Acórdão nº 145/05 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Março de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Helena Brito
Data da Resolução16 de Março de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 145/05

Processo n.º 541/04 1.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria Helena Brito

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. Nuns autos de expropriação por utilidade pública em que era expropriante o ICOR – Instituto para a Construção Rodoviária e expropriados A. e mulher e outros, interpuseram estes, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, recurso da decisão arbitral que, classificando a parcela expropriada como “solo apto para outros fins”, lhes fixara a indemnização em 2.677.000$00. No recurso pediram que lhes fosse atribuída uma indemnização de € 120.500,00, acrescida da correcção monetária entre o momento da fixação do valor da indemnização e o momento do pagamento da mesma (fls. 171 e seguintes).

    Na resposta ao recurso (fls. 216 e seguintes), o ICOR – Instituto para a Construção Rodoviária pronunciou-se no sentido da manutenção da decisão arbitral, tendo concluído do seguinte modo:

    “[...]

    2° A parcela expropriada deve ser classificada como «solo apto para outros fins».

    3° A avaliação de um terreno deve atender à real aptidão deste, demonstrada pelas suas características objectivas e não se socorrer a engenhosos artifícios de cálculo para atingir um valor de indemnização conveniente mas perfeitamente desajustado da realidade, conforme técnica usada pelos expropriados.

    4° Para o solo de um prédio ser considerado como apto para construção, é necessário que se encontrem integralmente preenchidos, à data da publicação da DUP, os requisitos constantes em alguma das 4 alíneas do art. 25º, n.º 2 da Lei 168/99, de 18 de Setembro.

    5° Cumulativamente tem de ficar demonstrado que o solo dispunha efectivamente de potencialidade para construção.

    6º Nesse sentido pronunciou-se o Tribunal Constitucional, no seu acórdão n.º 194/97 [...] em que decidiu que as normas das diferentes alíneas do art. 24º, n.º 2, do CE/91, que definiam os terrenos com vocação edificativa para efeitos de indemnização por expropriação, de acordo com um critério concreto de potencialidade edificativa – e não com base num critério abstracto de aptidão edificatória – não eram inconstitucionais, pois não violavam o direito à justa indemnização por expropriação nem o princípio da igualdade.

    [...]

    8º Isto mesmo sublinhou Fernando Alves Correia [...], ao escrever que o legislador, ao definir solo apto para construção, não adoptou «um critério abstracto de aptidão edificatória já que, abstracta ou teoricamente, todo o solo, incluído o integrado em prédios rústicos, é passível de edificação –, mas antes um critério concreto de potencialidade edificativa».

    [...]

    10º O prédio objecto de expropriação não confronta com via pública pavimentada susceptível de servir edificações.

    11º Não possuía as infra-estruturas urbanísticas necessárias para servir edificações, nomeadamente rede de abastecimento de água, rede de energia eléctrica e de saneamento.

    12º A inserção do prédio no perímetro urbano de Braga não lhe confere qualquer capacidade construtiva. A limitação deste perímetro relaciona-se com a zona de actuação dos Transportes Urbanos de Braga (TUB), que por sinal não servem o prédio.

    13º Contudo o prédio em causa não é servido por transportes públicos, uma vez que esta propriedade é desprovida de acessos, apresentado somente serventias agrícolas.

    14° O órgão de gestão territorial, em vigor à data da Declaração de Utilidade Publica, classifica a área da parcela a expropriar, nas suas cartas de ordenamento e de condicionantes, como inserido em Espaço Canal, em zona de Reserva Agrícola Nacional.

    15° O posterior PDM mantém a mesma classificação que o PDM anterior, ou seja, Reserva Agrícola Nacional (RAN).

    [...]

    24° Quanto à classificação do solo de parcelas integradas na RAN, já se pronunciou o Tribunal Constitucional por 3 vezes, através dos seus acórdãos 20/2000 de 11/01 referente ao processo n.º 209/98 (2ª Secção); 247/2000 de 12/04 referente ao processo 233/99 (2ª secção) e 243/2001 referente ao processo 15/2001 (3ª secção).

    25° Nestes acórdãos o Tribunal Constitucional considerou que parcela que faça parte integrante da RAN deve ser avaliada como solo apto para outros fins, visto que jamais os expropriados poderiam nela construir e que não é inconstitucional, nem viola os princípios da justiça e da proporcionalidade, a interpretação do art.º 24/5 do CE/91 no sentido de excluir da classificação de solos aptos para construção os solos integrados na RAN e expropriados para a implementação de vias de comunicação.

    26° Neles o TC defendeu que os princípios constitucionais da justa indemnização e da igualdade são afectados apenas quando se exclui da classificação de «solo apto para construção» parcela de terreno integrado na RAN e que, com vista à satisfação do fim determinante da expropriação, é dela desafectado e que é destinado pela expropriante à implantação de edificação mas já não quando a expropriação (com indemnização como «solo para outros fins») não visa a construção de prédios urbanos mas sim a construção de via de comunicação.

    [...]

    33º Pelo exposto deve ser classificado o solo da parcela expropriada como «para outros fins», não devendo o montante da justa indemnização ser superior ao constante na decisão arbitral.

