Acórdão nº 4853/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelROQUE NOGUEIRA
Data da Resolução15 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 - Relatório.

Na 16ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, José […] propôs acção de processo ordinário contra H.[…], alegando que são sócios da Sociedade Mir. […] Lda., e que, em assembleia geral da sociedade, realizada em 29/3/96, foi deliberado destituir os gerentes em exercício - o autor e o réu - e designar como novos gerentes o autor e o Eng.º Miguel […].

Mais alega que, em 26/4/96, o réu enviou cartas às instituições bancárias nas quais a referida sociedade tem contas, todas redigidas nos mesmos termos, onde, além do mais, afirmou que: «Entretanto foi detectado um desvio de fundos desta empresa para uma conta bancária particular do sócio José […] tendo sido apresentada queixa-crime por abuso de confiança contra aquele na Polícia Judiciária (Proc.º […]».

Alega, ainda, que essa acusação é falsa, porquanto, todos os dinheiros movimentados através da referida conta foram-no exclusivamente para pagamento de despesas e dívidas da sociedade, dada a dificuldade na obtenção da assinatura do réu em cheques para efectuar esse pagamento.

Alega, por último, que o réu lesou gravemente o bom nome e reputação do autor, que se sentiu profundamente ofendido e vexado pela injusta e falsa acusação feita contra si, o que constitui dano não patrimonial grave.

Conclui, assim, que deve o réu ser condenado a pagar-lhe a indemnização de 6 000 000$00.

O réu contestou, alegando que não praticou qualquer acto lesivo do bom nome e reputação do autor, pois que o que fez foi como sócio da sociedade e na defesa dos direitos desta e dos seus, alertando as entidades bancárias da existência da providência cautelar com suspensão das deliberações sociais e do desvio de fundos da sociedade do seu encaminhamento normal para uma conta bancária que o autor abriu em separado e em seu nome pessoal, mas para onde canalizava o fluxo financeiro diário de receitas da sociedade, atitude que indiciava um comportamento menos correcto e contrário às disposições legais que regem o funcionamento das sociedades.

Mais alega que a carta tem data de 26/4/96 e que a presente acção entrou em tribunal no ano de 2000, pelo que, já decorreu o prazo de três anos previsto na lei para a prescrição do direito à indemnização.

Conclui, deste modo, que deve ser absolvido do pedido.

O autor respondeu, concluindo que a excepção deduzida pelo réu deve ser julgada improcedente.

Seguidamente, foi proferido despacho saneador, onde se julgou improcedente a excepção de prescrição, tendo-se seleccionado a matéria de facto relevante considerada assente e a que passou a constituir a base instrutória da causa.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, após decisão da matéria de facto, proferida sentença, julgando a acção improcedente.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação daquela sentença.

Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - Fundamentos.

2.1. Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos: 2.1.1 - 0 autor e o réu são sócios da sociedade Mir.[…] Lda., com sede […] Lisboa (A).

2.1.2 - Em assembleia geral da sociedade, realizada em 29/03/96, foi deliberado com o voto favorável do autor e contrário do réu, destituir os gerentes em exercício - o autor e o réu - e designar como novos gerentes o autor e o Eng°. Miguel […] (B).

2.1.3 - Em 26/04/96 o réu enviou cartas às instituições bancárias nas quais a referida sociedade tem contas, conforme doc. de fls. 13 cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido: "(...) foi detectado um desvio de fundos desta empresa para uma conta bancária particular do sócio José […], tendo sido apresentada queixa crime por abuso de confiança contra aquele na Polícia Judiciária […]" (C).

2.1.4 - 0 autor na qualidade de sócio gerente da sociedade referida em 2.1.1, decidiu abrir no Banco […] uma conta em nome de "Dr. José […]/Mir.[…]", movimentável apenas com a sua assinatura (D).

2.1.5 - 0 réu não procurou nem antes, nem depois do envio das cartas referidas em 2.1.3, obter junto do autor ou da gerência da sociedade quaisquer esclarecimentos sobre o motivo da abertura da conta supracitada ou sobre o destino dado aos dinheiros movimentados através dessa conta (E).

2.1.6 - Devido ao referido em 2.1.3, o autor, em 06/08/96, apresentou queixa crime contra o réu por crime de difamação (F).

2.1.7 - Por decisão do […] Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, proferida em 08/06/99, o crime de difamação imputado ao réu, e pelo qual este foi acusado, foi declarado amnistiado, com a consequente extinção do procedimento criminal (G).

2.1.8 - Simultaneamente o Tribunal, por entender que o pedido de indemnização de Esc. 1.000.000$00 formulado no processo crime não continha os factos dos quais o queixoso fazia derivar aquele pedido, uma vez que se limitava a remeter para a acusação particular, enviou as partes para os tribunais civis, ao abrigo do disposto no art. 82, n°3 do C.P.C., conforme doc. de fls. 16 a 16 verso cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido (H).

2.1.9 - Quanto à queixa apresentada pelo réu referida nas suas cartas atrás mencionadas, o processo a que deu origem foi arquivado por não existirem indícios da prática pelo autor do crime que lhe era imputado pelo queixoso (I).

2.1.10 - As duas quotas detidas pelo réu na referida sociedade são no valor de Esc. 550.000$00 e Esc. 150.000$00, no capital social de Esc. 2.000.000$00 (J).

2.1.11 - O réu era igualmente gerente da sociedade "Mir.[…] Lda.", sendo sempre obrigatória a sua assinatura para obrigar a sociedade ou a do sócio José […], ora autor, conjuntamente com a de outro gerente, conforme dispõe o Artigo 10° do respectivo pacto social (L).

2.1.12 - Por escritura celebrada em 04 de Março de 1996, no […] Cartório Notarial de Lisboa, o sócio e ora autor José […], adquiriu as quotas dos então sócios João […] e Ulisses […], cujos valores nominais eram respectivamente de Esc. 300.000$00 (M).

2.1.13 - O autor passou então a deter na sociedade uma participação equivalente a 65%, correspondente à soma das quotas de Esc. 550.000$00 e Esc. 150.000$00 (tal como o R.), acrescida das quotas de Esc. 300.000$00 e Esc. 300.000$00 que adquiriu com esta...

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