Acórdão nº 0720/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Outubro de 2007

Data23 Outubro 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A..., magistrado do Ministério Público, com a categoria de Procurador - Adjunto e com domicílio profissional no Tribunal Judicial da comarca de ..., veio propor contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, acção administrativa especial de impugnação da deliberação de 15 de Março de 2006, proferida pela 2ª Secção daquele Conselho, que lhe atribuiu a classificação de Medíocre.

Alega, em síntese, que: - foi objecto de inspecção ordinária, que abrangeu o serviço prestado como procurador-adjunto na comarca de ..., no período compreendido entre ... e ..., que culminou com a deliberação ora impugnada; - as informações dos seus superiores hierárquicos, designadamente do Sr. Procurador Geral Distrital, sempre foram positivas, contrariamente ao que se refere no relatório da referida inspecção; - a proposta de medíocre constitui uma desvalorização do valor intrínseco da apreciação hierárquica das funções desenvolvidas pelo requerente e que pode levar, no limite, à aposentação compulsiva, à demissão ou à exoneração; - o que impõe uma fundamentação clara e inequívoca, no sentido de um exercício manifestamente insatisfatório de funções; - o que não acontece no caso, já que a deliberação acolhe integralmente o relatório da inspecção, que contêm evidentes contradições, utiliza conceitos puramente conclusivos e insusceptíveis de qualquer sindicância, contraria a informação hierárquica e revela a persistência de um claro erro, já que uma adequada ( não excessiva) ponderação dos elementos disponíveis sempre afastaria a possibilidade de atribuição da classificação mais baixa.

- conclui que o acto impugnado é inválido, quer porque foi praticado ao abrigo de uma norma inconstitucional, o nº3 do artº110º do Estatuto do Ministério Público (EMP), ao não estabelecer um limite temporal para a suspensão automática de funções face a uma classificação de medíocre, quer por vício de forma, por falta de fundamentação, quer por vício de violação de lei, por erro manifesto de apreciação.

*Contestou o Réu, pronunciando-se pela improcedência dos vícios invocados.

*Não havendo questões a conhecer no saneador e inexistindo prova a produzir, foram as partes notificadas para alegações escritas, que só foram apresentadas pela autoridade recorrida, onde renovou o alegado na sua contestação e formulou as seguintes CONCLUSÕES: 1ª. Como o CSMP tem vindo a defender em circunstâncias em tudo idênticas, o acto impugnado não enferma da inconstitucionalidade invocada pelo Autor: o artº110º, nº2 do EMP não atribui efeito suspensivo sem limite de tempo à suspensão do exercício de funções: o termo é o fixado no artº212º ex vi artº194º do dito Estatuto, ou seja, seis meses. Por isso, 2ª. Há-de improceder o primeiro vício apontado pelo Autor ao acto objecto da presente acção. Por outro lado, 3ª Não há incongruência na fundamentação da deliberação impugnada. Na verdade, 4ª. Considerou-se que o autor revelou, através da sua prestação funcional ao longo do período de tempo abrangido pela Inspecção " ...falta de brio profissional, de adaptação profissional, de capacidade de decisão, de preocupação na realização do direito perante situações concretas, de sentido de justiça..." - e manifestou "...um muito baixo nível de eficácia e de eficiência" sic.

