Acórdão nº 212/05 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Abril de 2005

Data20 Abril 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 212/05 Processo n.º 797/04 1.ª Secção Relatora: Conselheira Maria João Antunes

Acordam na 1.ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos de recurso, interposto ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), em que é recorrente A. e recorrida a Fazenda Pública, pretende o recorrente seja apreciada pelo Tribunal Constitucional a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 53º, nº 5, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), aprovado pelo Decreto-Lei nº 442-A/88, de 30 de Novembro. Sustenta que esta viola os artigos 103º e 104º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e põe em causa os princípios constitucionais da igualdade, da progressividade, da justiça, da generalidade, da capacidade contributiva, da tributação pelo rendimento líquido e ainda o princípio da segurança jurídica na modalidade da tutela da confiança.

    2. O ora recorrente impugnou junto do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa o acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), sustentando desde logo a inconstitucionalidade do referido normativo. Naquele Tribunal foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a impugnação, confirmando o acto administrativo-tributário objecto do processo. Interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, em cujas alegações é reiterado o juízo de inconstitucionalidade, veio este Superior Tribunal a negar provimento ao mesmo, por acórdão de 8 de Junho de 2004, no qual, para além do mais, concluiu pela conformidade do preceito à Constituição.

      No que concerne à questão de constitucionalidade, é o seguinte o teor da decisão recorrida (lavrada por remissão para anterior acórdão do Supremo Tribunal Administrativo):

      “Quanto ao artigo 53° do CIRS, que é a norma acusada de inconstitucionalidade material, dispunha, originariamente (tinha, então, o número 51º), que «as pensões de valor anual igual ou inferior a 400.000$00 são deduzidas pela totalidade do seu quantitativo»; e que «a dedução relativa às pensões de valor anual superior ao referido (...) é igual àquele montante acrescido de metade da parte que o excede, até ao montante de 1.000.000$00».

      Sucessivas alterações foram sendo introduzidas na norma ao longo do tempo, até se chegar à versão que aqui nos importa, dispondo o n° 5 do artigo que «para rendimentos anuais, por titular, de valor anual superior ao vencimento base anualizado do cargo de primeiro-ministro, a dedução é igual ao valor referido nos nºs 1 ou 3 , consoante os casos, abatido, até à sua concorrência, da parte que excede aquele vencimento».

      Assim, por força desta norma, e porque o agregado do recorrente obteve, em 2001, um rendimento proveniente de pensões no montante de 104.155,77 €, a dedução específica se quedou em 383,77€.

      Ora, diz o recorrente, a dedução assim limitada (ou, até, em certos e hipotéticos casos, excluída), aos rendimentos provenientes de pensões, contradiz o n° 1 do artigo 53° (que manda deduzir a totalidade dos rendimentos com esta origem, até certo montante destas ), provoca uma desigualdade fiscal horizontal, tornando incoerente o sistema, e violando os princípios já apontados, além do da segurança jurídica, na modalidade do princípio da confiança.

      O recorrente exprobra a sentença impugnada por não ter apreciado a compatibilidade do nº 5 do artigo 53°do CIRS com aqueles princípios constitucionais.

      Mas parece evidente, pelo teor das suas alegações, que a não pretende acusar de nulidade por omissão de pronúncia, querendo, antes, apontar-lhe erro de julgamento, ao não ter reconhecido no acto impugnado os vícios de violação de lei que lhe assaca.

      Na verdade, a sentença não deixou de apreciar, e com detalhe, todas as questões que o impugnante havia submetido ao Tribunal. E, a nosso ver, fê-lo de forma convincente, argumentando de modo a contrariar, eficientemente, as teses defendidas pelo recorrente. Não desdenhamos, por isso, aderir ao que em tal sentença se escreveu.

      Não obstante, cuidaremos de analisar, destacadamente, os argumentos do recorrente, procurando apreciá-los face a cada um dos princípios constitucionais cujo atropelo é invocado, sendo certo que tal não poderá cumprir-se integralmente, já que esses princípios, alguns deles emanação de outros, ou seu desdobramento, ou meros corolários deles, nem sempre são separadamente consideráveis, e as razões que valem para um coincidem com as que aproveitam a outro.