    [...].”

  2. Efectuou-se a avaliação legalmente exigida, tendo o laudo dos peritos designados pelo tribunal e pelos expropriados classificado o solo como “apto para construção” e fixado o montante indemnizatório em € 42.635,74 (fls. 291 a 295), enquanto o laudo do perito designado pela expropriante classificou o solo como “apto para outros fins” e propôs a indemnização de € 20.648,00 (fls. 284 a 287).

    O IEP – Instituto das Estradas de Portugal (que sucedeu ao ICOR – Instituto para a Construção Rodoviária) deduziu reclamação contra o laudo de peritagem apresentado pelos peritos designados pelo tribunal e pelos expropriados (fls. 305 a 307).

    Na sequência de tal reclamação, foi elaborado laudo complementar, “considerando a parcela como solo «para outros fins»”, em que se fixou a indemnização em € 19.328,77 (fls. 319 a 322).

    Foram ainda produzidas alegações: o IEP – Instituto das Estradas de Portugal sustentou, entre o mais, que “o justo valor da indemnização [a atribuir aos expropriados] não deve ser superior ao valor constante no laudo complementar dos senhores peritos que avaliam o solo expropriado como «para outros fins», ou seja, € 19.328,77” (fls. 328 e seguintes); os expropriados concluíram que “estamos perante solo apto para construção” e que o valor do terreno é o que resulta do primeiro laudo dos peritos designados pelo tribunal e pelos expropriados, ou seja, € 42.635,74 (fls. 337 e seguintes).

  3. Por sentença de 3 de Outubro de 2003, o juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Braga julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelos expropriados, fixando a indemnização a atribuir aos expropriados em € 19.328,77, actualizado nos termos do artigo 24º do Código das Expropriações (fls. 340 e seguintes).

    Lê-se na sentença do Tribunal de Braga, para o que aqui importa considerar:

    “[...]

    No caso em apreço, verifica-se que de acordo com o Plano Director Municipal em vigor à data da Declaração de Utilidade Pública, a parcela em causa insere-se em área classificada como «espaço canal» e limitada por solos da RAN, não é servida por acesso rodoviário pavimentado, rede de abastecimento de água, energia eléctrica e saneamento, situando-se a mesma no perímetro urbano da cidade de Braga e a cerca de 100 metros de espaços urbanizáveis.

    Face aos elementos objectivos coligidos nos autos, e visto o disposto no art. 25° do CE, a classificação do terreno expropriado não pode ser outra senão como solo apto para outros fins, já que não preenche os requisitos exigidos no n.° 2 desta norma para ser classificado como apto para a construção.

    Na verdade, a parcela em causa não é dotada de qualquer das infraestruturas que permitam o seu enquadramento na al. a) ou b) do citado art. 25°, n.º 2, do C.E.

    Afigura-se-nos, até, que os Srs. Peritos do Tribunal e dos expropriados, uma vez constatada a inverificação de tais requisitos e por forma a poderem classificar o solo como apto para construção, recorreram ao critério estabelecido no n.° 12 do art. 26° do C.E., que a nosso ver ao caso presente não tem aplicação, por em causa não estar um «solo classificado como zona verde, de lazer ou para instalação de infraestruturas e equipamentos públicos».

    [...].”.

  4. Desta sentença interpuseram os expropriados A. e outros recurso de apelação (fls. 353), tendo nas alegações respectivas (fls. 359 e seguintes) formulado as seguintes conclusões:

    “[...]

  5. [...] o terreno expropriado apenas pode [s]er definido como terreno APTO PARA [A] CONSTRUÇÃO – tudo nos termos dos artigos 23º, 25º e 26º do C.E.

  6. Acresce que, nos termos do n.º 12 do artigo 26º do C.E., sempre teríamos de valorar o terreno em causa como Solo Apto [para] a Construção.

  7. Pois o terreno foi adquirido antes da entrada em vigor do plano director Municipal.

  8. Estamos, em CONCLUSÃO, perante SOLO APTO PARA A CONSTRUÇÃO.

  9. O valor do laudo dos Senhores Peritos datado de 31.3.2003 ou seja € 42.653,34 é correcto, com a correcção já definida na douta Sentença.

    [...].”.

    Nas contra-alegações (fls. 365 e seguintes), sustentou o expropriante que a sentença recorrida devia ser mantida, apresentando, entre outras, as seguintes conclusões:

    “[...]

    1. [...] não foi produzida prova que mostrasse ser de aplicar o artigo 26º, n.º 12 do C.E.

    2. Antes pelo contrário pois ficou provado que o solo em causa não preenche nenhuma das alíneas do artigo 25º/2 do C.E.

    3. Além disso, o artigo 26º/12 não tem como intuito conferir aptidão edificatória a solos que não possuem qualquer possibilidade de edificar.

    4. Esta norma apenas diz respeito a solos previamente classificados como aptos para construção, conforme se pode constatar pelo próprio título do art. 26º.

    5. Não podendo o solo da parcela expropriada ter classificação diversa da de «para outros fins», conforme os argumentos supra aduzidos...

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