Acórdão nº 0031534 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2001
Magistrado Responsável | SOUSA LEITE |
Data da Resolução | 01 de Março de 2001 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I - António... intentou no tribunal de círculo de Penafiel a presente acção ordinária contra ... & Companhia, S.A., na qual peticionou que seja judicialmente reconhecida a nulidade de um contrato - promessa devidamente identificado nos autos, e que, em consequência de tal declaração de nulidade, a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de esc. 9.867.000$00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação.
Para tal, alegou ter celebrado com a Ré, em 15 de Junho de 1992, um contrato-promessa tendo por objecto uma loja sita nos Edifícios..., na cidade do Porto, tendo sido estabelecido o preço de esc. 29.900.000$00, por conta do qual o A., por várias vezes, a título de sinal e de reforço do mesmo, entregou à Ré a quantia que ora peticiona.
Com efeito, o referido documento não contêm o reconhecimento presencial das assinaturas dos promitentes vendedor e comprador, nem a certificação, pelo notário, da existência da licença de habitação ou de construção, pelo que tal contrato é nulo.
Contestando, a Ré aceita as omissões apontadas pelo A. no documento titulador do contrato celebrado, alegando que, até 95/02/18, data em que recebeu uma carta daquele em tal sentido, nunca o mesmo havia arguido tais omissões, pelo que a sua actuação enferma de abuso de direito.
Na réplica, o A. manteve o alegado na petição inicial.
Com fundamento em documento junto pela Ré, o Senhor Juiz do tribunal onde a acção havia sido proposta, excepcionou a incompetência territorial daquele tribunal, ordenando a remessa dos autos à comarca do Porto, onde foram distribuídos ao 3º juízo cível.
Proferido despacho saneador, foi elaborada a factualidade assente e organizada a base instrutória, que não foram objecto de qualquer reclamação.
A Ré veio requerer, aquando da apresentação dos meios de prova, o depoimento de parte do A, tendo o Senhor Juiz, pelo despacho de fls. 92v. admitido tal depoimento, a prestar em audiência de julgamento.
De tal despacho o A. agravou, recurso esse a que foi atribuído efeito devolutivo e regime de subida diferida.
Realizada a audiência de julgamento, o tribunal respondeu à matéria da base instrutória pela forma que consta do acórdão de fls. 139.
Proferida sentença, a acção foi julgada totalmente improcedente.
De tal decisão o A. apelou, tendo, nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões: A) O contrato-promessa de compra e venda dos autos não contêm o reconhecimento presencial das assinaturas dos promitentes vendedora e comprador e aquando da respectiva assinatura ainda não fora emitida a licença de construção, cuja existência não foi certificada notarialmente, o que era exigido pelo art. 410º, n.º 3 do CC; B) Porque tais exigências são motivadas por razões de interesse e ordem pública, a respectiva omissão integra nulidades não sanáveis; C) O regime das nulidades, previsto nos arts. 285º e segs., do CPC(leia-se CC), nomeadamente o emergente do não cumprimento das citadas exigências, obsta em absoluto à procedência da arguição fundada em abuso de direito; D) Entendendo que a concessão posterior da licença de construção sana a nulidade emergente da sua inexistência na data da assinatura do contrato--promessa e que é invocável o abuso de direito contra a arguição das nulidades supra referidas, a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 285º, 286º, 288º, 289º e 410º, n.º 3 do CC que deverão ser interpretados no sentido propugnado nestas alegações e conclusões; E) O instituto do abuso de direito exige uma ponderação global da situação considerada, exigindo-se que dela resulte que o eventual exercício excessivo do direito seja clamoroso; F) O recorrente não contribuiu para a omissão das exigências do art. 410º, n.º 3 do CC e só invocou as nulidades da respectiva omissão depois da recorrida ter unilateralmente decidido marcar a escritura depois do prazo limite fixado no contrato-promessa; G) A conduta do A. não revela um venire contra factum proprium em ordem a integrar o excessivo exercício do direito de pedir o reconhecimento e a declaração das apontadas nulidades, com violação dos limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito; H) Ao decidir pela verificação de abuso de direito por parte do A., a decisão apelada fez errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 334º e 410º, n.º 3 do CC, que deverão ser interpretados no sentido propugnado nestas alegações e conclusões; I) Pede-se e espera-se, assim, que seja provida a presente apelação, revogando-se a sentença recorrida e julgando-se a acção procedente.
Contra alegando, a apelada pronunciou-se pela confirmação da decisão recorrida.
A convite do relator, para apresentação das conclusões do agravo antecedentemente interposto e para o cumprimento do preceituado no art. 748º do CPC, o A. veio comunicar a sua perda de interesse no prosseguimento do referido agravo, tendo, pelo despacho de fls. 192, sido, quanto ao mesmo, julgada extinta a respectiva instância de recurso.
Colhidos os vistos legais, há que decidir.
II - Cumpre, desde já, enunciar a matéria de facto considerada como provada pelo tribunal de 1ª instância, e a cuja alteração, no uso da faculdade prevista no art. 712º, n.º 1 do CPC, por totalmente despicienda de necessidade, não há que proceder, devendo, todavia, esclarecer-se que, por manifesto lapso, na sentença proferida não foi enumerada, na fundamentação de facto, a matéria vertida na al. R) dos factos assentes, aditada em sede de audiência de julgamento - vide fls. 135 e segs.
Estão portanto provados, depois de devidamente ordenados - RLJ 129º/51 -, os seguintes factos: "Em 15 de Junho de 1992, o A. subscreveu um documento em que declarou que prometia comprar à Ré, e esta declarou que pretendia vender, uma loja no piso +1 do prédio do lote n.º 6, nos Edifícios..., sitos no Porto, a que corresponde a fracção CI na respectiva propriedade horizontal - (A).
O referido...
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