Acórdão nº 517/06 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Setembro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução26 de Setembro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 517/2006

Processo n.º 785/97

  1. Secção

Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. A., maior, solteira, propôs no Tribunal Judicial de Viana do Castelo contra o CENTRO NACIONAL DE PENSÕES uma acção destinada a que o réu fosse condenado a “reconhecer à autora o estado de cônjuge equiparado para os efeitos do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro, bem como a pagar-lhe as pensões de sobrevivência a que tem direito nessa qualidade, incluindo as que se vencerem desde a morte do falecido (...)”.

    Para o efeito, alegou ter vivido com B., pensionista do réu, em condições análogas às dos cônjuges desde “princípios de 1965” e – referindo-se aos requisitos previstos no artigo 2020º do Código Civil, no artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de Outubro e no Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro – afirmou necessitar da pensão por não ter rendimentos suficientes para uma existência condigna e não poder propor a acção exigida pelo n.º 1 do artigo 3º do referido Decreto Regulamentar porque o falecido “não tinha, à data da sua morte, quaisquer bens ou rendimentos, ou qualquer herança nem, tão pouco, qualquer pessoa de família”.

    Por sentença de 7 de Outubro de 1996 – fls. 38 – o réu foi absolvido da instância, por ineptidão da petição inicial, com fundamento na falta de causa de pedir por não alegação de “quaisquer factos tendentes a mostrar que não existem as pessoas mencionadas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 2009º [do Código Civil] ou que existem mas não têm possibilidades económicas de prestar alimentos à autora”.

    Inconformada, a autora recorreu para a Relação do Porto. Por acórdão de 25 de Fevereiro de 1997, a fls. 42, a sentença foi revogada e a acção foi julgada improcedente. A Relação considerou que a insuficiente alegação de factos, medida à luz dos requisitos constantes dos preceitos legais acima indicados, conduzia à improcedência da acção e não à ineptidão da petição inicial.

    De novo inconformada, a autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, suscitando, tal como fizera sem êxito perante a Relação do Porto, a inconstitucionalidade das normas contidas no artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 e nos artigos 2º e 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94.

    O Supremo Tribunal de Justiça confirmou, porém, a decisão de improcedência da acção.

  2. A. recorreu então para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), pretendendo a apreciação das normas do “artigo 3º n.º 1 do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro e do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de Outubro” por violação das “normas contidas nos artigos 13º, 63º, 67º e 115º da Constituição da República”.

    Notificada para o efeito, a recorrente concluiu da seguinte forma a sua alegação:

  3. Os cônjuges sobrevivos têm direito a pensão de sobrevivência nos termos do disposto no DL 322/90 de 18/10.

  4. Estes, para obter tal pensão, não têm de provar a necessidade de tal pensão, nem, tão pouco, de propor acção contra a herança do falecido ou familiares para obter alimentos.

  5. O “cônjuge sobrevivo” de facto, face ao disposto no art. 3º do DL 322/90 de 18/10, também tem direito à pensão de sobrevivência.

  6. O legislador, através dessa norma, apenas exige ao “cônjuge” de facto que proponha acção para fazer prova de que viveu durante mais de dois anos consecutivos, antes da morte do/a companheiro/a.

  7. A interpretação que os Tribunais de Instância e o STJ fizeram da norma do art. 8º n.º1 do DL 322/90 é inconstitucional por violar o art. 13º, 63º n.º 1 e 3 e 67º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

  8. O Governo ao regulamentar o art. 8º do DL 322/90 de 18/10, através do art. 3º do Dec. Reg.1/94 de 18/01, excede em exigências o que aquela norma estabelece.

  9. Um decreto regulamentar não pode exigir mais do que a lei regulamentada.

  10. Por isso, o art. 3º n.º1 do Dec. Reg 1/94, é inconstitucional por violar o art. 115º da Constituição da República Portuguesa.

    O recorrido não alegou.

  11. Cumpre decidir.

    É o seguinte o texto da norma do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de Outubro:

    Artigo 8º

    Situação de facto análoga à dos cônjuges

    1 – O direito às prestações previstas neste diploma e o respectivo regime jurídico são tornados extensivos às pessoas que se encontrem na situação prevista no n.º 1 do artigo 2020º do Código Civil.

    2 – O processo de prova das situações a que se refere o n.º 1, bem como a definição das condições de atribuição das prestações, consta de decreto regulamentar.

    Por seu turno, o artigo 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro, a que se refere o artigo 8º n.º 2 que se acaba de citar, tem o seguinte texto:

    Artigo 3º

    Condições de atribuição

    1 – A atribuição das prestações às pessoas referidas no artigo 2º fica dependente de sentença judicial que lhes reconheça o direito a alimentos da herança do falecido nos termos do disposto no artigo 2020º do Código Civil.

    2 – No caso de não ser reconhecido tal direito, com fundamento na inexistência ou insuficiência de bens da herança, o direito às prestações depende do reconhecimento judicial da qualidade de titular daquelas, obtido mediante acção declarativa interposta, com essa finalidade, contra a instituição de segurança social competente para a atribuição das mesmas pensões.

    Consiste a presente questão em saber se são ou não inconstitucionais as normas dos artigos 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 e do artigo 3º, n.º 1 (aqui, apenas este n.º 1) do Decreto Regulamentar n.º 1/94 quando interpretadas no sentido de que a atribuição da pensão de sobrevivência (ou, em outros casos, do direito ao subsídio por morte também previsto, nas mesmas condições, pelo Decreto-Lei n.º 322/90) por morte de beneficiário da segurança social a quem com ele convivia em união de facto depende da obtenção de sentença judicial que lhe reconheça o direito a alimentos da herança do falecido nos termos do n.º 1 do artigo 2020º do Código Civil.

    Acontece que o Tribunal Constitucional já teve ocasião de apreciar a questão de constitucionalidade que é colocada no presente recurso. Com efeito, escreveu-se no Acórdão n.º 233/2005 (www.tribunalconstitucional.pt), o seguinte:

    4. (...) no seu Acórdão n.º 195/2003 (Diário da República, II série, de 22 de Maio de 2003), o Tribunal Constitucional decidiu “não julgar inconstitucional a norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90 (...) na parte em que faz depender a atribuição da pensão de sobrevivência por morte do beneficiário da segurança social a quem com ele convivia em união de facto de todos os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 2020º do CC".

    Tal norma – na parte relativa à atribuição de pensões de sobrevivência – foi então apreciada à luz da alegada violação dos direitos tutelados pelo artigo 26º da Constituição e do princípio da igualdade, ao qual foi reconduzido o ultimo dos direitos englobados pelo artigo 26º, que entendeu não violado, e do n.º 1 do artigo 36º, conjugado com o princípio da proporcionalidade.

    No que toca à primeira questão, isto é, à alegada violação do princípio da igualdade pela norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, afirmou-se o seguinte:

    “(...) será que a distinção entre cônjuges (contemplados como titulares do direito às prestações em questão no artigo 7º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 322/90) e pessoas em situação de união de facto, para efeitos de fixação das condições de atribuição da pensão de sobrevivência, requerendo para estas que não possam exigir alimentos aos seus familiares mais próximos, é violadora do princípio da igualdade?

    A perspectiva da...

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