Acórdão nº 2123/2007-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 31 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução31 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 15.9.2003 A J S A Ns intentou no Tribunal Judicial da comarca de Almada acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra J L A R, identificado nos autos.

Alegou, em síntese, que:

  1. O Réu dedica-se habitualmente à compra e venda de veículos novos e usados; b) Em 13 de Setembro de 2002 o R. vendeu ao A. um automóvel usado, marca BMW, pelo qual o A. pagou € 26 180,00; c) Em Outubro de 2002 o veículo revelou alguns defeitos de funcionamento, ou seja, sentia-se um forte cheiro a combustível dentro do habitáculo e perda de potência do motor. O A. comunicou imediatamente ao R. tal situação e este nessa ocasião procedeu à eliminação dos defeitos, dizendo que se tinha tratado de uma ruptura de um tubo de saída de gases do motor, mas que havia substituído tal elemento; d) "Passados poucos dias o cheiro a combustível manteve-se" [expressão do A.] e o motor começou a fazer um ruído anormal. Comunicada tal situação pelo A. ao Réu, este mandou substituir uma peça do motor e terá levado o veículo a um centro de escapes, tendo mandado substituir, segundo disse ao A., o tubo flexor do escape. O ruído do motor deixou de existir; e) Em 10 de Março de 2003 o A. voltou a detectar cheiro intenso a combustível dentro do habitáculo e outros defeitos de funcionamento do veículo em causa, ou seja, barulho anormal do motor, sistema de ar condicionado sem funcionar, regulador de altura do farol dianteiro sem funcionar, flexor do escape com ruptura e suportes da suspensão dianteira danificados; f) Por carta registada com aviso de recepção de 24 de Março de 2003 [que veio devolvida com a menção "pediu para deixar aviso" e "não reclamada", conforme resulta dos documentos juntos pelo A.], o A. deu conhecimento ao R. dos referidos defeitos de funcionamento e exigiu a eliminação dos mesmos; g) O R. nada respondeu ao A.; h) Alguns dos defeitos de funcionamento acima referidos punham em causa a segurança e bem estar de utilização do veículo, sendo certo que o A. e a sua família necessitam de se deslocar nele diariamente, pelo que o A. viu-se obrigado a mandar proceder à sua eliminação, ou seja, à substituição dos triângulos das suspensões dianteiras e à reparação do sistema de ar condicionado, no que despendeu a quantia de € 666,28; i) Da utilização do veículo com os defeitos supra descritos resultaram para o A. outros prejuízos patrimoniais e não patrimoniais, cujo objecto e quantidade não pode precisar de momento, pelo que a fixação dos mesmos terá de ficar para execução de sentença.

    O A. terminou pedindo que o Réu seja condenado: 1º A pagar ao A. a quantia de € 666,28, acrescida de juros desde a citação até efectivo e integral pagamento; 2º A eliminar os defeitos de funcionamento supra descritos, iniciando tal reparação no prazo máximo de 15 dias após condenação nesses precisos termos; 3º No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, à razão de € 50,00 por cada dia de atraso no cumprimento da peticionada reparação, nos termos do art° 829°-A, do Cód. Civil; 4º A pagar ao A. a indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença pelos demais prejuízos que o A. sofreu em consequência dos defeitos de funcionamento do veículo automóvel em causa.

    O Réu contestou, declarando serem verdadeiros os factos supra indicados sob as alíneas a) e b) e reconhecendo que o A. se queixara dos defeitos aludidos em c), cuja realidade o Réu não apurou, tendo solicitado à oficina da BMW da área que revisse o veículo em causa, sendo verdade que o motivo das reclamações desapareceu. Não recebeu qualquer comunicação por carta por parte do A.. Ignora se os defeitos apontados existem ou não e se o A. procedeu a qualquer reparação. O Réu antes de entregar o veículo ao A. procedeu a uma revisão completa nas oficinas da BMW e nessa revisão foram testadas e afinadas as condições de funcionamento do veículo, que ficou em perfeitas condições de funcionamento. O A. usa o veículo na sua profissão, pelo que não pode invocar a legislação de protecção do consumidor. A rua onde o A. reside é servida por transportes públicos frequentes, pelo que tinha alternativa à utilização da viatura. O eventual direito do A. caducou, pois a denúncia dos defeitos só foi recebida pelo R. com a citação, mais de um ano após a aquisição e entrega do veículo.

    O Réu termina concluindo pela sua absolvição dos pedidos.

    O A. respondeu à contestação, pugnando pela improcedência da excepção de caducidade e reiterando a procedência do por si peticionado.

    Foi elaborado despacho saneador e dispensou-se a selecção da matéria de facto, invocando-se a simplicidade da causa.

    O mandatário do Réu veio aos autos retirar a confissão que efectuara do alegado no art.º 2º da petição inicial (ou seja, que o Réu vendera o aludido veículo ao A.).

    O A. reiterou que havia adquirido o veículo ao Réu e requereu que o mesmo fosse condenado como litigante de má fé, em multa e indemnização ao A., que liquidou em € 1 500,00.

