Acórdão nº 1314/2003-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Maio de 2003
Magistrado Responsável | SANTOS MARTINS |
Data da Resolução | 20 de Maio de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I - Relatório A ... - DESPACHANTES OFICIAIS ASSOCIADOS Ldª, intentou a presente acção no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, cuja petição foi apresentada em Juízo no dia 7 de Maio de 1993, contra o estado português, representado pelo Mº Pº, pedindo a sua condenação no pagamento, a título de indemnização, do montante global de 500.000.000$00.
Fundamentando esse pedido, alegou, designadamente, que: - é uma sociedade de despachantes oficiais, conforme escritura de 19/1//81, junta com a petição; - a sua constituição foi autorizada por despacho do Secretário de Estado do Orçamento, de 7/1/81 - O.S. da Alfândega de Lisboa nº 67/81, série B; - o seu Regulamento foi aprovado pelo artº 9º do DL nº 513.F1/79; - o seu objecto resulta do seu artº 2º, sendo que o vínculo que liga o despachante à Alfândega tem sido objecto de regulamentação através de vários diplomas, que identifica, destes salientando os Decretos-Lei nºs 89/92, de 21 de Maio e 280/92, de 18 de Dezembro, respectivamente.
- de todos esses diplomas resulta que a palavra "oficial" traduz o carácter público do serviço do despachante, que implica a sua submissão ao regime de serviço público; - o art. 461º da R.A. imprime à sua actividade o carácter de mandato aduaneiro; - quanto à relação laboral, de igual modo é atingida pelas normas de direito publico disciplinadoras da profissão (Preâmbulo do DL nº 509/76, de 2/7); - o princípio da livre circulação de mercadorias, previsto nos artºs 9º e 30º do T.R., tornou-se realidade com a entrada em funcionamento do mercado comum em Jan/93 - artº 8º; - em 1986, data da assinatura do acto único, que previa aquele mercado comum, sabia-se que, em 1/1/93, mais de 80% das mercadorias, objecto de trocas, deixariam de estar sujeitas a obrigação de despacho aduaneiro; - nesse período de tempo, o governo alheou-se de tal problema, sendo certo que se tratava de um serviço público e de uma profissão, para cujo exercício a administração habilitou o despachante; - o DL nº 289/88, de 24 de Agosto, institui a caução global para o desalfandegamento - artº 2º, que constitui o despachante como contribuinte aduaneiro (mandato sem representação que permitia ao estado arrecadar receitas mais facilmente); - em 1991, o governo cria o sistema automático da declaração aduaneira - STADA - que obrigou os despachantes a informatizar os seus escritórios; - pelo DL nº 89/92, de 21/5, que acolheu a doutrina do Ac. TCE (proc. 323/90 que opôs a comissão à República Portuguesa) veio permitir o exercício desta actividade, a título profissional dos procuradores dos donos das mercadorias; - o artº 4º do DL nº 280/92, de 18 de Dezembro, veio desregulamentar a profissão, passando a actividade do despachante a ser privada; - o DL nº 25/93, de 5 de Fevereiro, que teve em vista minorar o impacto das consequências negativas sobre a estabilidade do emprego, no sector, a partir de 1993, que veio a ser reforçado pelo Regulamento nº 3904/92, de 17/12; - apesar de se reconhecer que a cessação da actividade ou a sua redução abrupta não pode ser imputável ao despachante, aquele DL, no artº 9º, faz recair sobre os despachantes a obrigatoriedade legal de indemnizarem os trabalhadores ao seu serviço em 2/3 do total; - aqui o despachante é entidade patronal; - mas, no Cap. III desse diploma, são considerados como trabalhadores do sector; - não lhe sendo imputável a cessação dos contratos de trabalho, é, no entanto, obrigado a pagar um montante indemnizatório; - viola, assim, o estado o princípio da igualdade perante os encargos públicos; - com a mudança do estatuto operada com o referido DL nº 280/92, o estado rompe o vínculo que o unia aos despachantes; - ao não prever medidas indemnizatórias, o estado viola o principio da confiança - Ac. TC, de 17/8/92 - DR nº 188 - 1ª série a; - o citado DL nº 25/93 impõe à A. a obrigação de suportar 2/3 das indemnizações, pelo que está a violar o direito de igualdade, como o direito de propriedade; - quando a administração, através de nomeação, habilitou a a. A exercer a actividade de desalfandegamento de mercadorias, ela adquiriu um direito subjectivo público que, acrescido do trabalho desenvolvido, do capital investido, criou um substrato comparável ao direito de propriedade; - a A. teve, nos anos de 1990, 1991 e 1992, um volume de facturação de 817.000 contos/ano; - nos 3 anos seguintes, a facturação será de 200.000 contos/ano; - recorreu a empréstimos bancários, para a informatização, no montante de 105.000 contos, material que não conseguiu vender ou amortizar.
