Acórdão nº 01101/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução18 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal Pleno da 1ª Secção: A..., Lda, interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, recurso contencioso de anulação da decisão da Sr.ª Ministra do Planeamento, do Sr. Secretário de Estado das Indústrias, Comércio e Serviços e do Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação, contida nos seus despachos de, respectivamente, 4.3.02, 13.3.02 e 26.3.02 que homologou a proposta de rescisão do contrato de concessão de incentivos financeiros, no valor de Esc. 8.777.231$00, que, em 1.8.97, havia celebrado com o Banco B..., SA (C...) no âmbito do Programa das Iniciativas de Desenvolvimento Local, aprovado pelo DL 34/95, de 4.2.

Para tanto, e em resumo, alegou que o acto impugnado estava inquinado por erro nos pressupostos de facto, violava o disposto no art.º 15.º do Regulamento do Programa das Iniciativas de Desenvolvimento Local, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 57/95, de 17.6, e não estava devidamente fundamentado.

O TAC de Lisboa julgou-se materialmente incompetente para conhecer do recurso contencioso, pelo que os autos foram remetidos a este Supremo Tribunal que, por Acórdão da Secção de 9/02/2006, lhe negou provimento.

Inconformada recorreu para este Tribunal Pleno tendo formulado as seguintes conclusões: 1. Da matéria de facto que o douto Acórdão recorrido deu como provada e de todo o PA, não resulta que a entidade bancária tenha cumprido as funções de acompanhamento e fiscalização de que estava incumbida, pelo que, as informações que veiculou e que motivaram a homologação da proposta de decisão carecem em absoluto de qualquer valor ou credibilidade para aquele efeito, pelo que o douto Acórdão recorrido falhou na apreciação critica dos factos provados e nas conclusões que em matéria de direito deles retirou.

  1. O contrato de concessão de incentivos (IDL) que a recorrente celebrou com o então B... é um contrato administrativo, regulado pelo regime legal imperativo resultante da Resolução do Conselho de Ministros n.° 57/95, de 17/06, que aprovou o Programa das Iniciativas de Desenvolvimento Local, configurando-se a relação jurídica estabelecida entre o B... e a DGDR como de mandato sem representação, uma vez que o B... - mandatário - embora agindo em nome próprio, age por conta da mandante DGDR.

  2. As competências e obrigações que para a instituição bancária associada resultam do Regulamento aprovado pela citada Resolução do Conselho de Ministros, são-lhe atribuídas no quadro da prossecução do interesse público, pois é do interesse público que os projectos aprovados sejam cumpridos, e, para tanto, é necessário que sejam efectivamente acompanhados, orientados e fiscalizados, sendo estas funções cometidas às instituições bancárias associadas, essenciais.

  3. Da matéria de facto provada não resulta que em algum momento a entidade bancária associada - B... - tenha acompanhado o projecto de investimento em causa, ou que tenha efectuado qualquer visita ao local e também não resulta que tenha solicitado ao promotor ora recorrente qualquer elemento para a fiscalização e acompanhamento do projecto como estipula o art. 14.°, n.º 2, da citada resolução do Conselho de Ministros.

  4. No que respeita aos contactos com a recorrente, o Banco limitou-se a contactá-la em 16-03-99, na sequência da mensagem de fls. 67 do PA, para que esta elaborasse carta à DGDR solicitando prorrogação do prazo, a enviar esta carta para a DGDR e a recepcionar o ofício de fls. 197 do PA.

    Nada mais. (cf. 4, 5 e 6 dos factos provados constantes do douto acórdão recorrido), pelo que, no caso em apreço, o B... agora C...não cumpriu as suas competências e obrigações de acompanhamento e fiscalização do projecto.

  5. A entidade bancária associada violou os princípios gerais da boa-fé, designadamente o dever de lealdade na execução do contrato, pois não basta para o cumprimento do dever de lealdade gerador da confiança contratual que o Banco, dotado das competências de acompanhamento e fiscalização que lhe são cometidas para prossecução do interesse público, se limite a enviar por fax à recorrente uma mensagem alertando-a para a necessidade de pedir prorrogação do prazo para o cumprimento do projecto, omitindo qualquer explicação ou aviso concreto e esclarecedor para a necessidade de apresentação no seu balcão dos documentos de despesas ou de pedidos de pagamento dos incentivos aprovados.

  6. Era razoável e até se impunha como regra de conduta que o B... - agora C... - esclarecesse concreta e claramente a recorrente de que deveria fazer a apresentação no ao balcão do Banco dos documentos justificativos das despesas e efectuasse os pedidos de pagamento, mas não o fez.

  7. A expressão "pedidos de pagamento" constante do contrato não é clara para um leigo, quanto ao tipo de entregas a que se refere se ao pagamento dos incentivos se à entrega dos montantes aprovados a título de empréstimo bancário, relativamente aos quais, aliás, a recorrente não teve necessidade de recorrer.