    O tribunal a quo aceitou a retirada da confissão, uma vez que o autor não a havia aceite especificadamente.

    Realizou-se audiência de julgamento, com gravação dos depoimentos.

    A final o tribunal proferiu decisão sobre a matéria de facto, sem reclamações.

    Em 30.5.2006 foi proferida decisão em que se absolveu o Réu da instância quanto ao pedido de condenação no pagamento de indemnização que viesse a ser liquidada em execução de sentença pelos demais prejuízos consequentes dos defeitos de funcionamento do veículo automóvel e, no mais, julgou-se a acção parcialmente procedente e consequentemente proferiu-se decisão nos seguintes termos: "1. Condena-se o réu a pagar ao autor a quantia de 666,28 euros, a que acrescem juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento; 2. Condena-se o réu a eliminar os defeitos existentes no veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 d, com a matrícula , e descritos nos números 2.10 e 2.11 dos factos provados, à excepção do sistema de ar condicionado e suportes da suspensão dianteira, que já se encontram reparados; 3. Condena-se o réu como litigante de má fé, na multa de 6 ( seis ) Ucs; 4. Condena-se o réu como litigante de má fé, no pagamento de indemnização ao autor; 5. Absolve-se o réu do demais que foi peticionado pelo autor .

    Custas a cargo do autor e do réu na proporção do respectivo decaimento.

    Registe e notifique, sendo ainda o autor para, em dez dias, indicar e justificar, quanto possível, as diferentes verbas e prejuízos que totalizam os 1.500,00 euros peticionados.

    " O Réu apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões, que se transcrevem:

    1. Quanto à matéria de facto: O réu recorrente considera incorrectamente julgados os concretos pontos de facto seguintes: 1) n° 2 e 3 dos factos provados, correspondente aos artigos 2° e 30 da petição inicial.

      2) n° 10 dos factos provados, correspondente ao art. 11° da petição inicial.

      3) n° 13 dos factos provados, correspondente ao art. 12° da petição inicial (crescido do documento 1, fls.. 7 e 8 dos autos).

      Os factos sob 1) estão incorrectamente julgados por contrariarem as prescrições legais relativamente à confissão, tornando impossível a sua utilização para fundamentar as respostas; a que acresce a ausência do "auxílio" da testemunha, cônjuge do autor (cassete no 1, lado A, volta 1661 até cassete no 2, lado A, volta 1012); O teor dos documentos constantes dos autos em especial: - Declaração aduaneira do veículo - DAV; - Recibo emitido por Controlauto (venda a dinheiro); - Cheque n° , emitido pelo autor; - Certidão emitida pela alfândega do Jardim do Tabaco (DAV, mod. 1402 e "procuração").

      O facto sob o n° 2 está incorrectamente julgado por não ter atendido ao teor, julgado provado da carta enviada pelo autor ao réu que não a recebeu, reproduzida no n° 12 dos factos provados, onde se refere: "…venho notificar V.ª.

      Ex.

      a para marcação de uma data para proceder à eliminação dos seguintes defeitos que o automóvel apresenta, desde o dia 10 do presente mês de Março de 2003: - barulho anormal do motor (...); - cheiro intenso a combustível dentro do habitáculo; - sistema de ar condicionado avariado; - espelho retrovisor direito com automatismo avariado; - regulador de altura do farol dianteiro avariado.

      Quanto aos restantes problemas que o mesmo apresenta e que V/ referi no passado dia 11,...perante a sua recusa em reparar e a urgência da reparação …já tive de proceder à eliminação dos mesmos…" O cheiro a combustível no habitáculo foi verificado no dia 10 de Março de 2003, bem como outros defeitos, tal como o autor alega no art. 11° da petição inicial.

      O esclarecimento introduzido no facto alegado é contrariado pelos factos provados constantes do no 12 dos factos provados devendo pois dar como provado o que consta no art. 110 da p.i., sem esclarecimento: "11° Passados alguns meses, em 10 de Março de 2003, o A. voltou a detectar cheiro a combustível dentro do habitáculo e outros defeitos de funcionamento do veículo em causa".

      O facto sob 3) está incorrectamente julgado na parte da necessidade sem alternativa da utilização do veículo.

      É notório e público, mesmo sem o autor o confessar, que a Av. Afonso Henriques que liga o centro de Almada a Cacilhas dispõe de inúmeros e frequentes transportes desde muito cedo, até bastante tarde, sendo a cadência nocturna menos frequente mas suficiente para resolver os problemas menos intensos de transporte.

      Qualquer pessoa com domicílio, profissional que seja, em Almada, sabe da realidade destes factos.

      Como quer que seja os turnos de enfermagem começam à meia-noite e acabam às oito da manhã, há transportes suficientes, embora menos frequentes.

      Estes factos públicos e notórios impõem que o n° 13 dos factos provados (art. 190 da p.i.) deve ser julgado não provado.

      A isto acresce que tais factos, como favoráveis ao autor não podem por ele ser confessados.

      O art. 19° da petição inicial (no 13 dos factos provados) deve...

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