Acórdão nº 11004/2001-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Março de 2003

Magistrado ResponsávelROQUE NOGUEIRA
Data da Resolução25 de Março de 2003
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 - Relatório.

No 6º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, F. Pedro e A. Ferreira propuseram acção de despejo, na forma de processo comum sumário, contra F. Barradas e mulher M. Pedro, alegando que são donos do prédio sito na Rua Bartolomeu de Gusmão, - a -, em Lisboa, e que, em 30/6/43, o proprietário de então deu de arrendamento a J. Videira uma loja, que faz parte do dito prédio, com os nºs de polícia 11 e 13.

Mais alegam que, de acordo com o que foi convencionado, o prédio foi destinado, em parte, ao comércio de frutas, hortaliças e criação, exercido num pequeno hall, situado junto à entrada, e, noutra parte, a habitação, composta por um quarto, uma cozinha, uma sala comum e um espaço para arrumos, sendo a renda, inicialmente, de 300$00, e, em 1998, de 2 980$00.

Alegam, ainda, que, no dia 21/12/97, o arrendatário faleceu, no estado de viúvo, vivendo sozinho no locado e nunca aí tendo vivido com mais ninguém, para além da esposa, pelo que, o contrato de arrendamento caducou por morte do arrendatário, recusando-se, no entanto, os réus a entregar o locado, declarando que são os únicos herdeiros daquele e manifestando a pretensão em ver transmitido a seu favor o referido contrato.

Alegam, também, que o J. Videira já vinha procedendo à venda de outros artigos na loja arrendada, designadamente, bebidas espirituosas, o que exorbita, em muito, o objecto do contrato, e que, desde a morte daquele, o réu continuou a explorar a loja, vendendo os mesmos artigos e, até, incrementando aquela venda, transformando a loja quase num supermercado.

Alegam, finalmente, que os réus se mantêm no locado, fazendo a sua exploração comercial, impedindo os autores de dispor livremente daquele espaço, que tem um valor locativo comercial de cerca de 120.000$00 mensais, pelo que, desde 21/12/98 até 31/10/98, os prejuízos dos autores ascendem a 1 200.000$00.

Concluem, assim, que deve declarar-se extinta a relação locatícia emergente do contrato de arrendamento ajuizado, quer por caducidade, quer por resolução, e ordenar-se o despejo do prédio em causa, devendo, ainda, os réus ser condenados a pagarem a quantia de 1 200 000$00, correspondente a uma indemnização devida pela utilização da loja, desde o dia 21/12/97 até ao dia 31/10/98, e, ainda, a quantia mensal de 120 000$00, por cada mês de utilização até à data da entrega efectiva da loja aos autores, com juros vencidos e vincendos, à taxa supletiva legal, até ao efectivo embolso.

Os réus contestaram, alegando que ainda que se entenda, embora não concedendo, que os bens vendidos no estabelecimento fazem extravasar os limites do fixado contratualmente, sempre o direito de pedir a resolução do contrato com tal fundamento não pode proceder, em virtude da caducidade do mesmo, por força do conhecimento de tais factos, há mais de um ano, por parte do autor.

Mais alegam que o objecto principal do contrato foi, e é, o fim comercial e que cumpriram com o disposto no nº 2, do art. 112º, do RAU, pelo que, o arrendamento transmitiu-se para os réus, sendo a ocupação que fazem do locado legítima, por devidamente titulada.

Alegam, ainda, que, quando muito, o espaço em causa poderá atingir um valor de mercado não superior a 15 000$00 mensais.

Concluem, deste modo, que deve a excepção deduzida ser considerada procedente e a acção improcedente, absolvendo-se os réus do pedido.

Os autores replicaram, concluindo que o seu direito de pedir a resolução do contrato de arrendamento não caducou, devendo a excepção ser julgada improcedente.

Seguidamente, foi proferido despacho saneador, com elaboração de especificação e questionário.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, julgando improcedente o pedido de despejo do locado e parcialmente procedente o pedido indemnizatório formulado, tendo os réus sido condenados a pagar aos autores a quantia mensal de 2 980$00 desde 21/12/98, e que à data de 21/3/01 estava liquidada em 80 460$00, bem como a quantia que se liquidar em execução de sentença, referente aos meses subsequentes, até persistir a fruição do locado, a que acrescerão juros de mora, às taxas legais.

Inconformados, os autores interpuseram recurso de apelação daquela sentença, tendo os réus interposto recurso subordinado.

Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - Fundamentos.

2.1. Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos: 1º - Os autores representam a totalidade da plena propriedade sobre o prédio sito na Rua Bartolomeu de Gusmão, - a -, em Lisboa, freguesia de Santiago, inscrito na matriz predial urbana desta freguesia, sob o art. 51 (A).

  1. - Por escrito particular, datado de 30/6/43, o proprietário de então deu de arrendamento a J. Videira uma loja, que faz parte do dito prédio, que tem os nºs de polícia 11 e 13 (B).

  2. - A renda, que teve o valor inicial de 300$00, tem sido sucessivamente actualizada, ao abrigo da respectiva legislação, estando fixada, para vigorar durante o ano de 1998, pelo valor de 2 980$00 (C).

  3. - De acordo com o que foi convencionado no dito contrato de arrendamento, o prédio foi destinado, em parte, ao comércio de frutas, hortaliças e criação, e, noutra parte, a habitação (D).

  4. - Ainda de acordo com o dito contrato de arrendamento foi convencionado que nenhum outro uso poderia ser dado ao locado (E).

  5. - O referido J. Videira faleceu no dia 21/12/97, no estado de viúvo (F).

  6. - O mesmo J. Videira, à data do seu óbito e desde o falecimento da mulher, vivia sozinho no locado (G).

  7. - O J. Videira nunca ali vivera com mais alguém para além da mulher (H).

  8. - Os réus receberam a carta que constitui o documento junto por cópia a fls.25 (I).

  9. - O réu remeteu ao autor a carta datada de 17/6/98 que constitui o documento junto por cópia a fls.26, que foi recebida pelo último em 19/6/98 (J).

  10. - Por carta registada com aviso de recepção, datada de 1/7/98 e recebida pelo réu a 3/7/98, o autor informou-o de que a carta que ele lhe havia remetido, aludida em J, «não vinha acompanhada dos documentos autênticos ou autenticados que comprovem os seus direitos» e que «nessa medida, (...) caducou o arrendamento relativo à Loja sita na Rua Bartolomeu de Gusmão, nºs - a -, em Lisboa», pelo que «deve (...) entregar-me a dita Loja, livre e desocupada».

  11. - Por testamento lavrado em 11/2/92, no 27º Cartório Notarial de Lisboa, o primitivo arrendatário, J. Videira, instituiu como seus únicos herdeiros, e em partes iguais, os ora réus, F. Barradas e mulher M. Pedro (M).

  12. - Por escritura lavrada em 4/3/98, no 18º Cartório Notarial de Lisboa, os réus habilitaram-se na sucessão à herança do falecido J. Videira (N).

  13. - A área ocupada pela parte destinada à habitação é composta por um quarto, uma cozinha, uma sala comum e um espaço para arrumos (1).

  14. - A área destinada ao comércio de frutas, hortaliças e criação é constituída por um pequeno «hall»...

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