Acórdão nº 06736/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução04 de Outubro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO Fernando ...

, especialista de informática de grau 3, da carreira de informática do quadro de pessoal do Instituto Nacional de Investigação Agrária [INIA], veio interpor o presente RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO do despacho do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, datado de 21-10-2002, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva, sustentando para o efeito que o mesmo padece do vício de violação de lei, por ofensa do disposto nos artigos 26º, 59º e 69º do Estatuto Disciplinar, de forma, por falta de fundamentação, e contrário aos princípios da imparcialidade, justiça, proporcionalidade e boa-fé, consignados no artigo 266º, nº 2 da CRP.

A entidade recorrida não apresentou resposta, tendo-se limitado a enviar o processo instrutor.

Em alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "[...] 2ª - A pena de aposentação compulsiva que lhe foi aplicada assenta em supostos factos e comportamentos imputados ao arguido não verificados, nem provados nos autos, os quais estão identificados nas alíneas a), b), c), d) e e) do artigo 4º das presentes Alegações e se dão por integralmente reproduzidos.

  1. - Com efeito, nos autos não foi produzida nenhum tipo de prova de que o arguido incorreu na violação dos deveres gerais de zelo, obediência, lealdade e correcção e na prática do crime de denúncia caluniosa, como suficientemente demonstrado em sede da defesa apresentada e da petição do recurso interposto.

  2. - Por outro lado, no enquadramento legal dos factos imputados, em que são identificadas duas ou mais penas para cada uma das infracções e apenas ponderadas as circunstâncias agravantes especiais para determinação da pena aplicada, o acto recorrido está eivado do vício de violação de lei por contender com as normas vertidas nos artigos 28º, 29º, alíneas a) e b), 57º, nº 2 e 59º, nº 4 do Estatuto Disciplinar.

  3. - A dualidade de critérios adoptada, colide, outrossim, com os princípios da proporcionalidade, imparcialidade, justiça e boa-fé, de assento constitucional no artigo 266º da Constituição da República e regulamentados nos artigos 4º, 5º e 6º do CPA.

  4. - Carecem igualmente de prova as circunstâncias agravantes especiais referidas no artigo 31º, nº 1, alíneas b) e g) do ED, porquanto não estão identificados, na sua natureza e grau, os resultados prejudiciais ou prejuízos patrimoniais e morais, nem a acumulação de infracções.

  5. - Em qualquer caso, a pena disciplinar aplicada, pela sua gravidade e consequências de afastamento da função pública, apresenta-se absolutamente desajustada à natureza e gravidade das imputações deduzidas contra o arguido e viola manifestamente os princípios da proporcionalidade e da justiça consignados na Lei Fundamental [artigo 266º].

  6. - Ademais, face à moldura jurídica, quer substantiva quer processual, que envolve o processo disciplinar em causa, está seguramente por demonstrar a inviabilização da manutenção da relação de emprego público a que o acto contenciosamente impugnado deu causa.

  7. - Por assim ser, o acto recorrido padece dos vícios de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito e de inconstitucionalidade, contravindo com os princípios e normas identificados".

A entidade recorrida não apresentou contra-alegações.

Neste TCA Sul o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer, defendendo que o recurso não merece provimento [cfr. fls. 234/235].

Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento.

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação do mérito do presente recurso contencioso, mostram-se assentes os seguintes factos: i.

    Por despacho do Presidente do Instituto Nacional de Investigação Agrária [INIA], datado de 24-6-2002, foi determinada a abertura de um processo de inquérito, a fim de apurar factos ocorridos na Estação Nacional de Melhoramento de Plantas, relacionados com a não disponibilização de programas informáticos [software], pedidos para carregar num computador que a direcção daquela Estação adquirira para o seu serviço de apoio [cfr. fls. 3/6 do processo de inquérito apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    ii.

    Esse despacho foi motivado pela participação do Director da Estação Nacional de Melhoramento de Plantas, datada de 11-6-2002, constante de fls. 7/8 do processo de inquérito apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que indiciava que o recorrente, enquanto responsável do Núcleo de Informática daquela Estação, tinha fechados numa gaveta da sua secretária software - Microsoft Office 2000 - que era necessário para instalação num computador recém-adquirido, e que após instado para o disponibilizar, não o fez, invocando encontrar-se de baixa médica, levando a que fosse necessário arrombar as gavetas em causa.

    iii.

    Do arrombamento em causa, efectuado no dia 6-6-2002, foi levantado um "auto de abertura", cujo teor é o constante de fls. 18 do processo de inquérito apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    iv.

