Acórdão nº 517/2007-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelFERREIRA MARQUES
Data da Resolução07 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO J…, casado, motorista de pesados, residente na Praceta…, instaurou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra Transportadora…, Lda, com sede na Rua…; A… e F…, casados, residentes na Rua…, em Lisboa, pedindo que o seu despedimento seja declarado ilícito e que os RR. sejam condenados a pagar-lhe, solidária e ilimitadamente, a quantia de € 34.728,96, a corrigir oportunamente, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Pediu ainda que a 1ª R. seja condenada a entregar à Segurança Social a quantia de € 454,44 que recebeu a título de subsídio de desemprego.

Alegou para tanto e síntese o seguinte: A 1.ª R. é uma sociedade comercial que tem por objecto a indústria de transportes em automóveis e tem exercido de forma efectiva essa actividade centrada na sua sede; Os 2.º e 3.ª RR. são casados um com o outro no regime da comunhão geral de bens e os únicos sócios e gerentes da 1.ª R.; Foi admitido ao serviço da 1.ª R., em 23/8/1973, com a retribuição mensal de 2.500$00, como ajudante de motorista, tendo passado a motorista de pesados, em 1980, e com esta profissão se manteve ininterruptamente ao serviço daquela empresa até 31/12/2003, auferindo então a retribuição base de € 642,20; Em 31/12/2003, a 1ª Ré despediu-o sem justa causa e sem procedimento prévio adequado, sob a alegação de interrupção da actividade da firma por imperativos económico financeiros e entregou-lhe a declaração de situação de desemprego onde falsamente é indicada como data de início da prestação de trabalho 1/02/1983; À data do despedimento tinha 46 anos de idade e era, de todos os trabalhadores ao serviço da 1ª R., o mais antigo; Opta pela indemnização em substituição da reintegração, justificando-se que o montante da indemnização seja fixado em 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade; A 1ª Ré não lhe foi pagou metade da parte proporcional do subsídio de férias devido no momento do despedimento, no montante de € 321,10; Ficou profundamente abalado ao ver-se na situação de desemprego ao fim de tantos anos de trabalho e de fidelidade à empresa, numa idade em que não é fácil mudar de profissão, e sem meios para o poder fazer; Os 2º e 3º RR. alienaram o camião de marca Volvo à firma S…, Lda, e abandonaram as demais viaturas, no Parque Terminal de Santa Apolónia, sendo já notória a sua degradação, resultante da pilhagem de peças e componentes, não sendo conhecido qualquer outro património da 1.ª Ré; Durante o período em que esteve ao serviço da 1.ª R., os RR. A… e F… sempre utilizaram em proveito próprio e do seu agregado familiar o património da sociedade, quer para ocorrer às suas despesas pessoais, incluindo até a compra de sapatos, gravatas e fatos, quer para pagar as despesas correntes com a manutenção das suas várias casas, incluindo água, electricidade e gás, quer para pagar as despesas com a educação e instrução dos dois filhos do casal, incluindo as de obtenção da carta de condução, quer para pagar a compra de um prédio de habitação em Almada, de um terreno no Algarve e uma Quinta na terra da sua naturalidade, em ….; Os 2.º e 3º RR. violaram, clara e intencionalmente, os seus deveres de gestão da 1.ª Ré e todas as disposições legais destinadas a proteger os credores da 1.ª R. em geral e em especial os direitos e interesses dos seus trabalhadores, nos quais o A. se inclui, daí decorrendo a insuficiência do património social para satisfação dos créditos laborais, tanto mais que, também como únicos sócios desta, respondem pela escolha que fizeram dos seus gerentes; Recebeu de subsídio de desemprego, em Janeiro de 2004, a quantia de € 454,44.

