Acórdão nº 02746/06.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO D…, residente no Porto, inconformado com a sentença do TAF do Porto, datada de 13.JAN.07, que julgou improcedente o pedido de adopção de PROVIDÊNCIAS CAUTELARES, oportunamente por si deduzido, contra a Câmara Municipal do Porto, consistente na suspensão de eficácia do despacho do Vereador dos Recursos Humanos da Câmara Municipal do Porto, datado de 10.AGO.06, que revogou a autorização para acumulação das suas funções na Câmara com o exercício da profissão liberal fora das horas de serviço, que lhe havia sido concedida em 1993, recorreu para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: A sentença recorrida: a) é nula, por falta de fundamentação, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do CPC, por carecer de indicação das razões conducentes à inconsideração da evidência da ilegalidade do acto suspendendo, limitando-se a referir que a verificação dessa evidência “pressupõe uma análise mais aprofundada”; b) sofre de erro de julgamento, em virtude de não considerar a existência da evidência da ilegalidade do acto suspendendo prevista na alínea a), do artigo 120.º, n.º 1, do CPTA, quando o processo judicial e o processo administrativo demonstram abundantemente essa evidência; c) sofre de erro de julgamento, por, tratando-se de uma providência conservatória, não considerar o perigo da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, nos termos previstos no artigo 120.º, n.º 1, alínea b), do CPTA, não obstante as regras do senso comum e o conhecimento médio do mundo e da vida conduzirem à evidência de que os efeitos prolongados do acto suspendendo implicavam inelutavelmente aquelas consequências.

O Recorrido contra-alegou, tendo, apresentado, por seu lado, as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida não sofre de erro de julgamento por não ter decretado a providência requerida com base no “critério da evidência”.

  1. O que está em causa no “critério da evidência” são, tão-só e apenas, situações excepcionais, mais concretamente aquelas em que se afigure evidentemente flagrante a sua procedência no quadro do processo principal.

  2. A sentença recorrida não deixa de estar fundamentada pelo facto de afirmar que a verificação dos vícios invocados pelo Recorrente, à data Autor, pressupõe uma análise mais aprofundada.

  3. Quando se diz que algo necessita de exame de maior detalhe é porque, naturalmente, não há qualquer evidência.

  4. É ao requerente de uma providência cautelar que compete a revelação da eventual evidência da procedência da sua pretensão.

  5. Não é legítimo pedir ao tribunal que, para fundamentar a rejeição providência requerida com apelo ao “critério da evidência”, tenha ele próprio que evidenciar a evidência da não procedência da pretensão do requerente.

  6. Para obter o decretamento de uma providência ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, o requerente tem de fazer prova do “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação”.

  7. O Recorrente invoca que a cessação da actividade profissional liberal produz uma “situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação”, mas não logrou demonstrar ter um só cliente.

  8. A titularidade, há 13 anos, de uma autorização para o exercício da actividade privada de arquitecto nada prova quanto à existência de clientela, nem o prova o facto de ter reagido de várias formas aquando da revogação dessa autorização.

  9. Mesmo a prova da existência de prejuízos não é suficiente para o decretamento de uma providência, sendo depois disso ainda necessário demonstrar uma dificuldade qualificada no restabelecimento da situação.

O Dignº Procurador-Geral Adjunto emitiu pronúncia nesta instância, no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa de vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.

II- QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO A apreciação do presente recurso jurisdicional radica em determinar se a sentença recorrida enferma de nulidade por falta de fundamentação, no tocante à apreciação do pressuposto das providências cautelares constante da alínea a) do nº 1 do artº 120º do CPTA; e, por outro lado, se incorreu em erro de julgamento no que concerne ao conhecimento dos requisitos dos procedimentos cautelares, com referência à providência requerida, maxime dos requisitos enunciados pelas alíneas a) e b) do nº 1 do mesmo normativo legal.

III- FUNDAMENTAÇÃO III-1.

