Acórdão nº 0745105 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2007

Data24 Outubro 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No âmbito do processo supra identificado, foi a arguida B.........., acusado pela prática de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205º/1 e 4 alínea a) C Penal.

A final, por se entender que o valor da coisa, objecto do crime, tinha o valor de € 1.500,00, passou-se a entender que os factos teriam a virtualidade, tão só, de integrar o tipo legal de abuso de confiança do nº. 1 do artigo 205º C Penal e dado que o ofendido tinha declarado anteriormente desistir da queixa, no seguimento de não oposição por parte da arguida, decidiu-se homologar a desistência e em consequência declarar extinto o procedimento criminal.

Nesta decisão, em forma de sentença, deixou-se, ainda exarado o seguinte: "Quanto ao objecto apreendido à ordem dos autos e tendo em conta além do mais o despacho de fls. 66, após trânsito vão os autos com vista ao MP para se pronunciar quanto ao destino a dar-lhe".

No seguimento do que o Magistrado do MP se pronunciou no sentido de que se deveria restituir o bem em causa, um quadro, já entregue ao ofendido C.........., a título de fiel depositário, declarando-se cessada aquela nomeação.

Notificados para se pronunciarem desta promoção, disseram: o ofendido, que nada tinha a opor e, D.........., a quem o quadro tinha sido vendido pela arguida, a non domino, veio dizer que se deve declarar este negócio nulo, devendo ser restituído, em consequência, tudo quanto foi prestado, recebendo ele o preço que pagou € 500,00.

Seguidamente foi proferido o despacho seguinte: "quanto ao destino do objecto apreendido nos autos e descrito e documentado a fls. 27 e ss: o ofendido nestes autos C.........., pediu a fls. 43 a devolução do quadro a óleo sobre platex, denominado "E..........", do ano de 1954, de F.......... (F1..........), com 28 cm de altura e 23 cm de largura, emoldurado com moldura dourada com 39 cm de altura e 23 cm de largura.

Realizada a audiência de julgamento, o tribunal concluiu que aquele quadro havia sido oferecido ao ofendido pelo autor e seu amigo F.........., em data indeterminada do ano de 1954.

O MP promoveu a entrega do quadro ao ofendido.

Notificado da promoção do MP, veio D.........., requerer que o quadro lhe seja entregue.

Decidindo: foi apurado em audiência de julgamento que o quadro a óleo sobre platex, denominado "E..........", acima descrito, pertence efectivamente ao ofendido, C.......... .

Resultou também provado que a arguida entregou a D.........., o referido quadro a óleo, mediante o pagamento por este do preço de € 500,00, que a arguida aplicou em seu proveito.

Dúvidas não há que estamos perante uma venda de coisa alheia, cujo regime legal vem definido, como refere o MP, nos artigos 892º e ss. C Civil.

É certo também que a venda em causa é nula, nos termos do disposto no artigo 892º C Civil, que pode ser invocada perante o comprador de boa fé, pelo legítimo dono do quadro.

Porém, a verdade é que a lei também acautela a situação jurídica do comprador de boa fé, conferindo-lhe o direito de exigir a restituição integral do preço, além de qualquer outra indemnização, a que nos termos gerais tenha direito, para eventual ressarcimento de danos.

Ora a entrega sem mais do quadro ao ofendido, acautela de forma suficiente os direitos deste, mas não os do comprador do quadro, D.........., que nem sequer foi parte nestes autos.

O tribunal apenas tem competência cível, nos termos do disposto nos artigos 78º e ss. e 377º C P Penal, não tendo competência para dirimir conflitos de natureza cível, que extravasem o âmbito do pedido de indemnização fundado na prática de um crime.

Quer isto dizer que o ofendido para recuperar o quadro em causa terá de instaurar a competente acção de reivindicação, contra o terceiro adquirente e eventualmente contra a própria arguida, pessoas que terão legitimidade para a demanda por terem manifesto interesse em contradizer o direito do autor, artigo 26º/1 C P Civil.

Só no âmbito de uma eventual acção de reivindicação, no foro próprio, poderá ser apurado por exemplo, se o adquirente do quadro estava ou não de boa fé, matéria que não foi alegada em sede de contestação, nem objecto de prova em audiência de julgamento.

Acresce que o quadro em causa nem sequer se encontra apreendido nos autos, pelo que não é aplicável o disposto no artigo 186º C P Penal.

Efectivamente, com resulta de fls. 26 e do respectivo termo de entrega de fls. 27, o referido D.........., entregou o...

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