Acórdão nº 7496/2006-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Janeiro de 2007
Magistrado Responsável | FRANCISCO MAGUEIJO |
Data da Resolução | 11 de Janeiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
20 Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa A recorrente/A, na qualidade de co-proprietária da fracção abaixo identificada e de cabeça de casal do inventário por morte do marido Z E, destinado à sua partilha, intentou contra os RR acção declarativa, pedindo a condenação dos mesmos a pagarem-lhe, solidariamente, a quantia de 8.320.000$00.
Alegou para tanto, em síntese, que o R L C ocupou e utilizou a fracção correspondente ao 3º andar do prédio sito na R C Ramires, em Lisboa, sem título justificativo e contra a sua vontade, de 22.11.1984 a 16.7.1993, com isso lhe causando prejuízos no montante de 80.000$00 mensais.
Os RR apresentaram contestação, impugnando os factos alegados por aquela, tendo o R, ainda, excepcionado a ilegitimidade da A.
A A desistiu do pedido contra as RR A R e I O.
Foi, a seguir, admitida a intervenção principal, associados à A, de C A, M E, A E, M F, G C e D C.
Lavrado saneador, relegou-se nele, para decisão final, o conhecimento da excepção da ilegitimidade.
Procedeu-se depois à realização da audiência de discussão e julgamento, tendo, no termo, sido proferida decisão de facto e, subsequentemente, decisão final em que apenas foi apreciada e decidida a questão da invocada ilegitimidade da A, no sentido de a haver como parte ilegítima, em resultado do que os RR foram absolvidos da instância.
Não se conformando, a A recorreu desta decisão, tendo alegado e concluído, assim: 1- A decisão recorrida não respeitou o preceituado nos arts. 265, n°. 2 e 266, n° 1, ambos do C.P.C., mandando juntar o documento em falta, e dando prevalência à questão de forma, em prejuízo da questão de mérito, contrariando a actual filosofia do C.P.C. ; 2- A junção dos documentos ora apresentados, permitirá ao Tribunal da Relação revogar a decisão recorrida, declarando a agravante parte legítima; 3- O Tribunal da Relação poderá, em seguida, valorar a matéria de facto provada e julgar procedente e provada a presente acção, de acordo com o previsto no art. 715 do C.P.C. e com a orientação seguida pelo S.T.J. no seu Douto Ac. de 23/3/99, (C.J. ano 7, Tomo I, 1999, pag. 172); 4- O R. Luís, deverá ser condenado como litigante de má-fé pois, na sua contestação, deduziu oposição cuja falta de fundamento, conhecia directa e pessoalmente, pelo que, não podia e nem devia ignorar, pois eram factos directos e pessoais, seus.
O R apresentou contra-alegações, nas quais defendeu a manutenção da decisão agravada.
Questões Dado que o objecto do recurso é delimitado pelas suas conclusões (arts 690 e 684 nº 3 do CPC), importa apreciar e decidir se a sra juíza do processo violou o disposto nos arts 265 n° 2 e 266 n° 1 do CPC, se isso leva à revogação da decisão e sua substituição por outra em que se conheça do mérito da acção e se o R litigou de má fé.
Previamente, se o recurso de agravo devia ter sido julgado liminarmente deserto, nos termos do disposto no art° 690°, n° 3, do CPC.
Decidindo Atrás deixou-se para este momento o conhecimento da arguição, pelo R, desta pretensa ilegalidade.
As alegações da recorrente estão juntas a fls 1067 e as respectivas conclusões reproduzidas supra.
A lei processual diz que na falta de alegação, o recurso é logo julgado deserto (art 690 nº 3 do CPC).
Ora é evidente que a recorrente não faltou com as alegações, o que o próprio recorrido sabe e aceita.
O que é bastante para logo se decidir pela falta de fundamento da arguição do R no sentido de julgar o recurso de agravo deserto.
A alegada falta, em termos substanciais de uma verdadeira oposição conclusiva à decisão recorrida não é, nem nunca o vimos defendido, razão para se julgar deserto o recurso. A ser assim, estar-se-ia a julgá-lo prematuramente, antes mesmo de ele ter ido a vistos dos juízes adjuntos.