Matéria de facto A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos: a) O requerente é arquitecto, em exercício de funções na entidade requerida – facto admitido por acordo das partes e decorrente da generalidade dos documentos juntos aos autos.

  1. Em 21/11/1991, requereu ao Presidente da Câmara Municipal do Porto autorização para acumular o exercício de funções na entidade requerida com a prática da profissão liberal – cfr. documento n.º 1 junto aos autos com o requerimento inicial.

  2. Em 09/02/1993, foi autorizada ao ora requerente a acumulação de funções referenciada – cfr. documento n.º 2 junto com o requerimento inicial.

    d) Em 10/08/2006, o Vereador, M…, no uso de competência delegada, revogou a autorização para acumulação de actividades privadas que foi concedida ao ora requerente em 09/02/1993 (acto suspendendo) – cfr. documentos n.º 6 e 8 juntos com o requerimento inicial, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido; e e) Em 26/10/2006, o requerente solicitou a presente providência cautelar, conforme carimbo aposto no rosto do requerimento inicial e registo informático - SITAF.

    III-2.

    Matéria de direito Como atrás se deixou dito, constitui objecto do presente recurso jurisdicional, determinar se a sentença impugnada padece de nulidade processual decorrente da falta de fundamentação, concernente ao conhecimento do pressuposto das providências cautelares inserto na alínea a) do nº 1 do artº 120º do CPTA; e, por outro lado, se incorreu em erro de julgamento quanto à apreciação dos pressupostos ou critérios de decisão das providências cautelares, com referência à Providências requerida, enunciados nas alíneas a) a b) do nº 1 do mesmo normativo legal.

    III-2.1 Da nulidade da sentença, por falta de fundamentação.

    Sustenta o Recorrente ser nula a sentença, por falta de fundamentação, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do CPC, por carecer de indicação das razões conducentes à inconsideração da evidência da ilegalidade do acto suspendendo, limitando-se a referir que a verificação dessa evidência “pressupõe uma análise mais aprofundada”.

    Em matéria de recursos jurisdicionais e respectivo regime aplicável, estabelece o art. 140º do CPTA que: “Os recursos ordinários das decisões jurisdicionais proferidas pelos tribunais administrativos regem-se pelo disposto na lei processual civil, com as necessárias adaptações (…)”.

    Por outro lado, dispõe o art. 659º do CPC, sob a epígrafe de “Sentença”, que: “1 - A sentença começa por identificar as partes e o objecto do litígio, fixando as questões que ao tribunal cumpre solucionar.

    2 - Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.

    3 - Na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documento ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.

    (…).” Paralelamente, dispõe-se no artº 94º do CPTA, sob a epígrafe “Conteúdo da sentença ou acórdão”, que: 1 – A sentença ou acórdão começa com a identificação das partes e do objecto do processo e com a fixação das questões de mérito que ao tribunal cumpra solucionar, ao que se segue a apresentação dos fundamentos e a decisão final.

    2 – Os fundamentos podem ser formulados sob a forma de considerandos, devendo discriminar os factos provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.

    3 – Quando o juiz ou relator considere que a questão de direito a resolver é simples, designadamente por já ter sido apreciada por tribunal, de modo uniforme e reiterado, ou que a pretensão é manifestamente infundada, a fundamentação da decisão pode ser sumária, podendo consistir na simples remissão para decisão precedente, de que se junte cópia.”.

    Por seu lado, estipula-se no art. 668º, ainda do CPC, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença”, que: “1 - É nula a sentença:

    a) Quando não contenha a assinatura do juiz; b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifica a decisão; c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão; d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. (...).” Finalmente, contém-se no artº 712.º do CPC, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, no seu nº 4 que: (...) 4. Se não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do nº 1, permitam a reapreciação da matéria de facto, pode a Relação anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na lª instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão.

    (...)”.

    Da concatenação de tais normativos legais resulta que a lei exige, sob pena de nulidade que a sentença contenha a discriminação dos factos que se considerem provados bem como a...

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