5ª. Estas asserções encontraram suporte, para além da inexplicável falta de produtividade- que o Autor não contesta- no " aumento gradual de inquéritos atrasados e processos administrativos", "...no estado calamitoso, quase caótico" do serviço, caracterizado ..." por grande acumulação e atrasos generalizados, sem justificação aparente, reveladores de falta de método, organização, capacidade de trabalho e de decisão...gerando grande desorganização e descontrolo. O gabinete...encontra-se pejado de processos, ...os atrasos são inúmeros, generalizados, muitos de longa duração em todas as espécies de processos...com a agravante de alguns deles...terem culminado na extinção do procedimento criminal por prescrição". Além disso, 6ª. O Autor, por inacção, contribuiu para o bloqueamento do serviço, não só do Ministério Público, como também da Secção judicial, "...provocando grande preocupação e mau estar quanto ao estado do mesmo, na Juiz titular e no responsável pela secção. E revela grande falta de profissionalismo e (surpreendente) falta de consideração e sensibilidade perante os direitos e interesses dos cidadãos...muitos deles bastante sensíveis, provocando ...uma péssima imagem do funcionamento do Ministério Público» sic. Acresce que, 7ª. Revelou...uma manifesta incapacidade de resposta e de decisão perante as necessidades e exigências do serviço (...longe de ser considerado excessivo...), tendo "...assumido uma postura de grande inércia, displicência e desleixo...» sic na sua condução.

8ª. Muito dificilmente se encontraria uma fundamentação mais sólida para atribuição de uma classificação de " MEDÍOCRE".

9ª. A decisão adequada e coerente face a uma prestação funcional tão inequivocamente aquém do satisfatório só pode ser a adoptada pelo acto impugnado: a atribuição da classificação de " MEDÍOCRE".

10ª. Por outro lado, o CSMP ponderou e valorou criteriosamente todos os factores relevantes para a decisão, tendo apreciado globalmente o desempenho do Autor.

11ª. Expressamente se deixou dito que os registos positivos (bom domínio da técnica jurídica, urbanidade, bom senso nas intervenções em julgamento, qualidade do seu relacionamento com os órgãos de polícia criminal e com os demais operadores judiciários) não são suficientes para neutralizar os registos negativos, de dimensão e gravidade raras. Além disso, 12ª. Também se deixou consignado que a prestação funcional, no seu conjunto, não merece a classificação de SUFICIENTE, pois que pressupõe «... um mínimo de adaptação funcional e de capacidade para responder globalmente às obrigações decorrentes da função, o que no caso não se verifica...» sic. Posto isto, 13ª. Não cometeu o CSMP qualquer erro na apreciação e valoração da matéria que lhe foi submetida para decisão.

*Após apensação do processo cautelar de suspensão de eficácia do acto impugnado, vêm agora os autos à conferência, para decisão.

*II- OS FACTOS Consideram-se provados os seguintes factos, face aos elementos documentais juntos ao processo instrutor em apenso: a) O Autor é magistrado do Ministério Público, actualmente com a categoria de Procurador-adjunto.

b) O Autor iniciou funções, como agente do Ministério Público, em ..., na comarca d... ... e como Magistrado do Ministério Público, em ..., na comarca de ..., em regime de estágio, tendo prestado posteriormente serviço nas comarcas de ... e ..., onde se encontra desde ....

c) Foi inspeccionado, na comarca de ..., tendo o Conselho Superior do Ministério Público, por acórdão de 05 de Dezembro de 1996, deliberado sobrestar na classificação, determinando nova inspecção, no prazo de um ano.

d) Essa inspecção não foi, porém, realizada no referido prazo.

e) O Autor foi inspeccionado como Procurador Adjunto, na comarca de ..., relativamente ao período de ... a ..., tendo o Conselho Superior do Ministério Público, na sua deliberação de 20 de Junho de 2001, acordado atribuir-lhe a classificação de MEDÍOCRE.

f) O Autor interpôs recurso contencioso da deliberação referida em e), a que foi negado provimento por acórdão deste STA de 08.12.2002, rec. 48013, confirmado pelo acórdão do Pleno da 1ª Secção de 26.06.2004 (cf. http//www.dgsi.pt).

g) O Autor foi, de novo, sujeito a uma inspecção ordinária ao seu serviço prestado, como Procurador-adjunto, na comarca de ..., no período compreendido entre ... e ....

h) Nessa inspecção, foi-lhe também proposta a classificação de MEDÍOCRE, pelas razões que constam do relatório de inspecção, que se encontra junto ao processo instrutor, de fls. 211 a 303 e cujo teor, pela sua extensão, aqui se dá por integralmente reproduzido.

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