Não é isso que a lei diz. A falta de substância das alegações leva à improcedência do recurso, não, precipitadamente, a declará-lo deserto.
Termos em que se nega tal arguição, passando-se para o conhecimento das restantes e substanciais questões.
Factos provados, não impugnados, pertinentes à decisão da questão da ilegitimidade da A, tal como definidos no Tribunal recorrido: Dão-se aqui como reproduzidos, nos termos do art 713 nº 6 do CPC, os constantes de fls 1046 e 1047, alíneas a) a f).
O Direito A sra juíza «a quo», interpretando e aplicando o direito aos factos, começou, bem quanto a nós, por vincar que na falta de indicação da lei em contrário são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida tal como é configurada pelo A (art 26 nº 3 do CPC).
Logo a seguir refere que a A invocou a qualidade de titular do direito de propriedade sobre o andar acima identificado e a de cabeça-de-casal da herança do seu cônjuge, Z E.
Acrescenta depois que ela não procedeu à junção de certidão do registo predial relativo ao dito imóvel, única forma legal de provar a aquisição do direito de propriedade que fundamenta o pedido formulado nem provou que o mesmo imóvel integrava a herança de que se arrogava cabeça-de-casal.
Conclui, que, por não ter feito tal prova, é manifesta a ilegitimidade da A.
Como decorrência disso absolveu os RR da instância, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões.
A recorrente, insurgiu-se contra esta decisão por o sr juiz «a quo» não ter previamente usado dos deveres de suprimento de que fala o art 265 nº 2 do CPC e de cooperação previsto no art 266 nº 1 do mesmo Código.
Decidindo esta questão importa logo dizer que não se vê que tenham sido violados, no Tribunal recorrido, os princípios do inquisitório e da cooperação. Nem o caso é de falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, tratando-se antes de pressuposto do exercício do direito substantivo que a A intentou realizar com a acção, nem a cooperação devida pelo juiz(1) vai ao ponto de dever providenciar pela junção de documentos que o princípio dispositivo (art 264 CPC) impõe que não saia da disponibilidade das partes. A estas cabe efectivamente alegar os factos essenciais que compõem a causa de pedir e juntar os documentos necessários à sua prova(2).
O juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância…quando considere ilegítima alguma das partes (art 288 nº 1 d) do CPC.
O Tribunal conhece oficiosamente esta excepção (art 495 do CPC) enquanto não dever considerar-se transitada decisão que a conheça e decida com trânsito em julgado.
Porque assim é, pese embora o recurso não ataque a decisão recorrida por esta via, ele não a deixou transitar, podendo e devendo, por isso, nesta sede, ser revogada se for havida como violadora da lei.
A decisão agravada suportou a absolvição dos RR da instância no facto de a A não ter provado factos que compunham a causa de pedir do seu pedido.
Ora a ilegitimidade, tal como é definida no art 26 do CPC e que leva à absolvição da instância não se consubstancia na falta de prova de algum dos pressupostos da declaração do direito subjectivo, antes é aferida pelos contornos com que o A apresenta a relação controvertida.
O sr juiz «a quo» e também a recorrente, saltaram da legitimidade processual que era a que estava em causa, para a chamada legitimidade substantiva que se confunde já com a questão do mérito.
Dando como adquirido que não se provou ser a A e a herança do marido co-proprietárias do imóvel, a consequência jurídica a extrair daí seria logicamente a improcedência do pedido.
Mas sendo, como é, a legitimidade processual a questão a decidir e bastando para que esta se haja como verificada que a A tenha alegado ser titular da relação material controvertida e não, já, que tenha provado tal titularidade, tem de concluir-se não ocorrer a dita excepção dilatória. Efectivamente a A, tal qual disse na petição inicial, tinha-se como co-proprietária do imóvel e cabeça-de-casal da herança. Tanto basta para que se haja como parte legítima activa.
A falta de prova desses factos relevará, porventura, para o mérito, que porém não é o...
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