Acórdão nº 4386/2007-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução29 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Agravo nº 4386-07 I - S. […] SA, instaurou contra JOAQUIM […], com residência em …, procedimento cautelar para apreensão de veículo sobre o qual detém reserva de propriedade inscrita em contrato de financiamento que com o requerido celebrou para aquisição desse veículo.

No despacho liminar foi considerado que o Trib. da Comarca de Lisboa era territorialmente incompetente, tendo em conta o critério definido pela actual redacção dos arts. 74º e 110º, nº 1, do CPC, não podendo ser invocado, para afirmação da competência, o disposto no art. 21º do Dec. Lei nº 54/75, de 12-2, que deve considerar-se tacitamente revogado.

A requerente agravou, concluindo que: a) O presente procedimento cautelar foi instaurado ao abrigo Dec. Lei n° 54/75, de 12-2, por se encontrar registada na Conserv. de Reg. Automóvel a favor da recorrente a reserva de propriedade sobre a viatura financiada; b) A regra de competência plasmada o art. 21° é especial face à regra geral de competência do art. 74° do CPC, prevalecendo sobre esta, não tendo sido revogado pela Lei nº 14/06 de 26-4, peço que o tribunal territorialmente competente para apreciar o caso é o da agravante, enquanto proprietária reservatária; c) Acresce ainda que foi constituído um pacto de aforamento constante da cláusula 15ª das condições gerais do contrato, o qual estabelece como foro competente para resolução de todos os litígios emergentes do contrato celebrado a comarca de Lisboa; d) Atendendo ao disposto no art. 100° do CPC anterior à entrada em vigor da Lei nº 14/06, de 26-4, o referido pacto de aforamento é válido e eficaz, porquanto foi celebrado em momento anterior; e) No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da irretroactividade da lei, de modo que a Lei nº 14/06, de 26-4, apenas retirou aos sujeitos jurídicos a possibilidade de celebrarem pactos de aforamento, e não que os pactos anteriormente celebrados deixariam de ser válidos, pois que isso atentaria claramente contra a segurança jurídica que subjaz ao referido princípio da irretroactividade da lei, e consubstanciaria que estaríamos perante uma aplicação retroactiva da lei.

Não houve contra-alegações, por não ter sido cumprido ainda o contraditório.

II - Cumpre decidir: 1. Suscitam-se no caso concreto as seguintes questões: a) Manutenção ou revogação tácita do que no art. 21º do Dec. Lei nº 54/75 se dispõe sobre competência em razão do território, em face do que consta do actual art. 74º do CPC; b) Subsistência ou não do pacto de aforamento inscrito no contrato celebrado antes da entrada em vigor da Lei nº 14/06, de 26-4.

  1. Quanto à primeira questão: 2.1. Nos termos do art. 21º do Dec. Lei nº 54/75, "o processo de apreensão e as acções relativas a veículos apreendidos são da competência do tribunal de comarca em cuja área se situa a residência habitual ou sede do proprietário".

    Trata-se de uma norma que, na ocasião em que foi publicada, apresentava um critério definidor da competência relativa diverso do que emergia do art. 74º (para as acções de cumprimento de contratos) e do art. 85º do CPC (que englobava, além de outras, as acções de resolução de contratos), elegendo, respectivamente, o tribunal do lugar em que a respectiva obrigação deveria ser cumprida e o tribunal da área do domicílio do réu.

    A apreensão de veículos, quando tenha subjacente uma cláusula de reserva de propriedade, é instrumental relativamente à acção de resolução do contrato de compra e venda de veículos, antecipando, em termos de medida cautelar, um dos efeitos que decorre do exercício do direito de resolução: a restituição do veículo. Por isso, naquela ocasião, a regra especial de competência territorial acabava por divergir da que decorria do art. 85º do CPC, estando subjacente a ideia de dar prevalência ao interesse do proprietário, proporcionando-lhe a possibilidade de solicitar a intervenção do tribunal da área do seu domicílio.

    2.2. A situação sofreu entretanto uma primeira alteração. Por via do Dec. Lei nº 329-A/95, de 29-12, foi ampliada a regra específica do art. 74º do CPC, passando a abarcar também as acções de resolução do contrato por incumprimento e, além disso, concedendo ao credor a possibilidade de optar entre o tribunal do lugar de cumprimento da obrigação e o do domicílio do réu.

    A partir de então, a divergência passou a fazer-se não em relação à regra geral do art. 85º do CPC, antes à do art. 74º. Mantinha-se, contudo, uma relação de especialidade, pois o art. 21º era restrito às acções de resolução de contratos sobre veículos automóveis, ao passo que o art. 74º do CPC vigorava para a generalidade...

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