  8. "O dever de boa-fé, não se circunscreve ao simples acto da prestação, abrangendo ainda, na preparação e execução desta, todos os actos destinados a salvaguardar o interesse do credor na prestação (o fim da prestação) ou a prevenir prejuízos deste, perfeitamente evitáveis com o cuidado ou a diligência exigível ao obrigado." É nesta área do cumprimento da obrigação que especialmente se concentra a vasta galeria dos deveres acessórios de conduta (deveres de protecção, de esclarecimento e de lealdade) Cfr. (Código Civil Anotado, vol. II, 33 ed., pág. 3, P. Lima e A. Varela).

  9. Em face da matéria de facto provada, designadamente no ponto 10 do douto Acórdão recorrido, é evidente a boa-fé subjectiva da recorrente quando estranha a actuação do Banco em face dos contactos que teve com os seus sucessivos gerentes, solicita ao Banco que tome junto da DGDR as medidas que entender necessárias para a resolução definitiva do processo iniciado em 31-07-99 que por razões alheias à recorrente ainda não fora concluído e o informa que o projecto se encontra totalmente concluído e implantado e que poderá ser verificado a qualquer momento que o Banco deseje ou entenda.

  10. Também resulta da prova constante do PA que após a comunicação directa e essa sim esclarecedora da DGDR, em 03/01/2001 (cfr. fls. 62 do PA) a recorrente apresentou vários documentos comprovativos da realização do projecto, designadamente modelos 22 de 1995 e 2000, balancetes, facturas e recibos e um pedido de pagamento (cf. ponto 13 dos factos provados), pelo que nenhuma dúvida, subsiste sobre a realização do projecto.

  11. O Banco agindo por conta da DRDR violou os princípios gerais da boa-fé e incumpriu as obrigações contratuais e competências legais a que estava adstrito.

  12. A informação veiculada pelo C... que baseou o despacho que o autorizou a rescindir o contrato de concessão de incentivos, não foi resultado de qualquer auditoria ou fiscalização e também o não foi em resultado de conduta omissiva da recorrente quanto a interpelação admonitória ou equivalente, pois o C... nenhuma fez.

  13. A comunicação de 16-03-99 (fls. 67 do PA) é manifestamente insuficiente, pois não explicita o comportamento pretendido da promotora como apto à satisfação do pretendido pela DGDR.

  14. A questão da ultrapassagem dos prazos previstos para a apresentação dos documentos não pode ser apreciada como o fez o douto Acórdão recorrido que na apreciação crítica da prova não teve em conta a descrita conduta omissiva e violadora da boa-fé por parte da entidade bancária associada, e, em consequência, ao considerar que o não cumprimento dos prazos estabelecidos no contrato é imputável ao promotor, enferma de erro de julgamento, assim violando o art. 15° n.° 1 do Regulamento do Programa das Iniciativas de Desenvolvimento Local, o artigo 266 n.° 2 da Constituição, o art. 6°-A e 2 do CPA e o art. 762° n.° 2 do Código Civil.

  15. O douto acórdão recorrido também errou, desta vez ao julgar implicitamente que a apresentação do documentos ao Banco ... foi inútil ou irrelevante, baseando-se no facto de este Banco não ser a entidade associada à execução do projecto, o que não é exacto, porquanto, tal como o B... o Banco ... foi integrado no Grupo C..., facto que aliás é público e notório, e sucedeu na posição do B... como entidade associada, como aliás resulta da carta de fls. 97 dos autos dirigida à recorrente pela agência da Guarda do Banco ... . E assim também a decisão fáctica enferma de evidente e manifesto erro de julgamento.

  16. Está provado que a recorrente comprovou a criação dos postos de trabalho junto do Centro de Emprego (cf. art. 30° da resposta de fls. 56 dos autos da Sr.ª Ministra das Finanças), o que revela o cumprimento de facto de todo o investimento e não tendo sido demonstrado pela instituição bancária e não resultando dos presentes autos e do processo administrativo que a recorrente não tenha cumprido os objectivos e obrigações legais, ou que os não tenha cumprido por causa que lhe fosse imputável, o incumprimento a existir sempre seria imputável à Instituição Bancária e não ao promotor.

  17. Conhecendo a realização do investimento (cf. fls. 2 do PA), a DGDR deveria ter apurado previamente à informação de rescisão, a quem competia a responsabilidade pela ultrapassagem dos prazos, mas não o fez como claramente resulta da frase manuscrita a fls. 23 do PA que se transcreve: «fazer o cruzam/ destes ele/s com a Informação de rescisão e depois talvez perguntar ao banco o que se passou», pelo que, é inegável que ao proferir a informação de rescisão a DGDR não conhecia e sabia não conhecer todos os elementos que de forma clara e inequívoca pudessem fundamentar a vontade de autorizar a referida rescisão contratual.

  18. Pelo que, o despacho que homologou a informação 269/2002 DSAE é ilegal estando inquinado de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, o que constitui violação de lei e o douto Acórdão recorrido ao julgar não estar o acto em causa afectado por nenhum daqueles vícios, incorreu em...

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