      3.2. Sabe-se que os rendimentos auferidos a título de pensões não eram, antes do CIRS, tributados em qualquer cédula parcelar, relevando, só, em sede de imposto complementar.

      Essa, reconhecidamente, a razão por que o legislador do CIRS se preocupou com aligeirar o impacto da tributação que pela primeira vez introduzia, estabelecendo um regime próprio, favorável, de dedução específica para os rendimentos oriundos de pensões.

      Assim, na versão original do CIRS, os rendimentos do trabalho dependente, por exemplo, gozavam de uma dedução específica de 65% do seu valor, com o limite de 250.000$00, ou com o limite das contribuições obrigatórias para a protecção social, se superior. Enquanto que aos rendimentos oriundos de pensões, se não superiores a 400.000$00, deduzia-se a totalidade, e aos superiores a esse montante eram deduzidos os mesmos 400.000$00, mas acrescidos de metade do excedente, com o limite de 1.000.000$00.

      Porém, este tratamento benevolente dado aos rendimentos provenientes de pensões não correspondia a qualquer imperativo constitucional, que exigisse ao legislador ordinário o emprego de mais suaves maneiras face a rendimentos com aquela origem, do que as usadas perante rendimentos de outra qualquer fonte.

      Tratou-se, apenas, de uma opção do legislador ordinário, visando, como se disse já, reduzir o sobressalto resultante da introdução da tributação sobe rendimentos com esta origem.

      Ora, se a especial atenção que ao legislador de 1988 mereceram os rendimentos provenientes de pensões, no tocante à dedução específica, não é o resultado de algum ditame constitucional, também não é a Constituição que obsta a que o legislador ordinário adopte, adiante, opções diferentes, designadamente, deixando de dar àqueles rendimentos tratamento preferencial, designadamente, no que concerne à dedução específica a atender .

      3.3. As deduções específicas, como a própria designação aponta, são consagradas pelo legislador tendo em atenção a sua afinidade com o rendimento a que correspondem.

      Dito de outro modo, através da dedução específica visa-se considerar, excluindoas da tributação, as despesas que, ao menos presumivelmente, o titular do rendimento se viu obrigado a fazer para o obter.

      Assim se concretiza o princípio do rendimento líquido, que manda tributar, não todo o rendimento, mas só aquele que resta depois de satisfeitos os encargos indispensáveis para o conseguir .

      Mas, precisamente para que se respeite o princípio do rendimento líquido, não há que estabelecer deduções específicas iguais para todos os rendimentos, independentemente da sua origem, pois não são necessariamente equivalentes as despesas a fazer para os angariar. [Idealmente, a dedução específica deve coincidir com as despesas que o sujeito passivo comprove, e só assim não será pela difícil praticabilidade de uma tal solução]. Por exemplo, a regra é que os trabalhadores por conta de outrem suportem menos encargos para obter o rendimento do seu trabalho do que os trabalhadores por conta própria, pois no caso daqueles grande parte dos gastos será feita pela entidade empregadora, enquanto que os trabalhadores independentes os suportarão sozinhos. Por isso, tem-se entendido que a dedução específica, no caso dos rendimentos do trabalho por conta própria, merece ser superior à que está fixada para os rendimentos provenientes do trabalho assalariado, o que não ofende nenhum princípio constitucional.

      Ora, no caso dos rendimentos provenientes de pensões, não se vislumbra a que despesas dê, necessariamente, lugar a sua obtenção. Ao menos, essas despesas, a

      existirem, sempre serão diminutas, face àquelas que há que fazer para granjear rendimentos da maioria das categorias sobre que incide o IRS.

      Nesta perspectiva, bem pode dizer-se que a consagração de uma dedução específica atinente aos rendimentos com origem em pensões é, antes, um tratamento...

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