Acórdão nº 71/06 de Tribunal Constitucional, 25 de Janeiro de 2006

Data25 Janeiro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 71/2006 Processo n.º 12/06 3.ª Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. EP – Estradas de Portugal, E.P.E. reclama do despacho de 10 de Novembro de 2005, do relator do processo no Tribunal da Relação do Porto que não admitiu um recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.

    O recurso não foi admitido, em síntese, por se ter considerado que a questão de inconstitucionalidade não fora suscitada perante o Tribunal da Relação em termos de este estar obrigado a dela conhecer, não sendo momento idóneo as alegações de um recurso de revista interposto da mesma decisão e de que o Supremo Tribunal de Justiça não veio a tomar conhecimento.

    A reclamante sustenta que o recurso deveria ter sido admitido, pelo seguinte:

    “(…)

  2. Ora, salvo o devido respeito, afigura-se à ora impetrante que o recurso para o Tribunal Constitucional deveria ter sido admitido.

  3. Isto porque, nas alegações de recurso de Revista, a questão da nulidade suscitada (que, recorde-se, tem a ver com a falta de fundamentação da decisão judicial ínsita no Acórdão de 28/12/2002) a não ser considerada procedente, incorreria numa interpretação inconstitucional dos artigos 158.º, n.º 1 e 668.º n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil no sentido de que, em processo de expropriação, a remissão para o relatório dos peritos escolhidos pelo Tribunal para o acto de avaliação, decorrente do facto de os mesmos se presumirem credíveis e imparciais, é suficiente para fundamentar a decisão judicial. Ora, no entender da recorrente, tal interpretação está ferida de inconstitucionalidade por violação do disposto no artigo 20.º e no artigo 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

  4. Donde, ao entender sustentar o Acórdão precedente (o de 28/11/2002) quanto à nulidade, o Acórdão de 27 de Março de 2003 decidiu nos precisos termos em que aquele vício tinha sido suscitado, ponderando decerto os precisos termos que foram alegados e constantes das respectivas conclusões.

  5. Ora, a alegação efectuada pela recorrente foi precisamente a afirmação de que a decisão negativa quanto à nulidade suscitada seria tomada com base numa interpretação que feriria de inconstitucionalidade os artigos 158.º, n.º 1 e 668.º, n.º 1, alínea b) do Código Civil, conforme se alcança pela transcrição das Conclusões acima efectuada.

  6. Pelo que, no entender da recorrente, deveria ter sido admitido o recurso do Acórdão sustentador da decisão arguida como nula para o Tribunal Constitucional, ao contrário do que foi decidido pelo despacho de 10 de Novembro de 2005, do qual agora se reclama.

    (…).”

    O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:

    “A presente reclamação é manifestamente improcedente.

    Na verdade, não pode considerar-se suscitada “durante o processo” a questão de constitucionalidade que apenas é colocada, pela primeira vez, no âmbito de um recurso de revista do qual o STJ não vem a tomar conhecimento, por considerar irrecorrível o acórdão da Relação que dirimiu definitivamente a questão do valor da indemnização a arbitrar ao expropriado, inexistindo o conflito jurisprudencial em que se ancorava a interposição do dito recurso de revista.”

  7. Para decisão da reclamação relevam as ocorrências processuais seguintes:

    1. Por acórdão de 28 de Novembro de 2002, o TRP negou provimento a recurso interposto pelo Instituto de Estradas de Portugal (IEP) de sentença do Tribunal Cível do Porto (8ª Vara) que fixara a indemnização devida pela expropriação por utilidade pública de uma parcela de terreno ( parcela n.º 67 da planta cadastral) necessária à construção dos “acessos norte à Ponte do Freixo”;

    2. O IEP interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, em cujas alegações concluiu, além do mais, o seguinte:

      “3.A nulidade do acórdão recorrido

      Entende-se, que salvo o respeito por opinião contrária, que o acórdão recorrido é nulo por vício de falta de fundamentação da decisão a que logrou chegar. Trata-se de invalidade processual incorrida no próprio aresto recorrido, estando, destarte, verificados os pressupostos de admissibilidade do presente recurso - cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 754.º do CPC.

      Na realidade, o aresto recorrido, colocado perante as questões suscitadas pela expropriante na sua apelação, fundamenta essencialmente a sua decisão por remissão para o relatório pericial. Ora, atento o exposto na introdução destas alegações, e que aqui se considera reproduzido, entendemos que se trata de fundamentação manifestamente insuficiente.

      Na verdade, para fixação da indemnização o tribunal deverá atender aos elementos probatórios que constam dos autos, logrando aqui plena aplicação o principio da liberdade da apreciação da prova - cfr. José Osvaldo Gomes, in Expropriações por Utilidade Pública, 1997, Texto Editora, pág.373. Neste sentido, o julgador é instado à produção de uma valoração própria e autónoma, fundada nos critérios constitucionais e legais, e que não pode reconduzir-se a uma simples, mecânica e automática adesão à avaliação efectuada pelos peritos indicados pelo tribunal.

      No exercício da sua actividade valorativa e judicativa, o julgador, para apreciar livremente a prova, há-de socorrer-se da análise dos elementos que constam do processo e das regras da experiência comum, efectuando, assim, uma tarefa de ponderação e contextualização critica dessa mesma prova. Só esta actividade é verdadeiramente judicativa e só ela justifica e fundamenta a intervenção do julgador no processo de cálculo da indemnização justa a atribuir ao expropriado.

      Aliás, de harmonia com o disposto no artigo 158.º CPC “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, e, na decisão a proferir sobre a matéria de facto, o tribunal deve analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador - cfr. artigo 653.º, n.º 2 do CPC. Por outro lado, de acordo com o n.º 1, do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.

      Ora, o aresto recorrido, ao debruçar-se sobre a maioria das conclusões da expropriante, remete para o relatório dos peritos do tribunal em vez de se debruçar directamente sobre os temas e as questões suscitadas.

      É assim com a conclusão 7ª respeitante ao factor de localização e qualidade ambiental, com a conclusão 8ª respeitante à aplicabilidade do n.º 5, do artigo 25° do CE, a conclusão 9ª, respeitante à capacidade construtiva da parcela, a conclusão 10ª, respeitante à percentagem com os custos da construção, com a conclusão 12ª, respeitante ao custo de aquisição da denominada “Casa da …” e ao seu relevo para a definição da indemnização e com a conclusão 13ª, respeitante ao preço de construção por metro quadrado.

      Ou seja, perante as questões ali suscitadas, o douto aresto sob impugnação limitou-se, no essencial, a remeter para o relatório dos três peritos escolhidos pelo tribunal, ao invés de criticar e rebater o mérito das aludidas questões. E o problema conquista particular acuidade quando é certo que o que está essencialmente em causa é a escolha entre dois relatórios - um dos árbitros e o outro dos peritos escolhidos pelo tribunal -, que são elaborados por pessoas provenientes da mesma lista oficial, com a mesma formação e adstritos à observação da mesma realidade de facto e à aplicação dos mesmos critérios. A opção entre um e outro dos relatórios é um acto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT