Acórdão nº 0633963 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Setembro de 2006

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução14 de Setembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO: No 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Lamego, B………., solteiro, maior, residente na Rua ………., n.° …, Porto, instaurou acção declarativa de condenação (acção de preferência), com forma de processo sumário contra a sociedade C………, Lda., com sede na ………., n.° …, sala .., Barcelos e a Massa Falida de D………., representada pelo Liquidatário E………., com domicílio na ………., n.° …, Porto e Rua ………., n.° …, Viana do Castelo.

Alega, em síntese: Que o A. é comproprietário de 1/4 dos prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Tarouca, sob o n.°s 1109, 1150 e 1151, prédios esses que, na proporção de 1/4, foram adjudicados à primeira Ré, pelo preço de 1.200.000$00, por instrumento de venda lavrado nos autos de apreensão de bens e liquidação do activo, no qual foi declarada falida a segunda Ré, D………., sem que ao A. tivesse sido comunicado o respectivo projecto de adjudicação (venda).

Alega, assim, o A. que em virtude de não ter tido conhecimento da venda judicial levada a efeito naqueles autos, ficou impossibilitado de exercer o seu direito de preferência.

Pede: Que, julgada a acção procedente, sejam as Rés condenadas a reconhecerem o direito de preferência do A. na venda judicial dos prédios supra identificados, sendo, por isso, reconhecido ao A. o direito de haver para si as referidas verbas, substituindo-se em tal venda à adquirente aqui primeira Ré.

Regularmente citadas as RR. vieram contestar impugnando os factos articulados pelo A. e alegando que foi comunicado aos comproprietários o preço e as condições de pagamento, em suma, a venda dos aludidos prédios e se não exerceram o direito de preferência foi porque não quiseram, acrescentado que era do conhecimento do Autor o estado de falência de sua irmã D……… .

Mais deduziram reconvenção, pedindo que o Autor fosse condenado no pagamento de todas as despesas relacionadas com a celebração do negócio aqui em questão, no montante a ser determinado em sede de execução de sentença.

Terminam pedindo que a acção seja julgada improcedente, por não provada e procedente a reconvençção.

A fls. 68 e segs. o A. respondeu.

Foi proferido despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto (fls. 91-93).

Realizou-se julgamento, tendo o Tribunal respondido aos quesitos pela forma exarada no despacho de fls. 168 e segs..

Foi, por fim, sentenciada a causa nos seguintes termos: "…decide-se julgar procedente a acção, e consequentemente: 111.1) Reconhecer ao Autor B………. o direito de preferir na venda judicial operada no âmbito do processo de apreensão de bens apenso ao processo de falência n.° ../98, do 1° juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, operada através do Instrumento de Venda de 11 de Novembro de 2000 e, por via disso, reconhecer ao Autor o direito de haver para si, uma quarta parte do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Tarouca, sob o n.° 01109/300994, inscrito na matriz sob o artigo 141, e uma quarta parte dos prédios rústicos descritos na Conservatória do Registo Predial de Tarouca, sob os n.°s 01150/101194 e 01151/101194, inscritos nas matriz sob os artigos 5361 e 5929 respectivamente, que foram objecto de venda, passando o Autor a ocupar na dita venda o lugar de comprador.

111.2) Ordenar o cancelamento da inscrição G-1 relativa aos imóveis descritos na Conservatória do Registo Predial de Tarouca, sob o n.° 03/060201".

Inconformados com a sentença, dela vieram recorrer os réus, apresentando alegações que rematam com as seguintes "CONCLUSÕES: Em face de quanto foi dito, extraem-se as seguintes conclusões: 1) Apesar de não ter sido suscitada a ilegitimidade do A., resulta da lei e da jurisprudência dominante que, havendo direito de preferência simultâneo ou concorrente de direitos de preferência, como no caso dos autos, o preferente terá, excepto se provar a renúncia dos outros consortes, de propor a acção conjuntamente com estes ou provocar a sua intervenção, sob pena de ilegitimidade; 2) Resulta daqui a necessidade de litisconsórcio activo, que não foi observada na acção instaurada pelo A., não tendo o Tribunal a quo verificado sequer oficiosamente tal pressuposto; 3) O A., sendo comproprietário conjuntamente com, pelo menos, sua mãe (titular de metade dos bens), F………., teria de instaurar a acção em conjunto com ela, ou, não o tendo feito na petição inicial, teria de provocar tempestivamente a sua intervenção; 4) O A., não fez uma coisa nem outra, pois, instaurou a acção desacompanhado dos demais com proprietários; 5) A noção de compropriedade resulta do disposto no artigo 1.403° do CC, segundo o qual, existe propriedade em comum, compropriedade, quando suas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa; 6) Os direitos dos consortes ou com proprietários sobre a coisa comum são qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes, presumindo-se que as quotas são quantitativamente iguais na falta de indicação em contrário do título constitutivo, e exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; 7) Se a lei ou o negócio exigir a intervenção de vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade, sendo igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal; 8) São exemplos do litisconsórcio necessário activo as hipóteses previstas nos artigos 419°-1 (direito de preferência com pluralidade de titulares) e 2091°-1 (exercício de direitos de herança) do CC; 9) A jurisprudência dominante no sentido da ilegitimidade do apelado e do litisconsórcio necessário activo é a que consta dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-12-1999, in BMJ 492, pp. 391, proferido por unanimidade no âmbito do processo n° 99B914; de 22/01/1987, in BMJ 363, pp. 523; de 14/04/1986, in BMJ 376, pp 569; Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, nomeadamente, os acórdãos de 02/04/1986, in CJ, Ano XI, Tomo lI, pp.1 912; de 27/05/1993, in BMJ 427, pp. 582; de 10/02/1981, in BMJ 309, pp. 398, entre outros acórdãos da Relação de Lisboa e de Évora; 10) Também em sede de processo especial de notificação para preferência, previsto no artigo 1.465° do CPC, este não tem lugar quando os interessados na preferência são com proprietários e, nesse caso, a acção tem de ser proposta por todos eles, sob pena de ilegitimidade - Acórdão do STJ, de 03-06-1992, proferido no âmbito do processo n° 082049, in www.dqsi.pt/istj.nsf/; 11) A acção que o A. instaurou, tal como a configurou, reveste a natureza de uma acção constitutiva, uma acção de preferência, materialmente sustentada pelo artigo 1.410° do CC e, como a acção foi instaurada, e não tendo o A. requerido a intervenção provocada dos restantes com proprietários, designadamente, a sua referida mãe, carece aquele de legitimidade para intentar a acção, por não ter sido observado o litisconsórcio necessário activo.

12) O Tribunal a quo cometeu nulidade, para os efeitos do disposto no artigo 201° do CPC, ao não ouvir a testemunha E………., liquidatário judicial da Massa Falida de D………., pela sua qualidade de liquidatário judicial no processo de falência daquela Massa Falida, sendo a omissão de tal formalidade que a lei prescreve susceptível, no caso, de influir na decisão da causa, uma vez que se trata de pessoa sobre a qual não vigora qualquer impedimento ou inabilidade legal.

13) Tal testemunha não se enquadra no normativo constante do artigo 617°, nem nas incapacidades do disposto no artigo 616°, ambos do CPC.

14) Deveria, ainda, o Tribunal a quo considerar procedente a reconvenção deduzida pela apelante, uma vez que os prejuízos que alegou ter sofrido, e que remeteu para sede de execução de sentença, se enquadram no âmbito do disposto no artigo 274° n° 2 alíneas a) e b) do CPC.

15) Tais prejuízos foram efectivamente suportados pela apelante, e relacionam-se directamente com os factos jurídicos que servem de fundamento à acção.

16) O Tribunal a quo fundamenta que tais despesas caem fora do âmbito do disposto no artigo 1.4100 do CC, porém, tal norma estabelece os pressupostos que hão-de presidir à efectivação da acção de preferência, não se relacionando directamente com as citadas despesas.

17) As despesas relativas a deslocações e tempo perdido pelo representante legal da apelante não têm, necessária e exclusivamente de ser exigidas ao abrigo do instituto da responsabilidade pré-contratual.

18) O entendimento da sentença a quo viola os normativos constante dos artigos 1.405° do CC e 28°, 274° n° 2 alíneas b) e c), 616° e 617° todos do CPC; 19) Por força de todas as anteriores conclusões o tribunal a quo não deveria ter proferido a decisão recorrida, a qual, face ao entendimento dos tribunais superiores não pode colher.

Termos em que, e nos mais de Direito que Vs. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências.".

Contra-alegou o autor, sustentando a manutenção do sentenciado.

Foram colhidos os vistos.

  1. FUNDAMENTAÇÃO II. 1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: - O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); - Nos recursos se apreciam questões e não razões; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões a resolver são as seguintes: - Da ilegitimidade activa do autor/comproprietário para a instauração da acção; - Da não audição, como testemunha, do liquidatário judicial da massa falida e se tal constitui nulidade nos termos do artº 201º do CPC; - Da procedência do pedido reconvencional.

  2. 2. FACTOS...

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