Acórdão nº 577/06 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Outubro de 2006

Data18 Outubro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 577/2006 Processo n.º 1055/05 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.O presente recurso de constitucionalidade foi interposto pelo representante do Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho de Bragança, ao abrigo dos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.º 3 da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional, da decisão do Juiz do Tribunal do Trabalho de Bragança de 25 de Novembro de 2005, que, no âmbito do processo por acidente de trabalho n.º 99/1960 – no qual figura como sinistrado A., como beneficiária da pensão B. (mãe), e como entidade responsável a Companhia de Seguros C., S.A. –, julgou inconstitucional a norma do artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, por entender que essa norma, quando interpretada no sentido de prever uma remição obrigatória total, isto é, independentemente da vontade do titular, de pensões atribuídas por incapacidades parciais permanentes superiores a 30% ou por morte, viola o princípio da justa reparação dos danos emergentes de acidentes laborais, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa. Tal decisão tem o seguinte teor:

    (…)

    2. Nos termos dos artigos 33.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, e 56.°, n.º 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, aplicável às pensões resultantes de acidentes ocorridos antes da sua entrada em vigor, por força do disposto no artigos 41.º, n.º 2, alínea a), da Lei, passaram a ser obrigatoriamente remíveis as pensões anuais devidas a sinistrados e a beneficiários legais de pensões vitalícias que não sejam superiores a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão e as devidas a sinistrados, independentemente do valor da pensão anual, por incapacidade permanente e parcial inferior a 30%.

    Alinhamos com a posição expressa no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de Julho de 2004 (n.º convencional JSTJ000, in http://www.dgsi.pt), no sentido de que a data da fixação da pensão não pode ser entendida como a data da decisão judicial que a fixou, mas antes a data a partir da qual a pensão é devida. Esta tese não colide, salvo melhor entendimento, com a uniformização de jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão n.º 4/2005, publicado no Diário da República, I Série-A, de 2 de Maio de 2005.

    Ora, a pensão em causa é devida à beneficiária desde 16/11/1960. Por sua vez, o seu valor inicial era de 826$00 (€ 4,12), ou seja, era inferior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada estabelecida pela primeira vez pelo Decreto-Lei n.º 217/74, de 27/05, que era de 3.300$00 (€ 13,64).

    Estariam, pois, à partida, reunidos os pressupostos necessários à remição obrigatória da pensão.

    3. Contudo, tal como vem sendo entendido pelo Tribunal Constitucional relativamente às pensões emergentes de incapacidades parciais permanentes superiores a 30%, também no caso de pensões vitalícias por morte devidas aos beneficiários legais, as normas dos artigos 56.º, n.º 1, alínea a), e 74.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, estão feridas de inconstitucionalidade por violação do direito à justa reparação por acidente de trabalho ou doença profissional, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição, quando interpretadas no sentido de imporem a remição obrigatória total dessas pensões vitalícias, independentemente da vontade do pensionista.

    Transcreve-se, por elucidativa, parte da fundamentação do Acórdão n.º 56/2005 do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República, II Série, n.º 44, de 3 de Maio de 2005, doutamente relatado pelo Ex.mo Conselheiro Paulo Mota Pinto, no qual se apreciou a inconstitucionalidade material do citado artigo 74.º do Decreto-Lei n.º 143/99, quando interpretado no sentido de abranger no conceito de pensões de reduzido montante todas as pensões infortunísticas laborais, incluindo nelas as situações de total ou elevada incapacidade permanente:

    5. No Acórdão n.º 379/2002 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 54.º, págs. 313-321) escreveu-se, a propósito, então, do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99, que a ‘filosofia subjacente’ à remição obrigatória de pensões prevista no seu n.º 1, segundo dois diferentes critérios – o do montante diminuto da pensão, segundo a alínea a), e o do grau de incapacidade laboral, nos termos da alínea b) – e à remição facultativa de pensões, prevista no seu n.º 2, era:

    ‘[...] a de permitir que a compensação correspondente à pensão fixada ao trabalhador vítima de acidente de trabalho ou de doença profissional, não impeditivos de posterior exercício da sua actividade, possa converter-se em capital e, assim, ser aplicada porventura de modo mais rentável do que a permitida pela mera percepção de uma renda anual.

    Se a via que o legislador encontrou é válida perante uma incapacidade diminuta, a que corresponda montante de pensão reduzido, já não o será em casos de maior gravidade, de modo a colocar, porventura, em causa, dada a álea inerente, a aplicação do capital. Daí o não se aceitar que, nos casos de incapacidade de trabalho fixada em maior percentagem, com natural repercussão no montante da pensão, se estabeleça uma limitação ao poder de o trabalhador pedir ou não a remição, reflectida na obrigatoriedade de a esta se proceder.’

    Tal interpretação da teleologia das normas é corroborada pela salvaguarda, no n.º 2 do artigo 33.° da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, de um limite máximo à remição parcial em situações de ‘incapacidade igual ou superior a 30%’ (‘desde que a pensão sobrante seja igual ou superior a 50% do valor da remuneração mínima mensal garantida mais elevada’), e pela inexistência de previsão de ‘um capital de remição’, no artigo 17.° da Lei n.º 100/97, para situações em que a incapacidade fosse superior a 30%. (...).

    Em todo o caso, o argumento mais relevante apresentado pela decisão recorrida contra a conformidade constitucional da norma do artigo 74.° do Decreto-Lei n.º 143/99 (na redacção dada pelo artigo 2.° do Decreto-Lei n.º 382-A/99, e na interpretação que foi efectuada pela decisão recorrida, que o Tribunal Constitucional tem de aceitar como um dado no presente recurso) foi, justamente, o dos limites à teleologia da remição: nesses casos de incapacidade elevada, ‘só a subsistência de uma pensão vitalícia poderá precaver o sinistrado contra o destino, eventualmente aleatório, do capital resultante da remição obrigatória, em casos como o sub judice’.

    Neste ponto, a decisão recorrida foi também ao encontro da ponderação reiterada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 302/99 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 43.º, págs. 597-603), no qual se pode ler:

    “O estabelecimento de pensões por incapacidade tem em vista a compensação pela perda da capacidade de trabalho dos trabalhadores devida a infortúnios de que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT