Acórdão nº 4297/2007-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2007
Data | 12 Julho 2007 |
Órgão | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).
I - RELATÓRIO.
Intentou E.[…]SA, actualmente dissolvida, e substituída nos presentes autos pelo Ministério Público, em representação do Estado, a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Maria […], pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 9.202.706$00, acrescida de juros vencidos, que até à data da instauração da acção calculou em 1.275.436$00, bem como naqueles que desde então se venceram e até integral pagamento.
Para o efeito alegou, em síntese, que a A., no exercício da sua actividade, forneceu ao marido da Ré, Ventura […], diversas mercadorias, descritas nas facturas juntas aos autos, pelo preço global de 9.202.706$00.
A A. e o marido da Ré acordaram que o não pagamento de facturas na data do vencimento determina a cobrança de juros de mora à taxa de 18% ao ano. Instado para pagar a referida quantia, o marido da Ré nada pagou.
A Ré é casada com Ventura […] no regime de comunhão de adquiridos, desde antes de 1996.
O marido da Ré é agricultor e contratou os fornecimentos aludidos com a autora no exercício da sua actividade. Tais fornecimentos destinaram-se a ser aplicados em diversas propriedades agrícolas que eram exploradas conjuntamente pela Ré e por seu marido.
Tanto a Ré como o seu marido beneficiaram dos resultados da exploração daquelas propriedades em que foram aplicadas os produtos fornecidos pela A.. Acresce que a Ré e o seu marido vivem em comunhão de cama, mesa e habitação, mantendo entre si economia comum relativamente às necessidades e despesas da sua vida familiar.
O agregado familiar constituído pela Ré e seu marido vive dos rendimentos por este obtido como agricultor. Esse agregado familiar e, consequentemente a Ré, beneficiou dos fornecimentos da autora e do resultado da aplicação pelo marido da Ré na satisfação de despesas normais da vida familiar de ambos Sucede, assim, que a dívida contraída pelo marido da Ré perante a A. se destinou a ocorrer aos encargos da vida familiar de ambos e foi contraída no âmbito da administração de bens da Ré e seu marido e em proveito comum do casal.
Citada, a Ré não apresentou contestação, pelo que foi proferido despacho declarando confessados os factos articulados pela A., considerando não se verificarem quaisquer dos condicionalismos previstos no art. 485° do CPC, tratando-se duma relação jurídica disponível ( cfr. fls. 26 ).
Proferiu-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente, tendo a Ré sido condenada no pagamento da quantia de € 45.902,00 ( 9.202.206$00 ), acrescida de juros de mora à taxa legal desde o vencimento das respectivas facturas e até integral pagamento ( cfr. fls. 235 a 236 ).
Notificada de tal sentença, veio a Ré arguir a nulidade da sua citação e consequente declaração de nulidade de todo o processado posterior ( cfr. fls. 246 a 251 ).
O Mº Público emitiu parecer no sentido de ser considerada manifestamente improcedente a arguida nulidade ( cfr. fls. 265 a 266 ).
Foi proferido despacho que indeferiu a arguida nulidade ( cfr. fls. 267 a 268 ).
Inconformada, a Ré interpôs recurso, que foi admitido como de agravo ( cfr. fls. 310 ).
Juntas as competentes alegações a fls. 331 a 347, apresentou a agravante as seguintes conclusões : 1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho que indeferiu a nulidade da citação arguida pela Ré.
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Andou mal o Mm. Juiz do Tribunal a quo ao alegar que na citação efectuada a fls. 25 dos autos foram observadas as formalidades prescritas na lei e que se a ora agravante não teve conhecimento daquela, são situações que devem ser imputáveis apenas àquela, devendo, por isso, assumir as suas consequências.
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A ora agravante cumpriu meticulosamente todos os trâmites legais.
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As falhas foram dos serviços do Tribunal e não da agravante, como se pode facilmente constatar nos autos.
