Acórdão nº 23/2007-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelISABEL TAPADINHAS
Data da Resolução21 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório JM… instaurou acção emergente de acidente de trabalho com processo especial contra C…, EP e Companhia de Seguros… pedindo que as rés sejam condenadas a pagar: - pensão anual e vitalícia de € 12.365,81, a contar de 1.10.04; - subsídio por situação de elevada incapacidade permanente (€ 12.365,81); - assistência prestada por terceiro desde a alta hospitalar em 1.10.04 a 1.04.05 (€ 2.280, referentes aos rendimento que a sua mãe deixou de auferir); - prestação suplementar da pensão para assistência constante de terceira pessoa desde 1.04.05 (€ 380 mensais); - € 514,75 de despesas de deslocação suportadas pela mãe do autor durante o período de internamento do autor de casa para o hospital e vice versa; - subsídio para readaptação da habitação (€ 12.365,81); - indemnização por danos morais (€ 30.000,00).

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, o seguinte: (…) As rés contestaram em separado, concluindo ambas pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido.

(…) Por despacho de fls. 371 e 372, proferido em 14.12.05, a seguradora foi provisoriamente condenada a pagar ao autor pensão anual de € 9.821,90, acrescidos de € 5.000,00, de despesas de transporte, € 4.450,00, de despesas com prótese, bem como prestação suplementar no termos do art. 19º da LAT, fixada na remuneração mínima mensal dos trabalhadores do serviço doméstico.

Foi determinado o desdobramento do processo, que correu em separado, por apenso onde foi proferido despacho a declarar que o autor se encontra afectado de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, e de uma incapacidade permanente parcial de 85% para o trabalho em geral.

Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva se transcreve: Julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência: a) condeno a ré entidade seguradora a pagar ao autor uma pensão anual e vitalícia no valor de 8.594,16 € (oito mil, quinhentos e noventa e quatro euros, e dezasseis cêntimos) a partir de 11.01.06, excepto aquelas que comprove já ter pago a partir desta data de acordo com a condenação provisória constante de fls. 371 e 372; ; b) condeno a ré entidade seguradora a pagar ao autor um subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, pago de uma só vez, no valor de 4.387,20 euros (quatro mil, trezentos oitenta sete euros, e vinte cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal a contar da citação; c) condeno a ré entidade seguradora a pagar ao autor a prestação suplementar mensal prevista no art. 19º da LAT (100/97), a contar de 1.10.04, equivalente ao valor do salário mínimo dos trabalhadores do serviço doméstico, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação, descontando-se as quantias que a seguradora comprove já ter pago de acordo com a condenação provisória constante de fls. 371 e 372; d) condeno a ré entidade seguradora a pagar ao autor subsídio para readaptação da habitação previsto no art. 24º da LAT (100/97), no valor de 4.387,20 euros (quatro mil, trezentos oitenta sete euros, e vinte cêntimos), acrescido de juros de mora desde a citação; e) julgo improcedentes os demais pedidos; f) absolvo totalmente do pedido a ré entidade empregadora.

Custas a cargo da autora e ré entidade seguradora na proporção vencimento/decaimento.

Inconformados, quer o autor quer a ré seguradora vieram interpor recurso de apelação dessa decisão.

O autor sintetizou a sua alegação nas seguintes conclusões: (…) Por seu turno, a ré seguradora, sintetizou a sua alegação nas seguintes conclusões: (…) Apenas contra-alegou a entidade patronal que pugnou pela manutenção da decisão recorrida excepto no aos valores da pensão anual da prestação complementar e ao subsídio de readaptação da habitação.

Nesta Relação o Ex.º Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer a fls. 696 no sentido de ser confirmada a sentença e negado provimento aos recursos.

Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.

Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente - tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis "Código do Processo Civil Anotado" vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156).

No caso em apreço, não existem questões que importe conhecer oficiosamente.

As questões colocadas nos recursos delimitados pelas respectivas conclusões (com trânsito em julgado das questões nela não contidas) - arts. 684º, nº 3, 690º, nº 1 e 713º, nº 2 do Cód. Proc. Civil - são as seguintes: - quanto à apelação do autor: - saber se ao mesmo é devida indemnização por danos morais; - quanto à apelação da ré: 1ª - saber se a matéria de facto que vem fixada da 1ª instância deve ser alterada no que concerne às respostas dadas aos quesitos 71º, 75º, 80º e 93º; 2ª - saber se o acidente deve ser atribuído a violação das regras de segurança higiene e saúde no trabalho por parte da co-ré, respondendo a apelante apenas subsidiariamente; 3ª - saber se os cálculos da pensão, do subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, da prestação suplementar para assistência de terceira pessoa e do subsídio para readaptação da habitação se mostram correctamente efectuados.

