Acórdão nº 0589/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Julho de 2011

Data06 Julho 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública, no âmbito dos processos de execução fiscal nº 3506200601004654 (principal) e nº 3506200601005596 (apenso), recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgou procedente a reclamação apresentada por A…, Lda., nos termos do art. 276° do CPPT, contra o acto que procedeu à compensação da dívida exequenda – IVA e juros compensatórios referente aos anos de 2002, 2003 e 2004, no montante de € 9.159,64 – com o seu crédito de IVA no valor de € 12.680,17.

1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que concedeu provimento à reclamação e anulou o acto de compensação de dívidas de tributos, por considerar tal acto de compensação ferido de ilegalidade por violação do princípio da boa-fé, na medida em que é susceptível de trair a confiança da reclamante na actuação da Administração Tributária.

B. A compensação é uma forma de extinção de obrigações com base na circunstância de duas pessoas ou entidades serem simultânea e reciprocamente credor e devedor, prevista expressamente no art. 40°, nº 2 da LGT para os créditos tributários.

C. Por sua vez, o art. 89° do CPPT determina que os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação judicial de qualquer acto tributário, são obrigatoriamente aplicados na compensação das dívidas à Administração Tributária, excepto se estiver a correr prazo para interposição de meio gracioso ou judicial, ou se estiver pendente um destes meios, desde que a dívida se encontre garantida nos termos do art. 169° do CPPT.

D. No caso em concreto, só após a caducidade da garantia bancária anteriormente prestada, como prevista expressamente na mesma, é que a Administração Tributária operou a compensação reclamada, sufragando-se na correcta interpretação do disposto na al. b) do nº 1 do art. 89° do CPPT, que “a contrario”, obriga que a Administração Tributária efectue a aplicação de um crédito do executado na compensação das suas dívidas tributárias, desde que a dívida não se mostre garantida nos termos do art. 169° do CPPT, mesmo que esteja pendente processo judicial.

E. Entende a Fazenda Pública que o objecto da reclamação apresentada é tão só a conformidade do acto de compensação ao preceito aplicável – o art. 89° do CPPT, uma vez que a reclamante entendia que a garantia que havia prestado aquando da apresentação da reclamação graciosa se mantinha na pendência da impugnação, encontrando-se a dívida garantida.

F. A compensação efectuada é assim, legal, porque preencheu os requisitos exigidos por lei, designadamente no art. 89° do CPPT, aqui aplicável, porquanto, a dívida exequenda não se mostrava garantida nos termos do art. 169° do CPPT.

Aliás, G. Assim o entendeu a Meritíssima Juiz de Direito, quando concluiu que não se encontravam “verificados os pressupostos legais que proíbem que a Administração Tributária proceda à compensação das dívidas – uma vez que, apesar de pender impugnação judicial, à data da compensação não existia garantia validamente prestada (por ter caducado anteriormente)”.

Todavia, H. Decidiu o Tribunal a quo, que no caso em concreto, impunha-se à Administração Tributária, em ordem ao cumprimento do princípio da boa fé que notificasse a reclamante, para, querendo, prestar nova garantia antes de proceder à compensação. Não o tendo feito, violou este princípio, na medida em que é susceptível de ter traído a confiança da reclamante sem que tivesse previamente tido oportunidade de prestar nova garantia de modo a obstar à prática do acto reclamado.

Ora, I. De facto, a Administração Tributária, deve, no exercício das suas funções, actuar com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, ponderando os valores fundamentais do direito, designadamente, a confiança suscitada pela sua actuação e o objectivo a alcançar.

J. No entanto, deve o princípio da boa-fé ser conjugado com os restantes princípios norteadores da actividade administrativa tributária, designadamente com o da legalidade, pelo que, quando a Administração Tributária actua com poderes vinculados, o respectivo acto será legal ou ilegal consoante respeite ou não o quadro rigorosamente desenhado na lei, e este foi no caso em concreto respeitado.

K. Reunidos os pressupostos exigidos por lei para que a compensação operasse, e não reunidos os requisitos para que a mesma fosse proibida, impunha-se à Administração Tributária a obrigação de efectuar a compensação na dívida cuja execução não se encontrava garantida, apesar de se encontrar pendente impugnação judicial atinente à legalidade da dívida exequenda.

L. Entende a Fazenda Pública ser de afastar a resolução do litígio com fundamento no princípio da boa-fé, pela alegada quebra da confiança do contribuinte, como se decidiu na douta sentença recorrida, porquanto, estamos perante um acto estritamente vinculado à lei, e a situação daquele que actua na convicção de proceder em conformidade com o Direito é jurídica e autonomamente protegida na ordem jurídica.

M. Como referido no Acórdão do STA de 30.4.03 (Pleno), proferido no recurso nº 47275/02, cujo sumário em parte aqui nos permitimos citar: “O princípio da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático (art. 2º da C.R.P.), postula um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhes são juridicamente criadas, censurando as afectações inadmissíveis, arbitrárias ou excessivamente onerosas, com as quais não se poderia razoavelmente contar.” N. O princípio da confiança implica assim um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhe são juridicamente criadas, censurando-se as afectações arbitrárias, com as quais não poderia a reclamante razoavelmente contar.

O. Como decorre dos autos, a garantia bancária prestada pela reclamante aquando da pendência da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações em cobrança coerciva, previa expressamente que a mesma só era válida por 3 (três) anos, pelo que, caducou em 18.07.2009.

P. Decorrido o prazo de validade da garantia prestada, a mesma deixou de produzir os seus efeitos, determinando concomitantemente que fosse levantada a suspensão do processo de execução fiscal, por falta de reunião dos requisitos para a mesma.

Q. Nesta data, já havia sido decidida a reclamação graciosa oportunamente apresentada, de cuja decisão, por parcialmente deferida, recorreu hierarquicamente a reclamante, tendo sido notificada do despacho de indeferimento em 22.05.2009, do qual apresentou impugnação judicial em 01.09.2009, a qual corre os seus termos no Tribunal a quo.

Assim, R. Desde a data em que ocorreu a caducidade da garantia apresentada – 19.07.2009 – que a dívida não se encontrava garantida, e desde essa data, não tendo sido apresentada qualquer outra garantia por parte da reclamante, que bem sabia ou tinha obrigação de saber que a mesma caducara, correu o processo de execução fiscal os seus devidos termos para cobrança da dívida em cobrança coerciva.

S. Ademais, não deu a reclamante sequer conhecimento aos autos de execução fiscal que após os meios graciosos apresentados (reclamação graciosa e recurso hierárquico), havia apresentado em 01.09.2009 impugnação judicial contra as liquidações em dívida, na sequência do indeferimento do recurso hierárquico, T. pelo que, nada mais havia a fazer por parte da Administração Tributária senão proceder à compensação do crédito na dívida tributária, uma vez que se preenchiam todos os pressupostos exigidos legalmente, e a tal acto estava obrigada.

U. Não existiu qualquer violação do princípio da confiança da reclamante na actuação da Administração Tributária, porquanto, e ao contrário do que entende o Tribunal a quo, bem sabia a reclamante que a garantia bancária por si prestada havia caducado, por expressamente a mesma prever tal caducidade, e, V. oportunidade de prestar nova garantia teve-a sempre ao seu dispor nos termos do art. 199° do CPPT a partir do momento em que apresentou impugnação judicial no Tribunal a quo, facto esse do qual não deu conhecimento à Administração Tributária no competente processo de execução fiscal.

Assim, W. A Administração Tributária na prática do acto de compensação reclamado cumpriu o legalmente preceituado, não violando o princípio da boa-fé, na medida em que não violou a confiança da reclamante na sua actuação, X. pois, sabendo a reclamante que a garantia antes prestada havia caducado, poderia a qualquer momento ocorrer um facto extintivo da prestação tributária em dívida, como seja, a compensação efectuada.

Y...

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