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O tribunal citou o marido da agravante, Ventura […], quando esta era a única Ré no processo.
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Tendo o Tribunal escrito a Ventura […] informando-o que ele tinha sido citado em terceira pessoa e não tendo havido nenhuma outra citação para além da referida, não podiam, nem um nem outro dos destinatários, deixar de concluir que afinal a citação era, tão só, para o marido da agravante.
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Ao ter citado o marido da agravante, e considerando, mal, que a acção seria contra ambos os cônjuges, sempre teria a secretaria do tribunal que enviar uma carta de citação para cada um deles 8. Só assim seria exigível, à ora agravante, a apreensão da função da citação de fls. 25.
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A funcionalidade da citação foi, nos presentes autos, totalmente frustrada, pelo que o acto da citação só formal e aparentemente se pode considerar verificado.
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Nos termos e para os efeitos do disposto no art. 161º, nº 6 do CPC, não pode a agravante ser prejudicada por um facto, que ao contrário do referido pelo Tribunal a quo, é imputável à secretaria judicial do mesmo.
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Ao ter indeferido a nulidade arguida pelo ora agravante, o Tribunal a quo, sonegou, entre outros, o aceso ao Direito e à Justiça da ora agravante, previsto no art. 20º da CRP e os princípios fundamentais do processo civil do contraditório e da igualdade processual das partes.
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O Mm. Juiz do Tribunal a quo, violou, entre outros, o disposto nos arts. 3º, nº 1, 2ª parte e 3, 3º-A, 198º, nº 1 e 235º, todos do CPC e o disposto no art. 20º da Constituição da República Portuguesa.
Conclui, assim, pela revogação do despacho recorrido e pela sua substituição por outro que defira a arguida nulidade de citação da Ré e proceda à sua absolvição das custas do incidente de fls. 268 dos autos.
O Mº Público contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
O Sr. Juiz de 1ª Instância sustentou a decisão proferida ( cfr. fls. 361 ).
Também inconformada com a sentença proferida, interpôs a Ré recurso que foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 278 ).
Juntas as competentes alegações a fls. 288 a 309, apresentou a apelante as seguintes conclusões : 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. 235 e ss. que julgou parcialmente procedente a acção e, consequentemente, condenou a ora apelante no pagamento à A. da quantia de € 45.902,00 acrescida de juros de mora à taxa legal desde o vencimento das respectivas facturas e até integral pagamento.
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Entendeu o Tribunal a quo que a Ré foi regularmente citada, e não contestou, pelo que considerou provados por confissão os factos articulados pela A.
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Não só o processo seguiu os seus termos na total revelia da ora apelante ( questão a apreciar em recurso de agravo de despacho de fls. 267 a 269, com influência para a decisão da causa ), como mesmo que assim não se entenda - o que não se concede, mas se equaciona por mero dever de patrocínio - não podia a fala de contestação da ora apelante ter o efeito cominatório que o Tribunal a quo lhe conferiu.
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A A. na p.i. apresentada não fez qualquer prova do sustentado, nem particularizou o alegado, tendo feito apenas a mera reprodução de conceitos jurídicos.
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Nos termos e para os efeitos do disposto no art. 1691º, nº 3 do CC, o proveito comum do casal não se presume.
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Resulta, ainda, do art.º 342º, nº 1, do CC que incumbe ao credor que pretenda responsabilizar ambos os cônjuges pela pagamento da dívida contraída apenas por um deles nos casos previstos no nº 1 do art. 1691º, articular e provar, factos de que possa efectivamente concluir-se a existência de proveito comum.
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O que não foi feito.
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Termos em que, não poderia o Tribunal a quo ter dado os factos alegados na p.i., como provados.
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Acresce que, o peticionado pela A. configura uma manifesta manobra abusiva e de ostensiva má fé, que cumpre aqui ser apreciada.
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A acção sub judice deu entrada, em 23/05/1997, após a entrega e...
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