação da lei, dos Estatutos em causa e de imperativos elementares de justiça”.

2.4 – O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 27 de Maio de 2004, tirado por maioria, concedeu provimento à revista e anulou a deliberação que havia aprovado a alteração dos Estatutos do R.

Consta dos fundamentos decisórios do acórdão que:

«(...)

Neste momento, os A.A. apenas fundamentam a invalidade da deliberação da Assembleia Geral do R. na não participação na mesma do número mínimo de associados exigido pelo nº 8 do art. 18º dos Estatutos do R..

O nº 8 do citado art. 18º dos Estatutos dispõe: "Para efeitos de discussão e deliberação sobre as matérias a que se refere o nº 1 do art. 15º, basta a participação da maioria simples dos associados, devendo as deliberações ser tomadas igualmente por maioria simples dos votantes".

Pretendem os A.A. que o preceito em análise exige a participação duma maioria simples dos associados na Assembleia Geral para a discussão e deliberação de alterações ao Estatuto.

Entendem os A.A. que os Estatutos exigem um quorum constitutivo para que a Assembleia delibere em matéria de alteração dos próprios estatutos.

Esta exigência decorre da letra da norma e do seu espírito. O nº 5 do referido art. 18º diz: " As deliberações são tomadas por maioria simples dos associados presentes ou representados, salvo nos casos em que estatutariamente se exija maioria qualificada". Se no nº 10 se exige a maioria simples dos associados é porque se trata de uma situação diferente, que foge à regra da maioria simples dos associados presentes.

Também o nº 10 do mesmo preceito, ao referir: "As reuniões da Assembleia Geral funcionarão à hora marcada com a presença da maioria dos associados ou passada meia hora com qualquer número de sócios, ressalvado o disposto nos números anteriores" (que são precisamente os nºs 8 e 9), permite concluir a fixação de quorum constitutivo para o funcionamento da Assembleia com legitimidade para deliberar sobre alterações aos estatutos ou fusão ou dissolução do Sindicato.

Também o verbo usado na redacção daquele nº 8 "basta a participação" indicia a exigência de uma maioria, de um quorum constitutivo, ainda que menos amplo que os estabelecidos no nº 3 do art. 15º e no nº 9 do art. 18º, dos Estatutos.

Igualmente a epígrafe do art. 18º, "Funcionamento da Assembleia Geral", aponta no sentido do quorum constitutivo exigido pelo seu nº 8.

Definido que os estatutos exigem a participação duma maioria simples dos associados para que a Assembleia Geral possa deliberar sobre alterações aos Estatutos, vejamos se foi dado cumprimento a tal exigência.

Uma vez que os Estatutos permitem que a Assembleia Geral funcione em sessões simultâneas realizadas em locais geográficos diferentes, o que ocorreu neste caso, é de todo razoável aceitar que a discussão das propostas se tenha feito validamente através do seu envio atempado aos associados, com a possibilidade destes sugerirem alterações, complementado com sessões de esclarecimento realizadas em diversos pontos do país, em datas e locais previamente...

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