Os RR. contestaram a acção, alegando, em resumo, o seguinte: Em 30/06/1977, o A demitiu-se e foi trabalhar para outra empresa, tendo sido novamente contratado pela 1ª R. em 1 de Agosto de 1977; Nos últimos 15 anos, a situação financeira da 1ª Ré foi-se degradando, tornando-se muito grave nos últimos 4 anos, com origem na conjuntura económica, na ausência de mercado para a actividade exercida e na dificuldade de receber o dinheiro de certos clientes; Os contratos existentes eram reduzidos, face às despesas existentes, e nem todos os clientes cumpriam com as suas obrigações de pagamento; A 1ª R. não possui qualquer título que legitime a utilização do imóvel onde se situa a sede, o qual é propriedade da Câmara Municipal de Lisboa e, de há dois anos a esta parte, corre o risco de ser desalojada, tendo sido, por diversas vezes, notificada para desocupar o local; A 1ª R. sempre cumpriu as suas obrigações para com os trabalhadores e estes tinham perfeito conhecimento dos graves problemas financeiros existentes, pois, no último semestre de 2003, foram tidas conversas com os trabalhadores, tanto a nível individual como em conjunto, expondo claramente a situação insustentável da 1ª R., e nenhum trabalhador se mostrou surpreendido; No sentido de resolver a situação de forma amigável e permitir aos trabalhadores terem tempo para organizar as suas vidas, a 1ª R. e os trabalhadores acordaram em fazer cessar a relação laboral no final do ano de 2003, data até à qual seriam pagos os vencimentos respectivos e os demais direitos seriam pagos em prestações durante os primeiros meses de 2004, tendo sido fixado um valor global para cada trabalhador; Tal acordo não foi efectuado por escrito devido à excelente relação existente entre os trabalhadores e os sócios da 1ª R., pois no entender de todos, tal documento não seria necessário e ninguém iria invocar a ausência do mesmo, apenas sendo necessária a declaração de situação de desemprego; Em execução do acordo efectuado, a 1ª R. manteve-se em actividade até 31/12/2003, data em que foram entregues as declarações de situação de desemprego e o A. recebeu durante os primeiros meses do ano de 2004 a quantia global fixada de € 1.615,70, quantia suportada pelos sócios da 1ª R.; A alienação do camião Volvo foi para abater a dívida existente para com a S…, Lda. e a 1ª R. não recebeu qualquer quantia, pois mesmo após a venda ainda existem valores em dívida para com a referida empresa; Foi solicitado à Fazenda Nacional que indicasse um local para a entrega das viaturas penhoradas, local que ainda não foi indicado; Os 2º e 3º RR., por diversas vezes, utilizaram bens próprios para suprir as necessidades da sociedade, são pessoas que ao longo da sua vida sempre trabalharam, facto que, aliado a ajudas familiares, possibilitou a criação de um património pessoal, nomeadamente no período anterior a 1975, que permitiu não só suportar as despesas pessoais dos 2º e 3ª RR. e do seu agregado familiar, como também adquirir o prédio de Almada, cujas fracções se encontravam arrendadas, o terreno do Algarve e a quinta em Portela da Cerdeira, bem como suportar as respectivas despesas com o seu património pessoal; As despesas pessoais dos 2º e 3º RR e do seu agregado, bem como as despesas com a educação e instrução e cartas de condução dos seus filhos foi sempre custeada com património próprio; Foram os 2º e 3º RR que adiantaram dinheiro ao A. para que este obtivesse a sua carta de condução de veículos pesados e nos últimos anos era habitual usarem património pessoal para custear despesas da sociedade.

Concluíram pela improcedência da lide e pela sua absolvição dos pedidos.

O A. respondeu, pedindo a condenação dos RR. como litigantes de má-fé.

Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença na qual se decidiu julgar ilícito o despedimento do A. e condenar solidariamente os RR. a pagar àquele: a) a importância, a liquidar em execução de sentença, correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da data da propositura da acção, ou seja, desde 16/8/2004, até ao trânsito em julgado da sentença, deduzidas as quantias de € 454,44, correspondente ao subsídio de desemprego no período compreendido entre 5 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2004 e outras que tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, acrescida de juros moratórios calculadas sobre os montantes e desde a(s) data(s) de vencimento daquelas prestações, respectivamente, à taxa legal, até integral pagamento; b) uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, correspondente a 45 dias de remuneração de base por cada ano de antiguidade ou fracção, contando-se todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial; c) a importância de € 5.000,00, a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos.

Decidiu-se ainda condenar cada um dos RR. na multa de 15 UC, por litigância de má-fé.

Inconformados, os RR. A… e F… interpuseram recurso de apelação...

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