    Em 13-6-2002, e após regressar ao serviço, o recorrente elaborou uma participação, dirigida ao Presidente do INIA, "de roubo, seguido de furto da sua secretária, através da violação de três módulos de gavetas, que eram de seu uso pessoal, onde normalmente guardava elementos e informações do serviço, assim como objectos da sua própria pessoa", havendo a registar "o desaparecimento de um CD Microsoft Office 2000 Profissional, um envelope com cem euros e duas disquetes, com informação de carácter indisponível" [cfr. fls. 29 do processo de inquérito apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    v.

    Na sequência das diligências efectuadas, foi proposta a instauração de processo disciplinar a vários funcionários, entre os quais o aqui recorrente [cfr. fls. 64/71 do processo de inquérito apenso e 56/63 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    vi.

    Tal proposta veio a ser acolhida por despacho do Director do INIA, datado de 13-8-2002 [cfr. fls. 64 do processo de inquérito apenso e 56 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    vii.

    Em 27-8-2002, o Instrutor do processo deduziu a seguinte acusação contra o aqui recorrente:"ACUSAÇÃO Por despacho do Senhor Presidente do INIA - Instituto Nacional de Investigação Agrária - de 13 de Agosto de 2002, exarado no Relatório do Processo de Inquérito ao Núcleo de Informática da ENMP - Estação Nacional de Melhoramento de Plantas [de ora em diante abreviadamente designada pela sigla que antecede], foi mandado instaurar processo disciplinar ao funcionário Fernando ..., Especialista de Informática do Grau 3, da carreira de informática do quadro de pessoal do INIA, casado, residente na Rua ... em Elvas e a desempenhar funções de Responsável pelo Núcleo de Informática [ou NI] da ENMP, em Elvas. Ainda conforme o mesmo despacho, aquele inquérito foi autorizado a servir como fase instrutória deste processo disciplinar, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 87º do Estatuto Disciplinar aprovado pelo DL nº 24/84,16/1 [abreviadamente - Estatuto Disciplinar ou ED].

    Nestes termos, e de harmonia com o disposto nos artigos 57º, nº 2 e 59º, nº 4 desse diploma, deduzo contra o referido arguido, melhor identificado já nos autos, a seguinteACUSAÇÃO 1.

    O arguido, como se disse atrás, desempenha as funções de Responsável pelo Núcleo de Informática da ENMP, constituído também pelos funcionários João ... e Ana ....

    1. Em 24 de Maio de 2002, ao terminar a instalação dum computador, que a Direcção da Estação adquiriu para o seu secretariado à firma "Vitus, Comércio e Indústria de Equipamentos de Electrónica, Ldª", o funcionário desta que executou o trabalho, solicitou que lhe facultassem o "Software" de instalação do "Scanner" e, depois, o do "Office".

    2. A essa data o arguido encontrava-se de "baixa" por doença, situação que decorria desde 20-5-2002, e que conforme o respectivo atestado junto ao Inquérito [fls. 21, 22 e 23], "não necessitava de internamento", devendo, até, sair do domicílio a partir do dia 25 seguinte.

    3. Contactada a funcionária do NI em serviço, Ana ..., veio a saber-se que o arguido tinha os programas, pertença da ENMP, encerrados na secretária que ali usa, de forma que a resposta da referida funcionária foi a de que o programa de instalação do "Scanner" não se encontrava disponível.

    4. E o mesmo veio a acontecer quando, passado o fim de semana, em 27-5-2002, foi solicitado ao outro elemento do NI, João ..., o programa "Office", vindo este mesmo a escrever na requisição feita pela secretária da Direcção, que "Não existe disponibilidade do software em causa no NI".

    5. Em 3-6-2002 regressa de férias o Director da Estação, Engenheiro José ..., que se depara com a situação de indisponibilidade do referido material, pelo que chama o único funcionário ao serviço do Núcleo, o Sr. João ..., que lhe dá conhecimento de que falara telefonicamente com o arguido e que este lhe dissera que o software existia, de facto, e estava na gaveta da secretária onde trabalhava, "mas ele estava doente".

    6. O próprio Director, nesse dia, e depois de determinar que se tratasse de obter os programas, toma a iniciativa de ligar para o telemóvel do arguido, onde deixa uma mensagem para que ele entre em contacto com a Estação, o que repete no dia seguinte.

    7. Também o Chefe de Repartição Sr. Braço... diligenciou o contacto telefónico, sem obter êxito para que o arguido abrisse mão das chaves da gaveta da secretária, onde encerrara os programas que o Director, por diversos meios, pretendia obter.

    8. Em 5-6-2002 foi nesse sentido também feito um ofício, mandado entregar pessoalmente pelo funcionário João ... que, atendido no intercomunicador da residência do arguido, não viu ser-lhe franqueada a entrada, acabando por deixar o ofício na caixa do correio.

    9. Indicia-se assim que o arguido teve conhecimento da ordem do senhor Director para que...

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