Acórdão nº 443/06 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 443/2006

Processo n.º 340/06

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A., melhor identificado nos autos, reclama, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), da decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso proferida pelo relator.

2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

«1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), tendo o recurso por “fundamento a aplicação de normas jurídicas pelo tribunal a quo em violação do princípio constitucional ne bis in idem, consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da C.R.P., bem como no artigo 54.º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 14.07.1985, no artigo 14.º da Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de New York e na Convenção entre os Estados Membros das Comunidades Europeias relativa à aplicação do Princípio Ne bis in idem, todas parte integrante do direito português, nos termos do artigo 8.º da C.R.P. e do (ii) princípio da legalidade das normas penais consagrado, em termos gerais, no artigo 29.º da C.R.P.

2 – Compulsados os autos, cumpre relatar, com interesse para a decisão do presente recurso, o seguinte:

2.1 – O recorrente, inconformado com a decisão condenatória proferida no Processo Comum n.º 18851/97.0TDLSB da 2.ª Secção das Varas de Competência Mista Cível e Criminal do Funchal, interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, em síntese, argumentou que:

“(…)

  1. Os presentes autos tiveram origem em diligências de investigação levadas a cabo pelo UCLAF em vários países, as quais conduziram às conclusões do relatório de que se juntou cópia como doc. nº 1 ao requerimento do arguido de 4/6/2003, que refere factos criminosos praticados em vários países da União Europeia, relativos sempre a crimes de fraude na obtenção de subsídios.

  2. O mencionado relatório contém, entre outros, os factos pelos quais o arguido vem acusado nos presentes autos, tanto mais que esse relatório, ou excertos desse relatório, se encontram juntos aos presentes autos em diversas línguas desde há muito tempo.

  3. Tal relatório e os factos dele extraídos para os presentes autos, foram já objecto de procedimento criminal contra o arguido no seu país de origem, i. e, em Itália.

  4. De acordo com o art. 50º do cód. proc. pen. italiano, que é uma norma imperativa enquanto derivada do art. 112º da constituição italiana, o Ministério Público (fora daqueles casos em que é necessária queixa particular) está obrigado a proceder criminalmente sempre que conhecer de factos que possam importar a responsabilidade criminal de um agente.

  5. Conforme resulta do art. 9º do cód. pen. italiano, o dever de acção penal da Justiça italiana impõe-se mesmo quanto a factos praticados fora do território italiano desde que o autor dos factos seja cidadão italiano, encontrando-se em território italiano à data da notícia do crime e que a lei italiana preveja para os mesmos pena de prisão perpétua ou pena não inferior a três anos, como é o caso, não tendo podido, pois, o Tribunal italiano sequer ignorar a notícia do crime praticado em Portugal.

  6. Ora, tendo o Tribunal italiano recebido a notícia do crime praticado em Portugal, bem como muitos outros elementos objecto destes autos, conclui-se que a sentença proferida no processo que correu termos no Tribunal de Fermo incidiu sobre os factos que estão agora a ser julgados novamente em Portugal, na medida em que os Tribunais Italianos conheceram e processaram os factos que originaram os presentes autos.

  7. Apesar de os factos comuns ao presente processo criminal não virem especificados na sentença, o que é certo é que foram conhecidos e processados em Itália. Sucedeu, porém, que de acordo com um juízo de mérito feito pela justiça Italiana, tais factos nem à sentença chegaram. Concluir o contrário seria admitir que o art. 50º do cód. proc. pen. italiano derivado do preceito constitucional do art. 112º da constituição italiana, não é uma norma imperativa, o que não se concebe, nem se concede.

  8. De acordo com o artigo 54º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen de 14 de Julho de 1985, publicado no D.R. I SÉRIE – A de 25/11/1993, “aquele que tenha sido definitivamente julgado por um tribunal de uma Parte Contratante não pode, pelos mesmos factos, ser submetido a uma acção judicial intentada por uma outra Parte Contratante, desde que, em caso de condenação, a sanção tenha sido cumprida ou esteja actualmente em curso de execução ou não possa já ser executada, segundo a legislação da Parte Contratante em que a decisão de condenação foi proferida”.

  9. Igual entendimento resulta do nº 7 do art. 14º da Convenção Internacional sobre direitos civis e políticos de New York, de que Portugal é signatário, segundo o qual “no one shall be liable to de tried or punished again for an offence for which he has already been finally convicted or acquitted in accordance with the law and penal procedure of each country”. J) Também na nossa lei ordinária e constitucional encontramos consagração do princípio ne bis in idem.

  10. Assim, tendo já o arguido sido julgado pelos factos dos autos, não o podia ter sido novamente pelos Tribunais Portugueses. M) Do facto de o processo italiano ter tido por base o relatório do UCLAF e as confissões do arguido, que se referem a factos passados em Portugal, resulta provado que o Tribunal Italiano teve a notícia dos crimes cometidos em Portugal, conhecendo-os desde o início do processo.

  11. Semelhante conclusão resulta ainda de inúmeros documentos produzidos em língua portuguesa que se encontram também no processo italiano e cujas cópias foram enviadas para o Tribunal “a quo”.

  12. Alguns desses documentos produzidos em língua portuguesa, são referentes a factos criminosos que estão a ser julgados em Portugal, nestes autos, demonstrando-se, pela sua inclusão no processo italiano, que, relativamente aos factos criminosos passados em Portugal, o Tribunal de Fermo não se bastou com o relatório do UCLAF, tendo obtido mais elementos.

  13. O Tribunala quo preferiu concentrar-se nos factos constantes da sentença do...

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