Fundamentação de facto A 1ª instância deu como provada a seguinte matéria de facto: (…) Fundamentação de direito Apelação do autor: Atenta a data em que ocorreu o acidente (13 de Maio de 2004) é aplicável ao caso o regime constante da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro (LAT) e do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de Abril (RLAT) - arts. 41º, nº 1, alínea a) daquela Lei e 71º, nº 1 deste Decreto-Lei.

Como é sabido, a responsabilidade civil do empregador por acidentes de trabalho não abrange a reparação de todos os danos e compreende-se que assim seja, uma vez que não assenta na culpa, mas sim no chamado risco empresarial ou de autoridade.

Assim, nem todos os danos patrimoniais sofridos pelo sinistrado ou por seus familiares são ressarcíveis com base naquela responsabilidade e o mesmo também acontece, em princípio, com os danos não patrimoniais. Como resulta do disposto no art. 10º da LAT, a responsabilidade do empregador restringe-se, em regra, às prestações em espécie e em dinheiro expressamente referidas naquele normativo legal, de cujo elenco a indemnização por danos não patrimoniais não faz parte.

Acontece, porém, que, em certas situações, a lei dos acidentes de trabalho reconhece o direito à indemnização por danos não patrimoniais. Fá-lo no seu art. 18º, ao regular o direito à reparação quando o acidente tiver ocorrido por culpa da entidade empregadora ou do seu representante ou quando tiver resultado da falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

Naqueles casos, o art. 18º, no seu nº 1, determina o agravamento das prestações que normalmente seriam devidas e, no seu nº 2, estabelece que tal agravamento não prejudica a responsabilidade civil por danos morais nem a responsabilidade criminal em que a entidade empregadora, ou o seu representante, tenha incorrido.

Tal significa que a lei dos acidentes de trabalho ressalva responsabilidade civil por danos não patrimoniais, nos casos em que o acidente ocorre por culpa da entidade empregadora ou nos casos em que é fruto da inobservância das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

Tal ressalva traduz-se num alargamento do conteúdo do direito à reparação previsto no art. 10º, uma vez que tal direito passa a incluir a prestação devida por danos não patrimoniais e esse tem sido o entendimento implicitamente perfilhado pelo STJ (Acs. de 18.11.2004 e de 1.02.2005, www.dgsi.pt).

Na anterior lei a entidade patronal era a primeira responsável pela reparação agravada do acidente, quando o acidente tivesse sido dolosamente provocado por ela ou seu representante ou quando tivesse resultado de culpa dela ou do seu representante - Base XVII da Lei nº 2.127, de 3 de Agosto de 1965 - e nos termos do art. 54º do Decreto nº 360/71, de 21 de Agosto, considerava-se ter resultado de culpa da entidade patronal ou do seu representante o acidente devido à inobservância de preceitos legais e regulamentares, assim como de directivas das entidades competentes, que se refiram à higiene e segurança do trabalho.

Entendia-se que o art. 54º estabelecia apenas uma presunção de culpa da entidade patronal no que diz respeito à inobservância das regras de segurança, sem que isso dispensasse a prova do nexo de causalidade entre essa inobservância e a produção do acidente. Isto é, aquela presunção de culpa não dispensava o sinistrado ou seus beneficiários de alegar e provar que o acidente tinha ocorrido por causa da violação das normas de segurança. Apenas os dispensava de provar que aquela violação tinha sido culposa.

No novo regime, as coisas são algo diferentes. As pensões só são agravadas e também só há lugar à aplicação do disposto no nº 2 do citado art. 18º quando o acidente tenha sido provocado pela entidade patronal ou seu representante e quando tenha resultado de falta de observação das regras de segurança, higiene e saúde no trabalho - art. 18º, nº 1, da LAT. Isso significa que desapareceu o agravamento com base na mera culpa, mas, em contrapartida, dispensou-se a culpa (ainda que presumida), quando o acidente resulte da inobservância das regras de segurança.

No entanto, afigura-se-nos que, no essencial, se mantém válido o entendimento defendido pela doutrina e pela jurisprudência de que para que se atribua a responsabilidade pelas consequências do acidente à entidade empregadora não basta o acidente ter sido provocado por esta ou ter havido inobservância de preceitos legais ou regulamentares ou de directivas sobre higiene e segurança, sendo necessário que se verifique um nexo de causalidade entre essa inobservância e o acidente (Cruz de Carvalho, "Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais"...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT