Acórdão nº 233/07 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução28 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 233/2007 Processo n.º 222/07 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Mário Torres

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

1. A Caixa Geral de Aposentações apresentou reclamação para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra a decisão sumária do relator, de 15 de Janeiro de 2007, que decidiu, no uso da faculdade conferida pelo n.º 1 desse preceito, julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), a norma constante do trecho final do artigo 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho, na parte em que determina que a pensão de sobrevivência a que tenha direito aquele que, no momento da morte do contribuinte, estiver nas condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil, será devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que tal pensão tenha sido requerida, e não – como ocorre, nos termos do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, para o regime geral da segurança social – a partir do início do mês seguinte ao do falecimento do beneficiário, quando requerida nos seis meses posteriores ao trânsito em julgado da sentença que reconheça o respectivo direito; e, consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido, na parte impugnada.

1.1. A decisão sumária reclamada tem a seguinte fundamentação:

“1. A Caixa Geral de Aposentações interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Janeiro de 2007, que negou provimento a recurso de revista por ela interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23 de Fevereiro de 2006, que, por seu turno, negara provimento ao recurso de apelação da sentença da 14.ª Vara Cível de Lisboa, de 11 de Maio de 2005, que julgou procedente a acção intentada por a. contra a ora recorrente, «declarando que a autora está em condições de solicitar à ré uma pensão de sobrevivência por óbito do falecido B., devida a partir do início do mês seguinte ao falecimento de B., se vier a ser requerida à CGA no prazo de seis meses posteriores ao trânsito em julgado da sentença, ou a partir do início do mês seguinte àquele em que a requerer, se for requerida posteriormente».

De acordo com o requerimento de interposição de recurso, «a norma cuja fiscalização concreta de constitucionalidade se pretende é a do n.º 2 do artigo 41.º do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 191-B/76, de 25 de Junho, na interpretação que dela foi feita no douto acórdão do STJ que antecede, que recusou a sua aplicação com fundamento em inconstitucionalidade».

2. O acórdão do STJ, ora recorrido, é do seguinte teor:

A. intentou acção ordinária contra a Caixa Geral de Aposentações pedindo que lhe seja reconhecido o direito às prestações por morte de B., alegando, em síntese, que viveu em união de facto com ele desde Setembro de 1998 até à data da morte deste, em 5 de Julho de 2004, que tem parcos rendimentos e não tem familiares que lhe possam prestar ajuda financeira, e que o falecido não deixou bens.

Contestando, impugnou a ré a generalidade dos factos alegados pela autora, e afirmou que a circunstância de o falecido só poucos meses antes do óbito se ter divorciado de sua mulher é impeditiva do direito que a autora pretende fazer valer, uma vez que o falecido não viveu com a autora durante dois anos no estado civil de divorciado.

Na 1.ª instância foi a acção julgada procedente, com a declaração de que a autora está em condições de solicitar à ré uma pensão de sobrevivência por óbito do falecido B., devida a partir do início do mês seguinte ao falecimento deste, se vier a ser requerida à ré no prazo de seis meses posteriores ao trânsito em julgado da sentença, ou a partir do início do mês seguinte àquele em que requer, se for requerida posteriormente.

A ré apelou para a Relação de Lisboa, que confirmou o decidido.

Recorre agora a mesma de revista, concluindo:

‘1.º – O acórdão não podia ter reconhecido à autora um direito para cuja titularidade era necessária a aquisição prévia da qualidade de herdeira hábil;

2.º – Da leitura do n.º 2 do artigo 41.º do EPS extrai-se que desde a morte do pensionista B., a companheira que com ele viveu em união de facto não era herdeira hábil, pois, para o ser teve que recorrer aos tribunais e obter uma sentença judicial que lhe fixasse o direito a alimentos;

3.º – É que, se a autora fosse, desde logo, considerada herdeira hábil, não seria necessário intentar uma acção contra a instituição de segurança social Caixa Geral de Aposentações;

4.º – Não é por acaso que o legislador, no citado preceito, refere expressamente a palavra «só» será considerado herdeiro hábil, para efeitos de pensão de sobrevivência, «depois» de sentença judicial que lhe fixe o direito a alimentos;

5.º – Mas o legislador não fica por aqui, pois na parte final do mencionado preceito diz também expressamente desde quando a pensão é devida – a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que a requeira, e enquanto se mantiver o referido direito;

6.º – Nada permitia, pois, que o acórdão recorrido reconhecesse à autora o direito à pensão de sobrevivência desde a data do óbito do pensionista;

7.º – O legislador ordinário (no Estatuto das Pensões de Sobrevivência) entendeu – numa opção que a Constituição acomoda sem dificuldade – aproximar o estatuto do unido de facto do ex-cônjuge com direito a alimentos. O que haverá de inconstitucional em condicionar o direito do companheiro de contribuinte falecido a uma pensão vitalícia de sobrevivência à carência de alimentos? Não partilham ambas as situações o desejo de o contribuinte falecido não estar casado à data da morte com aquela que se apresenta a habilitar-se a uma pensão de sobrevivência?

8.º – O esgotar da via trilhada pelo acórdão, em coerência, deverá levar a equiparar os efeitos da união de facto aos do casamento, sendo legítimo questionar o que se salvará deste, para além da cerimónia religiosa, quando a religiosidade dos noivos a admita;

9.º – Também não se afigura inconstitucional a coexistência de vários regimes de pensões, cada um com regras próprias (aliás, não se conhece um único País com um só regime de pensões para todos os trabalhadores), pois, se o regime geral da segurança social (aplicável à generalidade dos trabalhadores do sector privado) é, eventualmente, mais generoso neste aspecto, o que é certo é que as pensões que atribui têm valor muito inferior às que são pagas pelo regime gerido pela CGA (abrange os funcionários públicos e alguns trabalhadores do sector privado);

10 – Ora, o que não é admissível é que se ensaie, por via jurisprudencial, uma fusão dos dois regimes, aproveitando-se de cada um os aspectos julgados mais interessantes para os pensionistas, não cuidando de saber se o regime de financiamento de cada um comporta tão ousada ingerência do poder judicial numa esfera por natureza e, o que não é despiciendo, por lei reservada ao poder legislativo, naturalmente mais vocacionado para efectuar tal ponderação;

11.º – O acórdão viola o disposto no n.º 2 do artigo 41.º do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, devendo ser, substituído por outro que reconheça à autora o direito à pensão de sobrevivência a suportar pela ré CGA, com estrita observância das regras constantes do n.º 2 do artigo 41.º do EPS.’

Contra-alegou a autora/recorrida, pugnando pela manutenção do decidido.

Com os vistos, cabe decidir.

Estão provados os seguintes factos:

1. No dia 5...

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