Para o efeito citado, a fls. 122 a 130, o réu estado, representado pelo mº pº, apresentou contestação.
Assim, por excepção, invocou a incompetência do tribunal, em razão da matéria.
Por impugnação, no essencial, sustentou que: - não contendo o artº 22º da C.R.P. os requisitos das diversas modalidades de responsabilidade do estado, cabe ao legislador ordinário a concretização constitucional da reparação dos danos; - o DL nº 48051, que rege a responsabilidade da administração por actos de gestão pública, não permite, pois, enquadrar a responsabilidade civil do estado por actos legislativos; - o artº 22º da CRP refere-se apenas à responsabilidade do Estado por factos ilícitos e culposos; - os diplomas referidos pela A. não padecem de qualquer inconstitucionalidade, nem tal lhes é imputada por aquela, não havendo, por conseguinte, ilicitude do comportamento do legislador; - a diminuição da actividade do Estado, com os naturais prejuízos decorrentes, resulta da integração de Portugal na Comunidade Europeia e não daqueles diplomas, integração essa de natureza política e que não é posta em causa pela A.; - não há violação do princípio da igualdade, não encontrando tal princípio fundamento na constituição; - não existe violação do princípio da confiança, pois entre o estado e os despachantes nunca existiu um vínculo jurídico de subordinação; - a actividade daqueles foi sempre privada, ainda que fortemente regulamentada; - não há violação do direito de propriedade, pois que, segundo o DL nº 64-A/89, de 27/2, compete à entidades patronais indemnizar os seus trabalhadores, mesmo que o despedimento se verifique devido "à extinção de postos de trabalho, por causas objectivas de ordem estrutural, tecnológica ou conjuntural relativas à empresa" (cap. V) ; - o DL nº 25/93 não tem carácter expropriatório, pois não lhe impôs sacrifícios especiais ou anormais que postulem a obrigação de indemnizar, por parte do estado.
A fls. 142/143, a A. apresentou réplica, manifestando-se, em síntese, pela improcedência da invocada excepção de incompetência do tribunal. Todavia, por despacho de fls. 152 a 155, foi julgada procedente a referida excepção da incompetência do tribunal, em razão da matéria, sendo, por isso, o R. Estado absolvido da instância.
Remetidos os autos ao Tribunal Cível de Lisboa e levada a efeito uma tentativa de conciliação, não foi possível qualquer acordo entre as partes.
A a. Juntou aos autos vários documentos, nomeadamente cópia de uma sentença do tribunal arbitral, proferida no proc.º em que foi demandante Tertil - Terminais de Portugal S.A. (fls. 189 e ss.) A fls. 171/172, a A. apresentou um articulado superveniente, fazendo referência à já referida decisão, proferida pelo tribunal arbitral, ao qual o réu estado respondeu (fls. 182/183), alegando que tal decisão refere-se a uma situação diferente daquela a que se reporta a presente acção.
A fls. 300/301, foi proferido o despacho saneador e foram elaborados a especificação e o questionário, não tendo havido...
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