Acórdão nº 2516/2007-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Junho de 2007
Magistrado Responsável | MORAES ROCHA |
Data da Resolução | 06 de Junho de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam em Conferência no Tribunal da Relação de Lisboa O Ministério Público (MP), ora notificado do douto despacho de fls. 96, dos autos em referência e não se conformando com o decidido, dele vem interpor recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, formulando as seguintes conclusões: «1-O arguido prestou TIR, a fls. 10, ficando, entre o mais, obrigado aos deveres processuais estabelecidos no artigo 196 e 61, ambos do CPP.
2-Notificado nos termos legais, e efectuadas diligências, o arguido nunca compareceu, tendo-se procedido a audiência de julgamento na sua ausência, nos termos do artigo 333, do CPP, vindo o mesmo a ser condenado.
3-Efectuadas novas diligências para o localizar através da morada do TIR, dos OPC, das bases de dados disponíveis, não foi possível notificar o condenado da sentença, desconhecendo-se o seu paradeiro, sendo ainda que a notificação, em nossa interpretação, tem de ser pessoal.
4-Nos termos do artigo 333-5-6, correspondentemente conjugado com o disposto nos artigos 116-1-2 e 254, todos do CPP e com vista a fazer comparecer o arguido, pelo tempo estritamente necessário ao acto processual de notificação da sentença, o MP promoveu que se passassem mandados de detenção, fora de flagrante delito, e que se remetessem aos OPC, incluindo o SEF, para execução, considerando as áreas de todas as residências conhecidas.
5-O douto despacho recorrido indeferiu o promovido, em suma, por entender que a emissão de mandados de detenção do arguido, para o efeito de notificação da sentença, não tem acolhimento legal, uma vez que, na sua interpretação, tal finalidade não se enquadra na previsão taxativa do artigo 254, nº 1, do CPP; e que o n.° 5 do artigo 333, do CPP, não alarga o seu âmbito de aplicação para a finalidade nele prevista. Porém, olvidou o seu n.º 6.
6- Ora, os números 5 e 6, do artigo 333, na nossa interpretação, constituem normativo especial em face do artigo 373-3, do mesmo código, e o douto despacho carece de razão.
7-O artigo 333-5 e 6, do CPP, estabelece que: « (…)5 - No caso previsto nos n.ºs 2 e 3, havendo lugar a audiência na ausência do arguido, a sentença é notificada ao arguido logo que seja detido ou se apresente voluntariamente. (...). 6 - É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 116.º, n.ºs 1 e 2, e 254.º e nos n.ºs 4 e 5 do artigo seguinte». - destaques nossos.
8-A «detenção» prevista naquele nº 5 não pode ser vista isoladamente, à exclusiva luz da letra do artigo 254, do CPP, mas antes, tem de ser vista também à luz da norma (ou normas) que mande aplicar a solução nele contida, adaptadamente, a outros casos.
9-Por causa de haver outros casos especiais é que o legislador, no artigo 333-6, do CPP, usou a expressão gramatical "correspondentemente";ou seja remeteu expressamente para o artigo 254, do CPP (e demais artigos citados), para que a solução nele prevista, de detenção, seja "adaptadamente" aplicada, "mutatis mutandi", pelo intérprete e aplicador.
10-Ao contrário do que se refere no douto despacho recorrido, o artigo 254, do CPP, não contém --nesta perspectiva-- qualquer «previsão taxativa», no sentido da interpretação literal, nele vertida.
11-A interpretação do artigo 333-5 (e 6), do CPP, no sentido de que o arguido não pode ser detido para ser notificado da sentença, mas apenas a coberto de outro processo ou de uma outra medida de coação, num outro processo, parece-nos inutilizar e esvaziar o sentido útil desses números 5 e 6. Ora, nos termos do artigo 9, do C. Civil, o legislador não pode presumir-se criador de normas inúteis.
12-A interpretação no sentido de que o arguido julgado na ausência é notificado «logo que seja detido», mas que essa detenção terá de ser apenas resultante de um acaso detentivo, ou efectuada no âmbito de um outro processo, parece redundante, porque o legislador não tinha necessidade de dizer, no artigo 333, do CPP, aquilo que já resultava claramente dos artigos 116-1-2, 254 e 334-4 e 5, do CPP, preceitos que, todos eles, previam já a «detenção».
13-Também parece óbvio que, se o arguido fosse detido no âmbito de outro processo, seria necessariamente notificado da sentença, não sendo necessário o legislador repeti-lo expressamente, no artigo 333-5-6, do CPP.
14-Parece resultar do espírito do legislador (plasmado na declaração de motivos preambular do CPP de 1998 e de 2001) que o que se pretendeu foi justamente pôr cobro a situações em que os adiamentos e a morosidade da justiça a arrastam para o completo naufrágio, imagem de ineficácia e degradação, que, já então, se sentia e quis evitar.-- sentido é sufragado pelo Acórdão da Relação do Porto (RP), de 31-03-2004, processo 0440048, citado no acórdão da RL de 11-07-2006, processo 2895/2006-5 (in www.dgsi.pt/jtrl) .
15- «Não é lógico que num procedimento instituído, como os factos (...), o legislador, tendo em vista, o alcance da eficácia e celeridade, procurando a realização de mais audiências e menos adiamentos, não previsse os mecanismos necessários a evitar a paralisação do processo, na fase subsequente, da notificação ao arguido da decisão proferida. E tudo isto sem atropelo das mais elementares...
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