Acórdão nº 07B3713 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução25 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I Empresa-A - Sociedade de Porcelanas, Ldª instaurou, no dia 13 de Janeiro de 2003, contra Transportes Empresa-B, Ldª, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a preencher com areia idêntica à do lote em causa a cratera na caldeira que nele abriu, a compactar a areia e a nivelar o mesmo lote à cota de 30 centímetros acima do nível do arruamento confinante e a indemnizá-la no montante a liquidar em execução de sentença por invocados prejuízos.

Fundamentou a sua pretensão no incumprimento pela ré de um contrato de prestação de serviços de terraplanagem e de nivelamento de um lote de terreno destinado à construção urbana.

Na contestação, a ré invocou que a autora lhe vendeu a areia do lote de terreno até três metros de profundidade, que se comprometeu a removê-la, que a última não tinha licença para o efeito e, em reconvenção, pediu a sua condenação a indemnizá-la, por não poder continuar a extrair a areia em razão da falta de licença, no que se liquidar em execução de sentença, e € 9 975, 96 a título de indemnização convencionada entre ambas pelo incumprimento contratual.

A autora replicou no sentido de negar o direito da ré a qualquer indemnização e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 13 de Setembro de 2006, por via da qual a ré foi condenada a nivelar parte do lote de terreno da autora até à cota da estrada e esta última a pagar àquela € 9 975,76.

Apelaram a autora e a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 9 de Maio de 2007, negou provimento a ambos os recursos.

Interpôs a autora recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - convencionaram que à recorrida estava vedada a abertura de crateras e que só lhe era permitida a remoção dos materiais excedentes; - ao julgar-se poder a recorrida, ao abrigo do contrato, escavar de modo a abrir a cratera que abriu, interpretou-se e aplicou-se erradamente o artigo 236º do Código Civil; - ao abrir a cratera, impedindo a recorrente de iniciar a construção do edifício industrial a que o terreno se destinava, incumpriu a ré o contrato e é obrigada a indemnizá-la; - foram erradamente interpretadas e aplicadas as normas dos artigos 562º a 566º 798º e 799º do Código Civil; - a recorrente não incumpriu o contrato, pelo que não deve ser condenada no pagamento de indemnização à recorrida.

II É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido: 1. Representantes da autora e da ré, designadas por primeira e segunda outorgantes, declararam por escrito, no dia 27 de Outubro de 2001: - comprometer-se a segunda outorgante a proceder "num lote de terreno para construção na Zona Industrial da Mota, "à remoção do material excedente e, quando possível, ao aproveitamento do material existente no terreno, colocando em seu lugar materiais de origem arenosa, realizando posteriormente o nivelamento de toda a área delimitada pelas extremas do referido lote de terreno, sendo que para tal utilizará as suas máquinas para terraplanagem, escavação e remoção de terras"; - após a retirada dos materiais excedentários" a segunda outorgante "obriga-se especificamente a deixar o terreno nivelado e com as quedas necessárias para o bom escoamento das águas"; - a primeira outorgante declara que todos os materiais que para o fim referido nas cláusulas anteriores venham a ser retirados do lote de terreno, passarão, no acto da sua remoção, a ser propriedade da segunda outorgante, que será livre de lhe dar o destino que entender, sem de tal dar conta ou pagar quaisquer quantias..."; - os trabalhos de terraplanagem terão início no prazo de 5 dias após a comunicação feita pela primeira outorgante à segunda outorgante de que podem ter início os trabalhos, e terminarão 120 dias após"; - a segunda outorgante, como forma de pagamento, entrega à primeira outorgante cheques no valor total de 4 000 000$; - no caso de se verificar incumprimento ou desistência por parte de qualquer das outorgantes, a outra parte terá direito a receber...indemnização que antecipadamente se fixa em 2 000 000$.

  1. Por virtude do declarado mencionado sob 1, a segunda outorgante devia proceder à terraplanagem do terreno e o nivelamento seria efectuado com areias sujas, que aquela compraria e colocaria no final da escavação, visando a primeira outorgante preparar o mesmo lote de terreno para a construção de um edifício industrial, e poder a ré quando tal fosse possível, remover e fazer seu o material excedente, designadamente pinheiros e areia, e, do declarado não consta 3. Do declarado sob 1 não consta autorização concretizada da extensão e profundidade da remoção de areias.

  2. A autora vendeu à ré areia existente no lote de terreno em causa, sem concretização da sua profundidade ou extensão e a última comprometeu-se a proceder ao nivelamento do mesmo, e a ré pagou à autora a quantia de € 19 951,91, que foi o preço acordado.

  3. Para além da terraplanagem e do nivelamento referidos, a ré escavou e removeu areias de tal lote de terreno, para venda, abrindo, assim, no centro do mesmo, uma cratera com cerca de 3 metros de profundidade em alguns pontos e com 70 vezes 60 metros de lado.

  4. Foram levantados autos de contra-ordenação por via da escavação e remoção de areia do lote de terreno mencionado, em virtude do que, em meados de 2002, a ré não pôde continuar a extrair e remover a areia referida, que pretendia revender.

  5. A autora, perante os factos referidos sob 5, remeteu à ré a carta constante a folhas 73 e 74, datada de 7 de Junho de 2002, de cujo teor consta, designadamente, o seguinte: "...o acordo...não se encontra a ser cumprido pela vossa parte. A vossa atitude de extracção de areias até ao nível freático levou a que a empresa Empresa-A fosse autuada para prestar declarações junto das entidades competentes, com pagamento de uma coima e a possibilidade de perda do terreno. Ora, como não foi esse o nível estabelecido para a terraplanagem e a remoção de materiais excedente, a empresa Empresa-A reconhece toda a responsabilidade desta situação à negligente e inadmissível forma de tratamento de terrenos do subsolo pela vossa parte. A empresa Empresa-A, aquando do acordo, frisou a intenção de não baixar o nível de areia abaixo da cota da estrada, já que a empresa iria colocar maquinaria que produz vibração, necessitando para isso da estabilidade dos solos, bem como para a própria estabilidade dos edifícios. O nível estabelecido por ambas as partes para a remoção dos materiais excedentes foi a cota da estrada, com posterior aterro e nivelamento do mesmo até uma cota de cerca de 30 cm acima da cota da estrada. Perante esta situação, agradecíamos que procedessem urgentemente à regularização do terreno conforme...

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